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Um conto que é romance

 
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Vou escrever algo:

Quando quero escrever um conto sai um poema, quando quero um poema sai um pensamento, quando quero um pensamento sai uma palavra
e as silabas são sempre todas, á letra. Por isso vou escrever um romance, uma história de desamores de amores no singular . Esta história ao contrário das histórias verdadeiras é mais verdadeira ainda, porque os personagens eram mesmo um só.




Não era uma vez...penso que foram vezes uma muitas vezes (Voltem atrás e leiam direito)

e para que não me passem uma rasteira nesta história ...foram vezes uma muitas vezes.

Uma dessas vezes, quando era pequenino (ainda o sou, só que agora excito-me com coisas tipo parênteses fecham parênteses, ao quadrado)
Quando falam, falam sempre do passado, recordam-se histórias, sempre saudosistas como se a saudade não fosse dor, sim saudade é o que não é.
Falo do futuro para dizer.: no futuro quero esse passado.


Ele era o mario, sem acento (que isto dos correctores já não são como antigamente), ela era a maria, simplesmente. Simplesmente maria.
Os dois juntos em cima um do outro davam meio. Meio que foi o seu viver na venda de brinquedos, dos tempos em que os brinquedos falavam.
Meio de vida para disfarçar as desgraças que são mesmo a anti-tese de todas as graças. A sua graça era mario a sua desgraça era maria,
como diz o provérbio, era versa vice.


E os dois juntos, um em cima do outro, em qualquer posição, mesmo que na cama sutra, davam meio. Viviam da venda de tráfico de brinquedos.
Eram heróis malditos porque o amor que os unia ( como se amor pudesse ser outra coisa) não lhes dava réstia para verem que no mundo ao lado
do seu universo viviam seres traquinas e galáticos, as crianças. E eu era galáctico como ainda o sou, traquino.

Lembro-me que tinham forte concorrência, porque o Barbosa mesmo sem estar em cima de ninguém e isento de cama-sutras, era grande, aliás
(perdoem-se esta expressão complicada e os parênteses da minha invocação sempre a fecharem-se sobre nós mesmos). Nós mesmos, pleonasmo
absoluto porque nós somos sempre os mesmos, nunca outros nós. Como estava a dizer o Barbosa era grande, isto é, era maior do que si mesmo, e
como se não bastasse essa concorrência ao mario e à maria, também vendia brinquedos. Só que o Barbosa, como era enorme e tinha um coração maior
que o mario e a maria, que eram pequenos, conseguia a proeza de vender brinquedos a si mesmo. Ora, em boa hora vos conto neste romance, que o mario tinha um coração maior do que o seu minúsculo quintal, onde fanava-mos a fruta do nosso contentamento, em linguagem antiga e salazarenta o mata-fome, mesmo com verde fruta, porque há fruta verde que é madura (perguntem ao Adão ou á Eva). Agora vou escrever aquele bocadinho que se inventa roubando á imaginação, a maior das verdades.
O Barbosa que era gigante, não sei porquê, zangou-se com a maria por causa de um olhar atrevido de gigante que lançou ao mario ... e porquê?

Ora a história dos ciúmes não é para aqui chamada porque o Barbosa tinha um coração pequeno, mas bem maior que o quintal minúsculo do mario e da maria, tal era o tamanho da desporpoção da grandeza das suas ideias bem maiores que o seu corpo ciclopado. O Barbosa era maior do que o mais pequeno dos mundos.
Como naquela altura a concorrência apertava porque ninguém fazia compras, ambos, Barbosa e mario e maria tinham um problema, os catraios assaltavam-lhes os quintais para lhes roubar a fruta verde, esgotada na fome. E um dia tipo era uma vez...

O mario, que era o homem da causa sem u, mandado pela sua minhota esposa (interrompi o conto para escrever no msn: acabei de jantar e o aperitivo é um conto ..envio-te depois)...
Como já tinha uma expressão estudada para este conto que é um romance), escrevo:
Ah onde é que eu ía. E há quem diga, não é onde, é aonde.

Estava eu com o Barbosa a contempla-lo e ele, mestre da bondade de, dizia-me que o meu pai iria comprar aquele blindado que não era um avião mas voava e até voava com fumo invisível.
Fixe. Estava eu muito fixe e o Barbosa também. Naquele tempo toda a gente sabe que o tabaco era caro e ganhar o valor de alguns volumes era negócio. Hoje há quem chinoca isso e tem lugar até, se aceitar um, recebe outro por cima. Coisas que por um pouco a culpa é da Internet. Causa de parênteses... e correctores.

Claro, claro o mario era assim, pegava numa espingarda brinquedo e dava tiros a sério, foguetados. Nunca em toda a minha vida um foguete que ainda me assusta, medava-me tanto (esta palavra não é conhecida pelo corrector do sistema). O foguete agora merda-me. E estava ele, o mario, aos tiros e como a espingarda não era tão "redbull dou-te asas) não tinha áudio. Era desprovida de som e vai o mario, mais sabedor disso do que ele próprio, enganava-se imitando com a boca o troar de canhões dizendo e soprando: pluf, pluf .pluf..porque era pequenino. E nós fugíamos em debandada. Um dia Barbosa apareceu, dizem a passar na rua como sempre e passando alguns meses, muito tempo depois de mario e maria deixarem de aparecer. A escola que morava perto deles era boa vizinha, mas de verão lá ía ela de férias e vai que ninguém, se apercebeu que o mario e a maria tinham morrido. Dizem inclusivé: estão mortos, irremediavelmente mortos. Algum intelectual fora buscar esta expressão ao fio da navalha e vai daí convenceu toda a gente. Pelo sim pelo não e também pelo cheiro, vice-versa e nauseabundo. Eles cheiravam mesmo mal, cheiravam mais mal do que cães mortos. Tinham morrido e como tal, normalmente ninguém acreditava. Então para o povo os brinquedos eram eternos, e para os gentios o mario a a maria eram dois brinquedos que, juntos não davam meio e como se isso não fosse pouco tinham morrido. Lá estava o Barbosa na história, sem saber ler e escrever e era grande e como se isso não bastasse tinha-lhe saído a sorte grande: acabara-se a concorrência e mesmo que ninguém comprasse ( e não compravam porque quem mandava era um tal de Salazar, e o homem era à justa. Depois, muito lentamente veio a novidade: Primeiro morreu um, depois morreu outro. Jaziam na tal sutra abraçados na cama. "Estás a brincar" diziam todos. Não morreu mesmo. Mas quem? Os dois? O mario primeiro, a maria ...que se passou? Então, desprovida da verdade, a bisbilhotice (outro pleonasmo) inventou mais do que história com H. Hoje num outro conto sei que um morreu primeiro que o outro. Mas quem foi primeiro? Foi certamente um e outro porque estavam lá. A mario ou o mario morreu e o mario ou a maria morreu também. Dizem, um primeiro e o outro pelo primeiro. mario não é a história de quem morre primeiro e maria primeiro não morre. O Barbosa por um pouco não morria primeiro e só porque o neto vivia com ele e morreu-lhe antes. (porque se alistou ao longe). Barbosa era o único que tinha razão porque acabara de perder os seus brinquedos mais lindos que eram reais ( o mario e a maria). Morreu. Despediu-se dos brinquedos e foi-se com ele, para saber primeiro que todos, quem morreu primeiro: se o ovo ou a galinha.


Esta história tem um atributo meio singular. É quase muitas vezes verdadeira. Ainda hoje quero essa espingarda brinquedo a disparar tiros a sério, que com elegância matam o atirador de amores. O mario e a maria morreram e viveram um para o outro. Tal conto de fadas, e o Barbosa, sem saber ler e escrever.


O homem antes de ser o ente do ser é o ser do-ente

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JSL
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Enviado por Tópico
ângelaLugo
Publicado: 10/07/2007 23:23  Atualizado: 10/07/2007 23:23
Colaborador
Usuário desde: 04/09/2006
Localidade: São Paulo - Brasil
Mensagens: 14852
 Re: Um conto que é romance p/ JSL
Querido poeta

Amei esta história que pode não ser
um romance que talvez não seja
Pelo que vejo saiu de tudo um pouco
na sua inspiração...Adorei mesmo
diferente de tudo que já li e gosto
muito de escrita diversificada...

Beijinhos no coração

Enviado por Tópico
JSL
Publicado: 10/07/2007 23:46  Atualizado: 10/07/2007 23:46
Membro de honra
Usuário desde: 10/05/2007
Localidade: Minho
Mensagens: 681
 Re: Um conto que é romance
Há quem conte contos imaginando, eu conto-os a sério.

Esta história é aquela que mora ao lado todos os dias mas teimamos em chamar de passado. Se pudesse hoje , trazia o Mario, a Maria para lhes dizer num sonho:

Olá Barbosa.

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 10/07/2007 23:51  Atualizado: 10/07/2007 23:51
 Re: Um conto que é romance
Quem conta um conto
acrescenta o que lhe apetecer
pode ser só virgula ou ponto
mas é sempre escrita a acontecer

Reza a história que havia
um barbosa, um mario e uma maria
e quintais cheios de luta
na batalha desigual da fruta

E no som da arma ecoava
um tiro disparado quase lento
que era o olho que matava
a fruta que tinha dentro

O medo lá atrás na eira
já passou a porta dura
não tem eira nem beira
em tempos de pós-ditadura

Um puto que podes ser tu
acrescentou um ponto
à vitória do fruto nú
debruçado neste conto

Enviado por Tópico
JSL
Publicado: 11/07/2007 00:23  Atualizado: 11/07/2007 00:23
Membro de honra
Usuário desde: 10/05/2007
Localidade: Minho
Mensagens: 681
 Re: Um conto que é romance
Já disse o que disse no chat. Era bonito se gravasse aqui. Mas o chat tem dessas: é como eu, chato e entretido.

Mas este soneto? Publica-o

Eu disse que era maior que o conto que não é pequeno, e disse: era isso que eu queria dizer. Assim o soneto é o conto feito palavra que é sílaba em dois pensamentos que se amam porque são três, mais os outros.
è um conto de um romance.

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 11/07/2007 00:26  Atualizado: 11/07/2007 00:26
 Re: Um conto que é romance
podes ter a certeza que é assim que eu quero morrer também libertem-nos como Saramogo se libertou na escrita.
Soberbo
jinhoooooooooooo

Enviado por Tópico
los
Publicado: 11/07/2007 01:29  Atualizado: 11/07/2007 01:29
Da casa!
Usuário desde: 01/07/2007
Localidade: Minho
Mensagens: 311
 Re: Um conto que é romance
lembro-me agora e sempre.


Beijos nessa história que tanto nos encheu à mesa.

Enviado por Tópico
Vera Sousa Silva
Publicado: 11/07/2007 09:45  Atualizado: 11/07/2007 09:45
Membro de honra
Usuário desde: 04/10/2006
Localidade: Amadora
Mensagens: 4098
 Re: Um conto que é romance
Mas que história!!!
O mario e a maria pelo menos morreram juntos (mas eram apenas brinquedos?? Ou todos nós somos meros brinquedos???)!
Com ou sem pleonasmos gostei! Porque no meio do drama, muita risada se deu

Beijinhos

Enviado por Tópico
Manuela Fonseca
Publicado: 11/07/2007 14:13  Atualizado: 11/07/2007 14:13
Colaborador
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Localidade: Lisboa
Mensagens: 885
 Re: Um conto que é romance
Quem pode ler este conto sem se deixar rir pelo meio, começando no princípio e acabando no fim?

Eu aconselhava publicação num sítio qualquer. Bem escrito, ritmo acentuado.

Uma história que pode espreitar um pouco de todos nós.

Beijinhos*

Enviado por Tópico
JSL
Publicado: 11/07/2007 14:15  Atualizado: 11/07/2007 14:17
Membro de honra
Usuário desde: 10/05/2007
Localidade: Minho
Mensagens: 681
 Re: Um conto que é romance
Sim eram dois seres a brincar que morreram a sério. A história é real, ele o smarinho ela a smaria. Eram por isso dois brinquedos e o Barbosa também era vizinho da escola que ainda não morreu.
O personagem é só um e esse inventa-se todos os dias: o desamor.

Ri-me bastante também. Será uma tragicomédia este pequeno conto ou um grande romance?

É uma história de amor a brincar ...


Somos nós os binquedos de um ser supremo que também se ri. Pergunto.

Enviado por Tópico
goretidias
Publicado: 17/07/2007 10:28  Atualizado: 17/07/2007 10:28
Colaborador
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Localidade: Porto
Mensagens: 1237
 Re: Um conto que é romance
"É quase muitas vezes verdadeira"... eu tirava o quase e lia de novo! Amei!

Enviado por Tópico
JSL
Publicado: 26/07/2007 10:34  Atualizado: 26/07/2007 10:34
Membro de honra
Usuário desde: 10/05/2007
Localidade: Minho
Mensagens: 681
 Re: Um conto que é romance
Bela sugestão. A ter em conta ... Obrigado poetas e poetisas.

Enviado por Tópico
elisabeteluisfialho
Publicado: 18/10/2008 22:02  Atualizado: 18/10/2008 22:02
Da casa!
Usuário desde: 01/07/2008
Localidade: Alcobaça
Mensagens: 464
 Re: Um conto que é romance
Tirando as risotas, os comentários ironicos do seu próprio ESCRITO fiquei...a relembrar quantos marios e marias e Barbosas, me cruzei pela minha minha loja de brinquedos ou quantas vezes fui eu o mario a maria e o Barbosa personagem de um futuro que acaba sempre a ser conjugado em passado
Um abraço