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O esquecimento azul (parte IX)

 
O esquecimento azul (parte IX)
 
Dias correram desde a ida ao teatro de Francis e Lúcio, estranhamente, durante a peça ela sentia sensações diferentes, como se lhe tocassem dentro da alma... Cada palavra que a personagem principal feminina dizia, parecia palavras saídas de seus poemas na Terra, coisas que lhe eram peculiares... Mas como a atriz, as usava interpretando o seu papel, ela tomou isso como uma "coincidência"

Ela comentou isso com Lúcio e ele lhe respondeu:
_ Francis, nada é por acaso... Não há coincidências minha amiga... Alguma mensagem o autor da peça lhe quis passar, pois usou de suas próprias palavras, da sua linguagem, e ao nos convidar para assisti-la, ele já devia saber que causaria essa sensação em você...
_ E será que você poderia depois, quando não estiver tão ocupado, me levar até ele?
_ Sim, farei isso Francis.
Ela agradeceu com um sorriso nos lábios.


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Novas pessoas chegavam da Terra, em turbilhão, naquele dias.
Uma grande enchente em tal lugar, um desabamento que levara muitas casas de outro, um prédio inteiro que desabara...
Todos tinham que ajudar os recém chegados, estavam muito debilitados, por cada situação que envolvera suas mortes.
O hospital foi plasmado então, para aumentar de tamanho e assim ter mais leitos sendo ocupados por eles.
Francis foi uma das socorristas durante os primeiros dias, não oficialmente, mas como voluntária. Cuidava com carinho de casa pessoa que precisava de ajuda e entendimento da sua nova situação espiritual... Oferecia-lhes a água para recuperação, fluidificada justamente para isso e o carinho gentil de todo o seu ser...


Entre as pessoas que estavam sendo cuidadas no hospital, estava uma conhecida sua: D. Neide, que havia morado na mesma rua que Francis morava, na ocasião.
Um senhora ligada ao espiritismo de umbanda. E que algumas vezes havia estado em sua casa, não para isso, mas para lhe dar injeções porque era também enfermeira.
Ela estava no prédio que havia desabado, no apartamento do filho, cuidando do netinho, no dia fatídico...
O menino fora levado para a ala infantil do hospital, e Francis iria visitá-lo logo depois de falar com D. Neide.

_ Como está hoje, D. Neide?
Francis perguntava, segurando uma de suas mãos, sentada em uma cadeira ao lado da cama.
_ Ah, minha filha, ainda sinto algumas dorzinhas... Mas estou melhorando, obrigada. Sabe notícias do Dedé?
_ Isso que vim lhe dizer: Vou visitá-lo agora, se estiver em condições de ser transferido para a Colônia das Crianças, eu o levarei, amanhã ou depois...
Lá sou ajudante nas horas vagas. Mas antes disso, eu o trarei para vê-la. Logo que a senhora esteja totalmente recuperada, vocês poderão ficar juntos, na vila da colônia, por um tempo.
_ Sim, minha filha eu queria muito continuar cuidando dele, mesmo aqui...
_ Bem, isso eu já não sei... Não é do meu conhecimento, os planos de seus mentores... Ele terá um caminho para trilhar, a senhora também. Cada ser, tem seu próprio caminho para a Luz.
_ Ah...que pena, não poder ficar com ele para sempre...
_ 'Para sempre', não existe nem na Terra, nem aqui, D. Neide.
A senhora a olhou meio desconsolada... Sabia que Francis estava certa, D. Neide como espirita, mesmo sendo de umbanda, sabia das reencarnações contínuas do espírito, para conseguir progredir.
_ Eu sei, Francis, eu sei...
_ Bem agora vou D. Neide. Depois volto com notícias, ok?
_ Fico aguardando então.

Francis levantou-se e deu um beijo na testa da senhora. Seguiu pelo corredor e entrou na ala infantil, para procurar por André. O menino estava sentado na cama, olhando para a janela em sua frente. Francis se aproximou e perguntou:

_ Oi, André, você não lembra de mim, me chamo Francis, sou escritora. Mas fui vizinha da sua avó, lá no bairro. Você tinha apenas um aninho naquela época...
_ Agora tenho 8 anos. Já estou crescido! Mas esse hospital é no bairro? Estamos perto de casa?
_ Não é no bairro, está bem longe de casa, para dizer a verdade... Mas isso uma pessoa vem te explicar direitinho depois, uma pessoa escolhida aqui, só para te acompanhar e te ajudar na recuperação. Vai se apresentar para você, como seu mentor ou mentora...
_ E a vovó onde está? Como ela ficou depois do desabamento?
_ Fique tranquilo André: Ela estava machucada no início, mas agora já está bem, e aqui, nesse mesmo hospital.
_ Ah, que bom! Fico contente, porque a vovó é quem cuida de mim, meus pais trabalham o dia todo, só vejo de noite, quando chegam.
Francis olhou para André com um certo dó, sabia que seria um 'choque' quando soubesse que não estaria mais com seus pais...
_ Bem, vou então. Logo você vai ser levado por mim, para conhecer outras crianças: Tem um parque lindo, aqui pertinho, chama-se COLÔNIA DAS CRIANÇAS, onde elas brincam de várias coisas. Você vai gostar!
_ Parece legal, parque é sempre bom.

Francis balançou a cabeça afirmativamente e assim como em D. Neide, deu um beijinho na testa de André.
Saiu do hospital, diretamente para sua conhecida ALA "A", no prédio onde estava acomodada desde o dia que ali chegou. Uma força estranha a levara diretamente para lá, como se fosse um chamado telepático de alguém... Estava certa: Ao entrar nos corredores do prédio, Lúcio a aguardava com uma fita larga, azul, em suas mãos, juntamente com mais duas pessoas que Francis subitamente identificou: Eram 2 mentores que estavam na sala de reuniões, naquele dia, em que Lúcio a levara até o outro prédio.

_ Francis já sabe que te chamamos...
Disse Lúcio.
_ Sim, percebi isso agorinha. Mas o que seria?
Um dos senhores se aproximou, e pegando a fita das mãos de Lúcio, a colocou nas de Francis, dizendo:
_ Com essa fita azul, você, Francis Anjos, torna-se agora mentora de André Vilardes.
_ Eu?
_ Sim, pelo total de seus atos aqui e pela capacidade de comunicação com os pequenos que demonstra sempre. Agora mesmo, tratou com cuidado do menino. Saberá seguir em frente com esse trabalho.
Ela olhou surpresa e interrogativa para Lúcio, que compreendera tudo naquele momento: Francis sendo mentora, não precisaria mais de seus cuidados.

( continua )


Fátima Abreu
 
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