Poemas : 

CARTA-POEMA EM TOM DE DESPEDIDA

 
penso tudo nesta hora em que a partida se aproxima

penso o muito que não fiz e o nada que por aqui deixo

parto de mãos vazias como cheguei

só levo um pouco de crepúsculo no bolso da minha jaqueta rasgada

deste mar no entanto não levarei nada

nada nada nada

as lentes dos meus óculos talvez

à minha revelia levem alguma paisagem

que os meus olhos distraídos e fracos deixaram de ver

abre bem as janelas

para que o cheiro do meu cachimbo desapareça da casa

cuida de apagar as minhas digitais do teu corpo

adeus é sempre adeus e não carece de riqueza de detalhes

se por acaso a música que inventei numa flauta imaginária

incomodar os teus ouvidos

é fácil destruí-la:

basta colocar no aparelho um rock qualquer

no mais alto volume e acompanhá-lo com palavras obscenas

maldizendo o homem que fui

não te esqueças de pedir ao diabo que me carregue

no próximo inverno prometo quebrar teu sossego

enviando notícias minhas do fim do mundo talvez

_____________________

júlio s.


Júlio Saraiva

 
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Julio Saraiva
 
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 27/07/2008 15:51  Atualizado: 27/07/2008 15:51
 Re: CARTA-POEMA EM TOM DE DESPEDIDA
Amargo, sim. Mas cheio de atitude! Esse adeus não é definitivo, afinal, promete enviar notícias, mesmo do fim do mundo.
Um abraço, Júlio.


Enviado por Tópico
Ledalge
Publicado: 27/07/2008 17:49  Atualizado: 27/07/2008 17:50
Colaborador
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 Re: CARTA-POEMA EM TOM DE DESPEDIDA
MEU PAI DE DEUS! COMO SE DIZ AQUI NA MINHA PARANAGUÁ...ONDE VOCÊ ENCONTRA TANTO A DIZER EM TÃO POUCO ESPAÇO?...UMA VIDA AQUI NESSAS LINHAS. O FIM AINDA INCERTO. JÚLIO, NEM SEI MAIS O QUE DIZER. SOBERBO!
BEIJOS
NÚRIA


Enviado por Tópico
Carolina
Publicado: 27/07/2008 18:12  Atualizado: 27/07/2008 18:12
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 Re: CARTA-POEMA EM TOM DE DESPEDIDA
Muito bem Júlio, está demais esta carta poema, nele fala do tudo e do nada, afinal as preocupações de todos, o que fizemos de bem e de mal e se valeu a pena.
Parabéns poeta
beijo


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 27/07/2008 19:06  Atualizado: 27/07/2008 19:06
 Re: CARTA-POEMA EM TOM DE DESPEDIDA
Caro amigo.
Existe verdade?
Onde começa e acaba o calor de um copo?
E de um corpo?
Senti um poeta em viagem neste poema. A separação de si mesmo e o desdém que revela de si é tão só a canção do seu descontentamento, se calhar alento?
Eu gosto destas tuas partidas e chegadas e sinto o cheiro do teu cachimbo.
Manda vir, que bebo contigo e parto.
E a mulher?
Ah, essa é o poema. Ou não é?


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 27/07/2008 19:43  Atualizado: 27/07/2008 19:45
 Re: CARTA-POEMA EM TOM DE DESPEDIDA
"Há uns que morrem antes; outros depois. O que há de mais raro, em tal assunto, é o defunto certo na hora exata."
Mário Quintana


"cuida de apagar as minhas digitais do teu corpo"...adorei!!!

Afinal! vc já escolheu o terno do defunto? o sapato, a meia, a cueca, o cinto?...rs

"A morte é a libertação total: a morte é quando a gente pode, afinal, estar deitado de sapatos".Mario Quintana.


Enviado por Tópico
Karla Bardanza
Publicado: 27/07/2008 20:26  Atualizado: 27/07/2008 20:26
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 Re: CARTA-POEMA EM TOM DE DESPEDIDA
Esse adeus pressagia uma volta!Muito bom!

Afeto!

Karla Bardanza


Enviado por Tópico
flavio silver
Publicado: 27/07/2008 21:15  Atualizado: 27/07/2008 21:15
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 Re: CARTA-POEMA EM TOM DE DESPEDIDA
aplaudo este poema.
julio saraiva ao vivo aqui no lusopoemas.
um abraço verdadeiro.


Enviado por Tópico
VónyFerreira
Publicado: 28/07/2008 13:01  Atualizado: 28/07/2008 13:01
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 Re: CARTA-POEMA EM TOM DE DESPEDIDA
Julio, esta carta-poema, é de uma beleza ímpar.
Deixa no entanto, um amargo qualquer, porque mesmo que as despedidas sejam momentâneas, doem sempre.
Como está belo este teu poema, Júlio!!
- Lindo...!
E para que te lembres a cada instante de dúvida e de alguma amargura dissimulada, até o adeus é relativo!
Nunca me despedirei de uma pessoa como tu!
Tens uma alma tão bela, que para mim será sempre um até já...!
Então... até já... POETA!
Vóny Ferreira