Sonetos : 

NADA É O QUE PARECE

 
(HIPER SONETO)

Respiro os vapores duma ilusão
Como quem pertence à humanidade.
Mostro os sabores da iluminação
A quem está preso à realidade.

Ouço vozes de silêncios antigos
Como memórias de vidas passadas
Ecoando no fundo dos abrigos
Onde guardo as lembranças mais amadas.

Cheiro odores das flores da ambição
Que nascem em caminhos de humildade.
Vejo as cores com que se escreve razão
No coração de quem sente a verdade.

Sinto o toque de tormentos amigos
Como brisas de terras assombradas
Onde armadilhas evitam perigos
E pistas aparecem desvendadas.

Saboreio venenos de inimigos
Como ofertas de curas adiadas.
Com gritos que me ferem consigo os
Antídotos das doenças caladas.

Conheço os horrores da imaginação
Nos devaneios da sobriedade.
Sei quais os valores do bom cristão
Afastando a religiosidade.

Aceito quando esmolas de mendigos
Me escolhem como moedas faladas.
Não esqueço assim nenhum dos umbigos
Quando aquelas palavras são lembradas.

Embalo as dores da minha prisão
Onde as correntes são de liberdade.
Conquisto amores ao querer paixão
Quando o amor deu lugar à saudade.

Antevendo o passado que irei ter
Revejo o futuro nessas lembranças
Que se formarão enquanto viver.

Lanço os dados do meu próprio destino.
E no seu livro de páginas brancas
Não encontro as letras de algo divino.

A não ser que divino seja eu
E o que em mim pode criar as mudanças
Que o destino ainda não escreveu.

Além de todo o mundo me escrever,
Também sou de mim próprio o escritor;
O comandante do rumo a escolher.

Há muito no caminho que imagino
Os passos a dar p’ra tornar maior
A vaga chama com que o ilumino.

Embrulhado em tudo o que é e foi meu
Descubro que não sou esse exterior
Pois nada foi o que me pareceu.



José Roque

 
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JoseRoque
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1947
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Enviado por Tópico
Sterea
Publicado: 02/09/2008 17:46  Atualizado: 02/09/2008 17:46
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 Re: NADA É O QUE PARECE
Nada, nunca, não é o que parece... Nada nunca é o que parece. As aparências, nunca, não são a prece, Ao Deus que na razão sempre perece...

Enviado por Tópico
Ibernise
Publicado: 29/07/2009 19:28  Atualizado: 29/07/2009 19:30
Colaborador
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 Re: NADA É O QUE PARECE
Olá Henrique-Cachetas


Senti o ritmo e o entrosamento entre as rimas está perfeito.Henrique vc cuidou muito bem destas questões. O soneto (HIPER SONETO) n parece ser uma colcha de retalhos. Está íntegro, este é o grande mérito da execução.Mais ainda, pela temática, q foi desenvolvida e concluída na essencialidade.

Destaque do fecho de ouro:

'pois nada foi o que me pareceu.'

Vejamos o terceto final, espetacular

'embrulhado em tudo o que é e foi meu
descubro que não sou esse exterior
pois nada foi o que me pareceu.'

O eu poético, passou por todas as considerações da reflexão que se pôs existencialista, lembranças, crises, questionamentos e no final quase n se reconhece na intencionalidade do ser, posto q mais lhe parece obra do acaso.É isso ele se mostra cético depois de ter reconhecido quase tdo o q lhe daria uma nuance de certeza, mas ele se posiciona, ainda, qdo mais duvida...

Parabéns.Eu recomendo vc e o seu soneto como favoritos.

Bjs

Ibernise