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O CASO FUGÊNCIO (Primeiro capítulo)

 


Em cada um de nós habita uma quantidade infinita de instintos é como que nós, o mais evoluídos dos animais, herdássemos e guardássemos em nossa genética, um pouco dos instintos que predominam em cada uma das outras espécies de animais.

Por algum motivo ainda desconhecido, alguns de nossa espécie, apresentam um e outro instinto mais evidente, daqueles que predominam espécimes menos evoluídos. É nesse desvio comportamental que se desenrola a vida e morte de Fugêncio.

Fugêncio nascera no lado mais pobre de uma cidade de Pernambuco. Foi concebido de uma relação única de dois moradores de Rua que num dia de frio intenso, de modo a se aquecerem juntaram corpos por debaixo de uma marquise, tendo como quintal um punhado de lixo, jornais velhos, uma garrafa de pinga e como cama um burrinho sem rabo onde naquela noite dormiram Dorotéia e Francisco.

Depois daquela noite Dorotéia jamais voltou encontrar-se com Francisco, entretanto nela, ele havia deixado marca para toda sua vida. A jovem pedia esmolas nos cruzamentos das ruas, comia restos de comidas deixados nos lixos das lanchonetes e por vezes, alguém lhe pagava um prato feito na birosca do seu Candinho.

Doroteia logo percebeu que seu corpo sofria algum tipo de transformação, passou sentir também mais fome que aquela já acostumada a sentir. Lembrou que sua menstruação que nunca fora mesmo abundante, já havia tempos que não aparecia e tudo se esclareceu no dia em que pedindo esmolas, uma senhora pergunta: Você está grávida minha filha?

Dorotéia até tentou trabalhar numa casa de família, mas sua aparência e seu estado constante de embriaguez não permitiram que saísse das ruas. Assim, fora vivendo com seu vestido sujo cada dia mais curto deixando cada vez mais, transparecer sua barriga de grávida. Outra senhora do bairro deu para Dorotéia, algumas roupas ao vê-la pedindo esmolas num dia de chuva com aquela barriga imensa.

E foi nesse despropósito que um dia nasce Fugêncio, nome dado por Doroteia ao menino em lembrança ao homem que nunca mais encontrou. O menino nasceu franzino pesando pouco mais que dois quilos e por conta do filho, foram abrigados numa dessas casas de apoio às mães solteiras de rua.

Mas, Doroteia não se adaptou naquela casa cheia de mulheres, cheia de crianças e cheia de regras. Logo que possível retornou à rua para pedir com seu filho no colo, algum dinheiro de modo manter a sobrevivência dos dois.

Fugêncio a cada mês aguçava seu instinto caçador e logo ainda no engatinhar, fora visto por sua mãe, com uma barata que havia capturado e interpelado por ela, quando levava a presa à boca. E presas, não faltavam para Fugêncio exercitar seu instinto. Dorotéia achava por vezes, até engraçado a rapidez com que o moleque pegava os pequenos insetos que no “quintal” de sua casa, passeavam.

Aos seis anos de idade, magrelo e desbocado Fugêncio, fora obrigado por sua mãe a pedir esmolas num sinal de trânsito quatro quadras distante daquele que ele e sua mãe ”trabalhavam.” Neste novo endereço o menino aprendeu roubar, bater, machucar, assim como, apanhar e ser roubado pelos outros meninos maiores.

Não demorou muito para o menino encontrar-se pela primeira vez com o seu saquinho de cola. Os anos passaram de pressa e cada vez mais se tornava espaçadas as visitas de Fugêncio a sua antiga moradia.

Aos dez anos de idade ao passar em frente da marquise onde vivera com sua mãe, não viu os jornais pelo chão nem aquele cobertor que lhe costumava cobrir.

Fugêncio permaneceu no local por mais dois dias, na esperança de rever ou ao menos ter, alguma notícia de Dorotéia. No segundo dia de sua permanência na sua antiga “residência,” Fugêncio conheceu um homem alto que dividiu com ele, aquela mesma marquise. Ao perguntar por Dorotéia, o homem lhe dá a notícia do seu falecimento, havia sido atropelada numa tarde depois de um dia cheio de cachaça.

O menino não chora nem esboça alguma reação apenas, olha para um canto do chão e captura com gana uma barata que ele esgana nos dentes se mostrando pensativo, como quem estivesse pensando em algum tempo do passado.

Fugêncio foi crescendo e com ele, uma revolta imensa, uma astúcia ainda maior e uma inteligência que também não era pequena. Aprendeu a se defender dos perigos das ruas e aprendeu rapidamente ser o próprio perigo.

Com onze anos de idade Fugêncio comete seu primeiro delito grave. Ao abordar uma jovem num sinal de trânsito após ter cheirado um saco inteiro de cola, o menino não gostando de como a moça se esquivava dele, passa vagarosamente no rosto dela, sua mão ao mesmo tempo em que falava com voz meiga. Você é muito bonita!

Na mão de Fugêncio mais precisamente entre os dedos, existia um caco de vidro cortante, que logo fez com que o menino ficasse com a mão toda vermelha do sangue escorrido do rosto da moça. A moça grita desesperadamente, pede socorro, o sinal abre e ela foge do menino que continuava ali, parado e rindo, parecia se deliciar ao ver sua mão cheia do sangue.

Dali para diante, sempre que existia a oportunidade, o menino deslizava sua mão no rosto ou no braço de alguma pessoa. Parecia sentir prazer no ouvir os gritos das vítimas. Mas, as malvadezas de Fugêncio não ficaram para sempre impunes, numa dessas crueldades, a pessoa agredida deu queixa do pré-adolescente na polícia e o menino, fora preso e encaminhado a uma casa de detenção para menores infratores.


Próximo capítulo
A VINGANÇA


 
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PCoelho
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