Poemas : 

o velho que morreu sem ver o mar

 

Velho como a serra que calcorreia,
De perna bamba, às costas o cajado,
Barba rala, nariz adunco, pele macerada
Por companhia leva as ovelhas ao lado.

Suja e gasta presa nos finos ossos
A carne que lhe resta entremeada na pele
O velho caminha sem destino e sem lar
Exaurido pelos anos que das narinas expele.

Barqueiro sem barco, nem jangada
Em rio sem vida de margem estreita
Sobe a serra em passo dolente
Na busca de pasto e da paisagem perfeita

Nos olhos reflecte o verde dos montes
Mas era o azul imenso que ele queria,
Do grande rio sem margens, que lhe falam
As gentes que dali saíram um dia.

Um rio imenso onde pastaria sonhos
Perdido no alcance da margem inatingível.
Lá onde o céu se une a esse rio
Podia ser então o seu sonho possível

Ser menino outra vez e nos pés ter areia,
Não a terra ingrata que nunca o soube amar,
Morrer desfalecido na visão do azul,
Do imenso azul do céu e do mar
 
Autor
jaber
Autor
 
Texto
Data
Leituras
1077
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
12 pontos
12
0
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.

Enviado por Tópico
miriade
Publicado: 12/05/2009 17:01  Atualizado: 12/05/2009 17:01
Colaborador
Usuário desde: 28/01/2009
Localidade: Brasil
Mensagens: 2171
 Re: o velho que morreu sem ver o mar
Belissimo poema, uma homenagem eu diria, porque na verdade, existe mesmo como esse velho, muita gente que passa pela vida,sem ter o privilégio de conhecer o misterioso e bravio mar. Beijo Lu


Enviado por Tópico
(re)velata
Publicado: 12/05/2009 17:13  Atualizado: 12/05/2009 17:13
Membro de honra
Usuário desde: 23/02/2009
Localidade: Lagos
Mensagens: 2214
 Re: o velho que morreu sem ver o mar
Gostei do modo como deu voz à frustração neste seu poema.

Parabéns!


Enviado por Tópico
cleo
Publicado: 12/05/2009 17:40  Atualizado: 12/05/2009 17:40
Usuário desde: 02/03/2007
Localidade: Queluz
Mensagens: 3731
 Re: o velho que morreu sem ver o mar
Este tocou-me particularmente.
Quem disse que não se pode sonhar ou fantasiar com aquilo que se sabe não poder sequer ver?

A terra é uma ingrata, plantou o mar lá tão longe da serra. A mesma serra que aprisionou as vidas de quem nasceu nas suas encostas e não teve a oportunidade de as deixar sem olhar para trás sequer...

Gosto destes teus poemas, Jaber.

Beijo


Enviado por Tópico
RoqueSilveira
Publicado: 12/05/2009 17:45  Atualizado: 12/05/2009 17:47
Membro de honra
Usuário desde: 31/03/2008
Localidade: Braga
Mensagens: 8102
 Re: o velho que morreu sem ver o mar
Nas mãos mármore delicado
Sinal de suave adejar
Segue o caminho do azul
Como quem esquece o andar…

O teu poema é lindo e carinhoso para com a idade! Beijinho


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 12/05/2009 19:45  Atualizado: 12/05/2009 19:46
 Re: o velho que morreu sem ver o mar
unicamente carregar o peso e a responsabilidade do trabalho, é preferencial ou não, diferente em cada indivíduo. há o risco de transformarmo-nos em máquinas ou eremitas. se várias vezes deixarmos de cobrar da vida as oportunidade merecidas de desfrutar do que a própria vida nos dá; a vida entrega-se a morte mais rapidamente. senti uma certa dó pelo personagem do poema.

fraterno abraço Xará.

SIlveira


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 12/05/2009 23:20  Atualizado: 12/05/2009 23:20
 Re: o velho que morreu sem ver o mar
É deste josé Alberto escritor que eu gosto. Os outros que se amanhem.
Vibrante em cada descrição sem tempo mas que tem tanto do povo eterno.
É este o teu estilo, o teu gozo. Falta saber se estás disposto a gostar de ti.
Eu gosto tanto de ti assim, quanto gosto de um cão desaparecido que tinha dentro um homem.
Eu era parte dele, por isso te estendo a mão, na simpatia deste cão comum que somos.
Homens também.