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Um dia na vida de Constantino Dostoievski

 
UM MES NA VIDA DE CONSTANTINO DOSTOIÉVSKI

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Tudo aconteceu naquela manhã de quinta feira, no ultimo mês de outubro, dezoito dias após o falecimento de sua genitora. Fazia um belo sol e tudo transcorria normalmente. O trabalho na pequena oficina começara cedo, as seis e meia no intuito de despachar e finalizar logo aquelas encomendas que já se arrastavam há mais de quatro semanas. Primeiro soldou o batedor do portão de duas folhas, na manhã anterior combatendo a sua imperiosa preguiça soldou os três ferrolhos e os seis gonzos. As noves e pouco iniciou a solda das laterais das três grades com bojo para as janelas. As dez e meia, adentrou esbaforido no atelier a figura aflita do dono como sempre apressado. Constantino ainda tentou convencê-lo de apanha-las no outro dia, pois ainda ia pinta-las, mas o dono inflexível respondeu-lhe que queria leva-las e as pintarias pessoalmente em casa. A ultima fase, o corte a talhadeira dos doze chumbadores para as grades. A todo momento, o dono apressado alegava, que o motorista com quem havia combinado de busca-las, não veria por causa do horário. Constantino suado e agoniado sentado num tijolo próximo pequeno pedaço de trilho já cortara dez pedaços, e a todo momento o martelo sacava do cabo, mas o mesmo não dera a minha atenção, era rotineiro. Mas um leve pensamento aflorou-lhe na sua congestionada mente: "Isso ainda vai me ferir". Na sua pressa de concluir logo e assim usufruir suas benesses, não prestou muita atenção e nem bateu o martelo na ponta do cabo no trilho para fixa-lo melhor. Em câmera lenta, a mão esquerda segurando o toco de talhadeira de aço resistente, feita da ponta de eixo da barra de direção de Mercedes-Benz e instintivamente levantou a mão direita que segurava o cabo do martelo para bater na pequena talhadeira, quando sentiu o cabo leve e percebeu que o martelo sacara do mesmo, subindo até uma pequena altura. Fechou os olhos com medo que o mesmo atingisse sua cabeça, a mas ele caiu sobre o dedo mindinho que estava apoiado no trilho abrindo um
corte na ponta. Uma dor lancinante penetrou no intimo de sua alma, levantou rapidamente, o sangue jorrava e a falange pendia mole. O dono fez uma cara de surpresa e amarelou a face preocupado.
- Quebrou o dedo, Seu Constantino?
- Não apenas feriu - murmurou entre os dentes segurando a dor.
O sangue brotava pelo corte, ela andava como um louco de um lado para outro, tentando amenizar a terrível dor que dilacerava o seu sofrido ser.
- Bota álcool ou água - Disse meio-nervoso o dono, talvez com o sentimento de culpa pelo acontecido devido a sua insistência.
Mesmo sofrendo, Seu Constantino não se deixou levar pela emoção, apanhou uma camisa velha no fundo da oficina, rasgou uma tira e enrolou no dedo ferido para conter o sangramento. O dono deu o nó final. Após esse procedimento básico, Seu Constantino retornou ao trabalho com mais garra. Faltava dobrar as pontas das mesmas no torno. Com um esforço sobre humano e um pouco escabreado, foi dobrando um por um no torno caseiro (feito pelo seu pai mestre), cuidados sempre verificando e batendo a ponta do cabo com o martelo no trilho para fixa-lo melhor e assim evitar outro inoportuno acidente. Concluindo essa fase passou para a ultima a solda das mesma nas respectivas grades. E sem muitas delongas, ligou a o velho transformador de solda Bambozzi na tomada e mandou brasa sem muita perda de tempo. Para ele, não importava a dor causticante que i infligia impiedosamente, o mais importante era terminar logo aquelas malditas grades e entrega-las ao impaciente dono e lógico receber os seus honorários para honrar os seus pequeno compromissos. E assim aos trancos e barrancos, como um maratonista ébrio de cansaço e fadiga quer de qualquer maneira ultrapassar a linha chegada, ele soldou o ultimo chumbador, desligou a maquina se sentou na cadeira de macarrão.
Enquanto soldava a ultima grade, mandou o proprietário telefonar para o motorista vim busca-las, mas o celular do mesmo estava desligado ou fora do ar. Então o nosso ferido herói orientou-o a procurar um amigo seu, dono de um comercio pequeno do lado do mercado, que nas horas vagas fazia fretes com sua camionete Marajó. E assim dez minutos depois, no momento que fazia a ultima solda numa das laterais de uma das grades e a colocava-a no chão para desempena-la. Eles chegaram. Colocaram primeiro os dois portões de depois as duas grades sobre elas na carroceria. O gentil-homem contente pagou-lhe o restante e entrou no caro. O amigo comerciante e motorista de frete nas horas vagas agradeceu-o pela preferência e partiram felizes.
O Sr. Constantino era separado e morava com a família de seu irmão mais velho na casa que sua falecida mãe deixara para eles como herança . Chegou quase ao meio-dia e sua cunhada ficou aterrorizado quando viu o pequeno dedo ferido. Ela perguntou e ele contou a história do acidente. Ele desenrolou a pano e a ponta dedo pendeu para baixo.
- É bom tu ir para o hospital . Teu dedo está quebrado - disse ela , observando a ferida - O corte no dedo é muito feio. Foi muito profundo.
Mas ele virou a cabeça de lado.
- Quem nada , isso é apenas uma lesão trivial , basta fazer um bom curativo e colocar " sulfa " no corte - disse ao entrar no banheiro.
Após o banho, sua prestativa cunhada fez o que ele disse . Mas ainda o dedo continuava a latejar. Vestiu-se e foi para o centro da cidade, pagar a conta de energia elétrica para a sua oficina e levou ' a compra de livros em uma livraria no bairro da Praia Grande .
E agora sentado no seu pequeno sofá, o seu refugio onde passava as tardes todas deitado lendo os seus livros. A cunhada palitando os dentes recordando a sua juventude no interior onde fora criada no meio da inocência. O marido da sobrinha, o deficiente visual jantando sozinho na mesa, as amigas da sobrinha rindo as socapas na escuridão do quarto da pequena Larissa vendo uma comédia. Um gatinho deitado, dormita entre os pés dele. Chorrinha,a cadela deitada e o dedo doendo com a sua ciática. Ele relembra cada minuto de sua atribulada manhã de trabalho que começara as seis e meia, depois de uma noite que passara rolando de um lado para outro na cama sem sono e preocupado se iria dar conta do que se propôs ou seja finalizar as grades e entrega-las ao dono.
Foi um dia bom, apesar do petit acidente. Ele pagou seus principais credores. Seu Raposo, Tia Nana que devia a lavagem de suas surradas roupas e a sua Cunhada a ajuda passa as despesas. Comprou uma banda de galinha assada, antes porém, depois do banho a cunhada desatou o curativo improvisado e fez-lhe um outro com álcool 70 e sulfadeazina triturado, gazes e etc.. E assim depois que trouxe a galinha cortada e meio maço de cigarros para a cunhada, partiu contente para o centro. Iria ao Sebo Poeme-se comprar a sua droga, livros para o seu deleite e prazer. Adquiriu dois; um de um escritor russo Andrei Bitov "A Casa de Puchkin" e outro do novo filosofo francês-argelino Bernard- Henry Levy "Os Últimos Dias de Charles Baudelaire".

O Sr. Constantino chegou ao hospital municipal " Socorrão " no centro da cidade, oito horas da noite, depois de hesitar muito. Ele estava na Lan-house quando percebeu o dedo mínimo da mão esquerda continuava sangrando um pouco .E então resolveu ir para o hospital. Foi para casa e disse à sua preocupada cunhada , que iria para o hospital . Ela respirou aliviada. Pegou a mochila e saiu.

O nosso inglório herói agora sentado num banco hospitalar em frente a porta do raio-x, a espera das chapas de seu dedo. O sangramento continuava, então temeroso resolveu finalmente seguir o conselho de sua Cunhada e encaminhar-se a um hospital. Ele estava na lan-house quando percebeu que o curativo estava empapuçado de sangue e latejando muito. Um menininho de olhos assustados acompanhado pela mãe sentou-se ao seu lado até o técnico chama-lo para entrar.. Ele estava no Hospital "Socorão I" no centro. Ele ia para a UPA, mas ao entrar num lotação, o seu colega Mozico estava sentado no banco da frente ao lado do motorista, agitado contando que ia para o "Socorão I", porque seu Primo Castratti fora baleado com dois tiros e estava passando mal..
A porta da sala de raio-x se abriu e o técnico lhe entregou as chapas.
- Quebrou?
- Não sei, só eles que podem dizer - respondeu laconicamente o técnico e fechando a porta em seguida.
Depois de receber a chapa o nosso inglório herói retorna a sala de Pequenas Cirurgias, onde um medico branco grandão e barbudo, olha e analisa a chapa e chega a triste conclusão que o dedo quebrou...e o envia para a sala de ortopedia no mesmo corredor. O ortopedista analisa a chapa e chega a conclusão que caso de cirurgia, mas infelizmente ele terá que fazer no outro Hospital Socorraõ II na Cidade Operaria, o mesmo hospital onde começou a triste saga de sua falecida mãe. O medico e o auxiliar disse-lhe para esperar uma ambulância que o levará. Segundo o Ortopedista ele corre o risco de perder o dedo. Era só que faltava para o cumulo de azar. Começou a sentir calafrio. O gurizinho de olhos assustados sai da sala com o braço engessado levado pela nervosa mãe. O corredor lotado de macas, todas ocupadas com doentes e seus companhantes. Ainda bem que o seu senso de aranha funcionou mais rápido. Mas nada estava resolvido, o drama continuava. Ano passado, ele e o irmão Biné passaram a noite toda nesse mesmo corredor acompanhando a mãe que tivera um mal súbito. Ele aguarda com paciência a ambulância que vai leva-lo para o mesmo purgatório. O medo de perder o dedo e outras coisas ruins. Uma senhora na cadeira de roda acompanhada pela filha tem uma convulsão. Logo quando chegou em casa, sua Cunhada insistiu para que o mesmo fosse logo ao hospital, mas negligenciara e ignorou os conselhos dela. Um guarda rotundo conversava pelo walkie-talkie com outro parceiro. Ele sentiu o corpo esfriar, ao seu lado uma senhora obesa cochilava sentada. O auxiliar do Ortopedista saiu da sala. Por que para ele tudo é complicado? Tinha de haver esse acidente, algo inesperado que desviou-lhe de sua rota normal. E as dores continuavam. Uma loirinha afável anuncia que há distribuição de sopa no terraço. Uma senhora acompanhante ao lado fala para uma colega que a sopa é do Centro Espírita e ele é evangélica. O responsável pela sua transferência voltou para a sala e prometeu-lhe que iria telefonar para o motorista da ambulância. O velho clima tenso de hospital, mas uma desventura para o nosso inglório herói que não sabe o que lhe espera. Será que vão amputar -lhe o dedo ou algo pior? Um pai com o rosto preocupado carrega a filha desmaiada nos braços, um Soldado PM passa arrogantemente. O Ortopedista e o auxiliar saem da sala, ele acha que vão merendar ou vão embora. Ele fica na expectativa.
Vai ser uma longa noite de espera e vigília. Começou a bocejar, o dedo suava. O Homem de Ligação voltou com uma sacola com um litro d'água mineral e um copo de suco, entrou e saiu rapidamente da sala e entra na outra mais frente O rapaz da maca próxima vomita e a acompanhante apanha uma lixeira.
- Foi tomar o remédio de pressão alta.
Uma velha conhecida dos tempos da Vacaria, a companheira de Seu Raimundo Cara-Larga sentou-se ao seu lado junto com um irmão doente. Depois de horas esperando, quase meia-noite o motorista da ambulância chegou esbaforido veio falar com ele. Disse-lhe que não adiantaria leva-lo, porque não havia nenhum cirurgião de plantão e o melhor era ele ir para casa e de manhã cedo ir para o hospital. Cansado e sem opção resolveu aceitar o conselho. E retornou ao lar doce lar.

 
Autor
r.n.rodrigues
 
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