Contos : 

PÉ DE VALSA

 
Ela foi imperiosa quando disse que eu dançaria com ela no dia do baile. Tentei argumentar dizendo que eu era muito velho para qualquer tipo de dança e que havia outros jovens que poderiam fazer um belo par com ela. Ela disse não, não e não. Que seria eu e ponto final. E ponto final para ela era ponto final e pronto.

Eu conhecia aquela pestinha desde pequena, praticamente a vi nascer. Mas isto foram outros tempos, agora ela já era uma adolescente descobrindo as maravilhas do mundo e a nossa amizade ficava em segundo plano. Não podia reclamar de nada. Sempre que ela precisou de meus conselhos eu os dei alegremente sem pedir nada em troca.

Eu não sabia dançar, e quando o fazia pisava sempre nos pés das mulheres, era todo desengonçado no meio do salão. Entrei numa aula de dança de salão que ficava perto de casa. A professora era bem bonita, e isto facilitou o aprendizado. Nos primeiros dias foi uma catástrofe total. A coitada da professora ensinava os passos, 1 ,2 ,3 4, eu não passava do dois. Repetia, 1,2,3,4, repetia 1,2,3,4 e 1 ...2....3... e 4. Errava uma, errava duas, errava três e errava quatro vezes seguidas. Mas eu não podia desistir, não queria me transformar num bailarino que rodopiava solto pelo salão, queria apenas dançar uma valsa. E parecia que eu não iria conseguir dar conta do recado. O lago do cisne ganharia um pato feio em sua coreografia.

No dia da festa eu estava muito nervoso. Os convidados foram chegando e se instalando no salão. Todos os homens estavam engravatados e impecáveis. As mulheres estavam todas maravilhosas e deslumbrantes, ate as crianças estavam a caráter. A festa prometia ser muito boa. A única preocupação que tinha no momento era saber quando começaria a tal da valsa.

De repente as luzes se apagaram e tudo ficou em silencio. Todos os rostos se voltaram para a porta por onde ela entraria. Então soaram as trombetas e luzes coloridas começaram a iluminar o salão. Todos começaram a aplaudir extasiados a entrada da debutante. Ela começou a andar na minha direção com passos decididos e graciosos. A medida que ela se aproximava, mais comovido eu ficava, as lagrimas presas pela emoção escorreram pelo meu rosto despreocupadamente. Ela estava radiante num vestido longo e diáfano, sua expressão era de total alegria a satisfação de ver um sonho se realizando.

Ela parou na minha frente e eu peguei suas mãos tremulas e coloquei uma no meu ombro esquerdo e a outra segurei firme. Nos encaramos por alguns segundos e lhe dei uma piscada de olho e disse baixinho que tudo ia dar acerto. Quando os primeiros acordes soaram tudo a minha volta desapareceu, senti que dançava nas nuvens. Não sei quanto tempo durou a valsa, e nem quando fui trocado por outro da fila, eu só me lembro que comecei a contar mentalmente, 1, 2, 3, 4....1, 2, 3 , 4..... 1, 2 ,3, 4


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Autor
Adão Jorge dos santo
 
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