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Suave Tentação

 

A névoa que cobre os pastos espalha-se lentamente pelos caminhos cobertos de folhas secas que levam ao celeiro, numa manhã fria de domingo em que o tempo parece ter parado no sono profundo de Zacarias. Alheio ao chilrear dos pássaros lá fora, nas palhinhas deitado estremece o celeiro com o zumbido muito próprio do seu roncar, que em nada parece incomodar Tobias, o seu fiel amigo e companhia da pastorícia. Que meio contorcido a seus pés dorme calmamente, estranhando o facto de o dono não se erguer na madrugada para levar as ovelhas a pastar, mas nada diz ficando ali no quentinho imóvel como se não estivesse de facto acordado.
Lá fora ouve-se ao longe um pequeno estrondo como se fosse muito distante dali, mas Zacarias teria a exacta noção que não o era, conhecia como ninguém os ruídos do campo, e levanta-se à pressa para ver de que se trata, na falta de melhor motivo para se levantar no seu dia de folga esse seria um motivo a explorar… Tobias segue-o como sempre incansável na vontade de servir a seu dono a troco de meia dúzia de festas e um prato cheio de restos.
O andar lento era apressado tanto quanto as cicatrizes da guerra o permitiam, apoiado no cajado arrastava os pés pelo chão, seguia como podia parando para descansar, enquanto fumava um cigarro daquele maço que o primo lhe mandara do Canadá.
De novo um ruído estranho como de quem pedia ajuda, lá para os lados do desfiladeiro que havia perto do riacho faz Zacarias apressar de novo o passo pelas veredas que davam ao desfiladeiro.
Local aprazível de encantar a vista, atraía a objectiva dos turista que visitavam a montanha à procura de contemplar a paisagem que se estendia por montes e vales, aldeias e casas isoladas a perder de vista.
Um miradouro que parecia fazer o visitante flutuar pelos céus, como se fosse uma viagem nos olhos de uma águia tivera escrito um famoso escritor que de visita ao local tivera feito essa observação ao pastor que lhe tivera servido de guia.
Chegando perto do local de onde vinha aquele barulho, o pastor começa a ouvir os gemidos de uma jovem rapariga que se encontrava enclausurada numa viatura que foi de encontro a uma árvore centenária sem sequer a lascar, mas que quebrou o carro todo de forma a que ela não conseguisse sair.
Estabelecido o contacto visual o pastor vê tratar-se da mais linda mulher que seus olhos haviam beijado, acorre com prontidão a fim de libertar a jovem mulher que tinha desmaiado vencida pelo cansaço.
Ao pega-las nos braços sente uma sensação estranha, que lhe percorre a coluna. Repara que ela inconscientemente o abraça num gesto terno.
Ela acorda e sente-se segura nos braços de um desconhecido, tão segura que volta a fechar os olhos.
Deita-a com todo o cuidado no solo, e fica a observa-la como se ela fosse um objecto de culto, sem saber que tinha sido mordido pelo bichinho da paixão.
Quando ela abre os olhos ele é surpreendido pelo azul do mar em seu olhar, que o deixa ainda mais encantado.
Foi então que ela perguntou que foi que aconteceu. Não se lembrando de nada sofrendo de uma amnésia temporária, não se lembrando nem se quer do seu próprio nome.
Vendo a dificuldade da rapariga e sem nenhum documento que a identificasse decide leva-la para o celeiro, onde vivia, para cuidar das sua feridas e para que ela descansasse um pouco.
Depois de um banho no chuveiro que havia lá fora, uma refeição quentinha feita pelo nosso pastor, a rapariga sem nome adormece na cama de palha enquanto ele fica ali imóvel a velar seu sono, acariciando seu rosto ao de leve, sentindo algo novo em seu coração sem saber muito bem o que era.
A noite passa e o dia chega e trás com ele uma chuva delicada que se ouve nas telhas do velho celeiro, mas ele continua ali imóvel a contemplar seu rosto e demais contornos do corpo.
Ela acorda suave e delicadamente como se de uma princesa se trata-se, abre seus olhos e vê o nosso pastor a lhe dedicar tamanho carinho e devoção que sente de novo segura que lhe dá um abraço que o cora desde a ponta dos cabelos à ponta dos pés, ficando sem reacção nem palavras.
Zacarias era um homem que vivia um pouco amargurado com a vida embora amasse a vida que tinha, mas nunca tinha tido mulher nem filhos, na sua adolescência tivera tido uma desilusão de Amor que o marcaria a vida toda pensara nunca mais ligar às coisas do coração, via nas mulheres um inimigo que nem se chegava a aproximar tal o trauma que transportava em sua alma. Mas ali abraçado àquela jovem desconhecida, que nem seu nome sabia, começava a despertar de novo para a paixão e isso deixava-o envergonhado, sem saber o que dizer ou fazer.
Na aldeia ninguém diria que Zacarias voltasse a Amar tal era a convicção que falava em permanecer só, diziam que Tobias era a sua única família e que abominava tudo que usasse saias.
Foi então que ela vinda do nada o beijou profundamente, deixando ainda mais perturbado na sua falta de sentidos.
Dai em diante Zacarias e a jovem moça nunca mais se separaram, e a felicidade foi tanta que ela nunca mais procurou a sua anterior vida, diz-se na aldeia que ela recuperou a memória mas que continua num estado de amnésia psicológica por problemas que teve no passado. Passou assumir o nome de Ana Mar devido ao seu olhar fazer lembrar a imensidão do mar. E mais tarde tiveram um lindo rapaz que é a luz dos olhos de Zacarias.



Pedro Lopes in jornal "Ecos do Sor"


Porque existe Amor para além da morte, só a poesia exprime este sentimento,tornando-se imortal... Há quem escreva em busca da fama, eu busco falar com quem não me Ama...

 
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PedroLopes
 
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Enviado por Tópico
Saturnino
Publicado: 29/07/2007 01:24  Atualizado: 29/07/2007 01:24
Muito Participativo
Usuário desde: 23/07/2007
Localidade: Fx
Mensagens: 86
 Re: Suave Tentação
O amor é mágico também por este acontecer simplesmente, sem que o procuremos, sem que o desejemos. De súbito nos invade e nos marca eternamente.

Muito, muito bonito!

Abraço,

S.

Enviado por Tópico
ângelaLugo
Publicado: 31/07/2007 08:03  Atualizado: 31/07/2007 08:03
Colaborador
Usuário desde: 04/09/2006
Localidade: São Paulo - Brasil
Mensagens: 14852
 Re: Suave Tentação p/ PedroLopes
Pedro querido amigo

Ainda não tinha tido o prazer de ler
um conto teu...
Nossa! Está simplesmente maravilhosa
esta tua escrita você me surpreendeu
não é maçante é uma história muito
boa e com poesia...Parabéns!!!Amei

Beijo doce n'alma