Poemas : 

CRÔNICA POLICIAL

 
quarenta minutos antes do casamento
a noiva colocou ponto final à vida
trancada no banheiro do apartamento
misturou chá de cidreira com formicida
pôs o vestido branco também grinalda e véu
morreu quando escutava o Bolero de Ravel

mas não deixou bilhete a explicar seu gesto
a xícara vazia a lata de veneno
em cujo conteúdo só ficara um resto
palidez não havia em seu rosto moreno
foi encontrada morta no frio azulejo
a boca vermelha como a implorar um beijo

___________________
júlio

http://currupiao.blogspot.com/


Júlio Saraiva

 
Autor
Julio Saraiva
 
Texto
Data
Leituras
2813
Favoritos
1
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
34 pontos
26
0
1
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 29/03/2010 12:09  Atualizado: 29/03/2010 12:09
 Re: CRÔNICA POLICIAL
Poema perturbante e pertinente.
Há casamentos mais trágicos do que o suicídio?
Abraço
nuno


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 29/03/2010 12:18  Atualizado: 29/03/2010 12:19
 Re: CRÔNICA POLICIAL
um beijo, talvez o último beijo que recebeu em vida: o da morte.

DM


Enviado por Tópico
Conceição Bernardino
Publicado: 29/03/2010 12:55  Atualizado: 29/03/2010 12:55
Usuário desde: 22/08/2009
Localidade: Porto
Mensagens: 3357
 Re: CRÔNICA POLICIAL
olá meu irmão,

uma fotografia brutal que desenhas em poema.

beijo carinhoso

és sem dúvida o meu poeta de eleição



Enviado por Tópico
Henricabilio
Publicado: 29/03/2010 13:54  Atualizado: 29/03/2010 13:54
Colaborador
Usuário desde: 02/04/2009
Localidade: Caldas da Rainha - Portugal
Mensagens: 6963
 Re: CRÔNICA POLICIAL
A realidade é muito mais criativa que a nossa imaginação.

Quanto à rima, aqui no nosso português de Portugal, "Ravel" não rima com "véu"...
Pormenores que o novo acordo ortográfico talvez consiga esclarecer.

Grande abraçooo!
Abílio




Enviado por Tópico
Alexis
Publicado: 29/03/2010 14:26  Atualizado: 29/03/2010 14:34
Colaborador
Usuário desde: 29/10/2008
Localidade: guimarães
Mensagens: 7238
 Re: CRÔNICA POLICIAL para julio
a imagem da noiva morta/suicida é em ti recorrente.com todo o seu simbolismo.todo o seu paradoxalismo.
o cortar abrupto da esperança,do sonho,da felicidade expectante.
o chá de cidreira com formicida.
o branco do vestido e o negro da morte.
o véu e a grinalda.
a xícara vazia,a lata de veneno ainda com conteúdo.
a palidez e a cor.
o frio azulejo,um beijo de uma boca vermelha que se implora e não chega.

sabes bem da força de tudo isto.morte e vida,em todo o seu esplendor.imagens inesqueciveis.associações delirantes,pelos corredores da mente...que dizer-te?que te leio. que feliz ou infelizmente sinto a tua poesia até à medula.que sinto que te entendo.

beijo-te.e queria que sentisses o calor morno deste beijo.como símbolo da vida e do amor.que te transmitisse coragem para amar a vida,ainda assim.bela e dura como a sabemos.há que saber amá-la.

alex



Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 29/03/2010 14:39  Atualizado: 29/03/2010 14:39
 Re: CRÔNICA POLICIAL
Um casamento eterno!

(talvez o único)


beijinho Julio.


Enviado por Tópico
HelenDeRose
Publicado: 29/03/2010 16:48  Atualizado: 29/03/2010 16:53
Usuário desde: 06/08/2009
Localidade: Sorocaba - SP - Brasil
Mensagens: 2022
 Re: CRÔNICA POLICIAL
Legal esse estilo de crônica em versos, Júlio. Estranho, fiquei aqui pensando no motivo pelo qual uma noiva, antes de se casar, faria isso. Levou consigo o segredo. Será que não amava o noivo? Será que não queria se casar? Por que será? Uma crônica misteriosa a sua. Tbm fiquei pensando no Bolero de Ravel, vc disse que foi pra rimar, mas, como sou uma estudiosa em simbologia, queria te dizer, que talvez vc tenha intuído algo, passo a explicar:

Bolero de Ravel, que possui 13 letras no seu total, lembra o Arcano XIII d'A Morte, tem um único movimento repetido em 169 vezes, por dois compassos. Se, somar 1+6+9=16 lembra o Arcano XVI d'A Torre em queda e destruição. Existem outros estudos que poderia citar sobre estes números, mas, não quero me prolongar. Interessante notar o ritmo do Bolero que começa com a caixa e vai numa crescente passando para todos os instrumentos, terminando num corte único no final. Bolero de Ravel foi feito a pedido de uma mulher, Ida Lvovna Rubinstein, uma dançarina russa, que no fim da vida morreu por complicações cardíacas. Bjo.


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 29/03/2010 16:58  Atualizado: 29/03/2010 16:58
 Re: CRÔNICA POLICIAL
Júlio!
Partiu sem dizer ao que ia ou ao que fugiu.
Ser jornalista é quase sempre escrever o que os olhos viram e esconder a comoção do que sentiram.
Neste poema, e como diz, consegue escrever o que viu, mas a mestria está na ligação das imagens que transmite.
Acabamos todos ao lado do jornalista, com o bloco na mão tomando as notas que serão notícia.
A diferença está apenas no semblante: O jornalista emociona-se por dentro, nós emocionamo-nos por fora.

Um Abraço
JLL


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 29/03/2010 17:11  Atualizado: 29/03/2010 17:11
 Re: CRÔNICA POLICIAL
Caro Júlio:

Parabéns pela realidade!

Muitos, (as), preferem sofrer de uma só vez, que, depois andarem a sofrer, aos bocadinhos!


Abraço

"Grapilho"


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 29/03/2010 17:30  Atualizado: 29/03/2010 17:33
 Re: CRÔNICA POLICIAL
Júlio, escreveste a realidade crua, do cotidiano nu, sem subterfúgios novelesco. aqui está escrito com tinta sangue de jornalista/reporter, a cena é extrato do teu olhar. o poema? ah! o poema foi escrito quando somente homem/poeta, pôs a cabeça no travesseiro. o profissional ficou no caderno de anotações em cima da mesa de trabalho.

beijo irmão.

zésilveira


Enviado por Tópico
ROMMA
Publicado: 29/03/2010 18:31  Atualizado: 29/03/2010 18:31
Colaborador
Usuário desde: 29/10/2008
Localidade:
Mensagens: 2460
 Re: CRÔNICA POLICIAL
no lugar dessa noiva trancava-me no banheiro tirava aquele vestido horroroso, vestia uma roupa sexy e fugia num cruzeiro hehe engatava o comandante do navio e ficava em alto mar a vida inteira e sem deixar bilhete hehe :))
falar serio agora, é facil quando se está do lado de fora, mas ninguém é obrigado a nada caso não queira! cheira-me a coisa muito pior que nem sei o que será nessa história... mas esse final de implorar o beijo, visto pelo poeta diz-me que ela esperava ser salva por um outro amor...
beijinho Júlio
gostei da história
Romma ;)