Contos : 

VESTIDO PRETO

 
Cheguei com as mãos frias e o meu peito tórrido. Música banal na barraca de água de coco, pessoas triviais com as suas vidas cretinas. Sim, eu vim com o meu peito carregado de culpa e amargurara.

Ela sempre chega atrasada, chegou atrasada na minha vida, e se chegasse antes seria eu uma pessoa melhor. Desceu do carro e apenas nos beijamos com os olhos, queria pular abruptamente nos seus lábios. Um dia eu vou fazer tudo no impulso, deixar de pensar um pouco e agir, só agir.

Permaneci calado, não queria me arrepender de nada que eu dissesse, sempre digo bobagens e depois peço desculpas. Até hoje tento entender como que ela consegue controlar esse meu gênio auto destrutivo. Bem sei que só ela consegue isso.

Cabelo laranja com as raízes castanhas, boina francesa preta e casaco com listas. Ah se ela soubesse como fica terrivelmente linda com aquele vestido preto. Se tivesse pelo menos a noção de como a desejo, e de como sou absurdamente louco pelo seu corpo.

Continuo sem nada dizer, caminhando a esmo e tentando escapar de mim mesmo. Acho um lugar perfeito para deixar essa angustia esvair-se. Dois bancos frente a frente. Eu deito e finjo dormir, ela senta e finge ler. E eu finjo muito mal, e ela me lê tão bem.

- fala comigo... Por favor.

Ela ameaça ir embora, um absurdo o meu truque. Enfrenta a minha loucura com coragem e razão. Tentei fugir dela várias vezes, principalmente quando percebi que estava perdidamente apaixonado por ela, que o amor que eu estava sentindo por ela era mais forte que eu. E por tal razão eu não consegui fugir, e nem quero.

Finalmente digo algo, coisas absurdas é bem verdade, cada vez que eu digo essas inquietudes a firo, magôo. As posições se alteraram, os olhos lacrimejaram, as minhas mãos suaram sem controle.

- fala comigo... Amor, por favor.

Eu sei que ela não me diz tudo, que coisas obscuras a aflige, e muito. Por conta de tudo tivemos uma conversa franca, onde por ventura pude expor as minhas diversas angústias. Morro de medo de perdê-la, para um carinha de uma banda, para uma menina. E até mesmo para um antigo amor, que até a nossa última briga eu não sabia da existência. Sim, eu a toco e ela nada sente. E como me esforço para tentar superar isso, para tornar o meu beijo mais agradável, para saber se nas preliminares ela sente prazer. Mas nada se compara ao medo de viver sem ela, mesmo não tendo a ilusão que ela viverá comigo para sempre, que não me deixá-la.

- eu não vou desistir de você.

Sexta-feira eu vou tentar de novo, não diria que é sexo para mim, sexo não. Existe algo muito maior envolvido. Talvez esse sentimento forte, inominável e explicável que sinto por ela. Talvez esse jeito confuso, jeito que eu tanto gosto, e que tanto quero compreender. Talvez por ela ser a única pessoa que me entenda e a única que eu deixo que me entenda. Talvez por ela me aceitar como eu sou, e por fazer de mim uma pessoa melhor. Talvez por eu desejar tanto o corpo, por sentir tanto prazer por ele.

Fato é que o amor que eu sinto é infinito e acima da compreensão de todos. Fato é que eu farei de tudo para viver ao lado dela. Fato é que ela me feliz, como eu nunca pensei que seria.




M.Cardoso

 
Autor
Mário Cardoso
 
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