Aos confins do universo

 
Aos confins do universo
 
Deslizo o olhar sequioso
Pelas águas salpicantes
Das vagas silenciosas e irrequietas
Desnudadas pela carícia do sol
Desta ilha enfeitiçada por ti
As escarpadas encostas brilham
Ante os meus olhos marejados
Pelo salgado cristalino do mar
E fustigados pela brisa arisca de mim

Meu corpo sulca as ondas
Guardiãs de vastos segredos
Imobiliza-se, insensível …estático
Abandonado por mim naquele barco
Perco-me em pensamentos delirantes
Translado-me para outra dimensão
De liberta comunhão existencial
Perco-me mais e mais, sem pudor
Nessa voluptuosa viagem
Aos confins do universo
Onde nada é proibido
Nada é recalcado
Tudo emerge na realidade
Da consciência consciente
Dos corpos e das almas.

Escrito a 13/11/08
 
Aos confins do universo

A viagem das palavras(Vóny Ferreira-Sãozinha)

 
A viagem das palavras(Vóny Ferreira-Sãozinha)
 
Vislumbro esse céu azul
que me apazigua os sentidos
oiço os cânticos dos pássaros
soltando ruidosos gemidos.
Agarro-os com os olhos e falo-lhes
Desse céu onde esvoaçam e brincam
Para que me adormeçam o medo
Que paira nos meus sonhos!

Voo com eles para um tempo que não conheço
procuro nesse voo um destino que desconheço
Fujo com eles para um futuro incógnito
Embrenho-me neste presente incerto…

Empreendo uma caminhada errante
no significado das palavras a guarida
É longa essa viagem no desconhecido
superando as angústias de um ser destemido.
E eis que me visto com pedras e musgo
Nessas palavras que me desventram a alma
Como se fosse refém de um mundo
Que crio nos momentos em que as exalto…

Caminho pelo significado das palavras
Do fundo do meu ser arrancadas
Descalço-as e cubro-as de terra
Porque nasci no meio delas…

É bela essa viagem que faço
no meu ser em sintonia
procuro palavras simples
no significado e na harmonia.

Beleza que afago e canto
Neste dueto que nos embala
Para enxugar o triste pranto
Quando deturpam a nossa poesia!

Não vejo fim á vista nesta viagem delirante
Na procura do significado das palavras
como um ser carente procura um amante.

Vóny Ferreira-São
04-03-2009
 
A viagem das palavras(Vóny Ferreira-Sãozinha)

dia após dia

 
é outono,
e eu sonho repetido
como sonha o vento,
do fundo da memória
volta o já vivido,
como outrora te invento
há folhas caídas à nossa porta
e a viagem quase um lamento
minhas mãos vazias
sinto-me morta,
há vontade de durar,
a vida persiste
mas a fragilidade do corpo
existe...

vou pespontando sonhos
entrelaço-os no peito
a esperança veste-se de menina
e assim deste jeito
continuo a amar-te
é minha sina.

há momentos de esquecimento
e há sempre a dor do dia
não quero que olhes minha tristeza
tuas horas, sejam azuis de harmonia

tenhamos o desejo
de começar amanhã
começar novamente com optimismo,
amando a vida
e eu cismo!
assim será eternamente
até que a tenhamos perdida.

natalia nuno
 
dia após dia

Saudade que fica

 
Saudade que fica
 
Noite
Insone
Me
Consome
As
Pálpebras
Não
Querem
Adormecer

Sofro
De
Saudade
Tanto
Tempo com
Você
Sei que
Vou
Chorar
Sempre
Que
Lembrar
Dos momentos
Felizes
Ou tristes
Mas
Prazeroso
O tempo
Vai
Entender.
Aos poucos
Fica
A saudade
Desses
Dias
Na tua
Companhia.

Mary Jun
19 mar 17
 
Saudade que fica

indiferença

 
é no silêncio da tarde
que envelheço, eu e meu dia
enterramo-nos nas sombras
e penso que na verdade
não sei quem me amou
nem sei se amei a quem devia

tudo deixo para trás
com um sabor nostálgico
final de viagem, em paz.

caminho que já não oferece
qualquer regresso
nem envolve qualquer esperança,
e o amor é perdida luz,
permaneço nesta letargia
desde quando as estrelas dormem
até à luz intensa do meio dia.

e é na tarde que meus dedos
adormecem, e esquecem
os anos vazios
e a cruel saudade
com cinzenta indiferença,
e da vida a profunda paixão
vai-se apagando dentro do coração

o vento o golpeou
e a solidão neste estado o deixou
com a nostalgia daquele que já
nada possui.

natalia nuno
 
indiferença

VIAGEM ADIADA

 
VIAGEM ADIADA

Tempo que não passa...
Pára na chuva em corredeira
Que bate, amassa gotas inteiras
A escorrerem em lágrimas à vidraça
E morrem rejuntadas à soleira...

Estaciona aos olhos da mente, um trem
Com maquinista, cobrador, mas ninguém
A habitar as cadeiras, as cabines...
Uma máquina de sonho movida a pensamento
Somente para me levar
Por onde eu puder ou quiser...

E o tempo que não passa...
E a chuva que empoça a vida por besteira...
E a umidade que, desconversa, intumesce o ar...
E o trem estacionado, enferrujando a janela...
 
VIAGEM ADIADA

Fotografei (Oh, Minas Gerais)!

 
Fotografei num abrir e fechar dos olhos.
Logo me apaixonei na retina desenho:
Imagem de quando, por ali passei.
Oh, Minas Gerais! És bela como uma donzela!
Esculturas da própria natureza que trago
Na memória, de olhos cerrados viajo...
Fosse esculpida pela própria mão de Deus.
Tuas matas, teus cerrados, teus desertos...
Tuas histórias que aprendemos na escola.

Mary Jun
Maio/23
 
Fotografei (Oh, Minas Gerais)!

AMAR-TE

 
AMAR-TE
 
AMAR-TE

É fazer a viagem de mãos dadas
É às vezes um silêncio vazio
Um jogo de palavras cruzadas
É o fogo descendo, causando frio.
Ficar nesse silêncio que dói
É às vezes não poder calar
O sentir que nos corrói.
O tempo que a passar
Passa por nós num voo rasante
Trazendo à lembrança o fogo distante.

Amar-te
É ainda me espantar

É olhar-te!
E minha mente povoar
de sonhos onde aportaste.

É bravo este amor de verdade
Pois ao ter-te a meu lado
Gôsto de outrora me dá saudade
É um desejo apertado
Sem tamanho nem medida
Sem nunca mais acabar!
Tanta chegada e partida...
E sempre o mesmo desejar.

Hoje e sempre o mesmo ardor
Longa nossa caminhada
Ainda tão semelhante o sabor!?
De tanta e tanta vez me sentir amada.
Juntos iremos até ao fim
Quero ser a personagem
Quero amar-te sempre assim
Até ao fim da viagem.

Encontrei-te
Pensei que tinha a alma vazia
Amei-te...
Neste meu jeito encantado
Era só saudade que sentia.
Nosso amor é o meu fado.

natalia nuno
rosafogo
 
AMAR-TE

Coordenadas

 
Coordenadas
 
45 milhas náuticas separam o céu da terra
Cá em baixo um encontro de mãos recorre a Deus
Lá em cima sensores e turbinas rasgam os céus
Sobrevoam agilmente continentes e mares
Já a sustentação se fez maior que o peso das asas
Aumenta a prece, só Deus sabe as coordenadas
Aqui prostrada, contigo voa a minha alma
De mãe, de tão pequena e atormentada




Maria Fernanda Reis Esteves
50 anos
natural: Setúbal
 
Coordenadas

Passos apressados

 
Um leve toque de brisa da manhã
no chão de bouquets perfumados,
Mas é ensonada esta vida cortesã
onde vivem os passos apressados.

Sol lusca fusca pelo poiso da Lua
no ar de bom dia a chilrear recados,
Mas é labuta mouca e sempre crua
onde correm os passos apressados.

Galho da laranjeira deu dois gomos
no mar de boa noite de entrelaçados,
Mas é somente na Terra dos sonhos
onde dormem os passos apressados.
 
Passos apressados

Turbulência

 
Turbulência
 
Há portas por onde embarcam
Atores de um mesmo destino
Foram eles que o traçaram
As nuvens que sobrevoaram
Suavizaram-lhes o caminho

Em baixo um mar de sargaços
Agita ventos alísios
A turbulência que passa
É sinal que a tempestade
Quando chega não avisa



Maria Fernanda Reis Esteves
54 anos
natural: Setúbal
 
Turbulência

A Viagem

 
A Viagem
 
Segue os passos indolentes de um vassalo que rasteja arduamente em seu legado, praguejando algo em sigilo.
— Pérfido destino!
Enquanto sua própria dor atina, segue em direção à rua calçada com pedras retangulares cheias de musgos e ipês floridos à sua beirada, se recordando das palmas estendidas, da face levemente ruborizada e dos beijos inacabáveis.
À espreita estava ela (a Lua), decorando a noite sombria. Era confidente e guardiã nas demasiadas horas da primavera. Sua única testemunha incumbida. Acima das nuvens ensanguentadas de escarlate, observava.

Repentinamente, algo o acomete, como uma epifania. Estava aprisionado, novamente, em um de seus próprios aforismos. Divagando entre os fatos coagidos e seu mundinho extraordinariamente ilusório. Era como se a utopia fosse realidade e a realidade, utopia. E, sob o efeito do clarão de uma ideia, retomou a consciência por autocompaixão e senso de coesão instantâneo. Meramente, haveria tido sorte. Após recuperar a visão, vagava a centímetros de distância de um veículo célere e descontrolado (percebera).
— Azarão! — fora o que, de fato, pensara.

— Quanto tempo se leva para ir até a Lua e voltar? — refletiu. Por dias, voltou-se para dentro de si, encerrou as coisas pela metade e recusou-se a dormir.
— Jah! Passo horas despertado, arruinando as fortalezas de minha própria destreza com abuso de paixões, devaneios, cigarro e as mentiras de sempre. — percebeu com certo horror espasmódico. — E ainda assim, é mais comovente do que aquela velha clinomania estagnada... — Antes que pudesse concluir os pensamentos, sua língua se movera lentamente enquanto a boca se abria, absorvendo ar suficiente para dar impulso às cordas vocais que, vibrando, se tornaram verborragicamente lacônicas. Apavorado, o vassalo sibilava a resposta por entre os dentes:
— Segundos.
 
A Viagem

Vou Voando

 
Eu vou de parapente rente as nuvens.
Olhar distante fito o que é finito.
Me perco pelos tantos tons ferrugens
Abismo feito crio o próprio grito.

A brisa sopra em minha triste face
O vento bate sobre os meus cabelos
Mas nada muda o meu olhar, disfarce
Procuro por teus olhos sem os vê-los.

Eu vou rente aos rochedos, mar aberto
Trazendo um sonho próximo do peito
Desperto quando noto não ser certo
Sonhar com teu amor sagaz, desfeito...

Eu vou voando pelo mar profundo
Levando um sonho grande na bagagem
Eu vou voando pelo mar do mundo
Levando teu semblante, tua imagem.
 
Vou Voando

"No brilho dos teus olhos"

 
"No brilho dos teus olhos"
 
"No brilho dos teus olhos"

Nesses teus olhos toda a vida
Nesse brilho que me ofusca
Olhar que é remédio pra ferida
E com sede minha alma busca

Que se confunde a paisagem
Que revela tanto mistério
Leva-me a uma doce viagem
Esse olhar profundo, etéreo

E se a boca diz muito pouco
Do que na realidade quer
Seu olhar irreverente, louco
Expõe toda verdade que houver

Seus olhos são pura promessa
De sonhos alimentados, ternos
De uma viagem sem pressa
Nos meus moinhos internos

Glória Salles
 
"No brilho dos teus olhos"

Ficar no poema

 
Dói não poder
ficar no poema
como se fica num tempo
inexplicável
como uma paisagem
com que se depara
nos prende
como numa viagem
que ainda não é de regresso
como uma janela se abre
ou como a chave
de que não vemos a porta
ou como a porta
de que não vemos a prisão.
 
Ficar no poema

espelho d'água

 
leva as águas para o mar infinito
deixa-me por aqui esquecida
afogada nas mágoas da vida
angústia nos olhos, na boca o grito.

escrevo, escrevo, seca de vontade
abro as torneiras do pensamento
mergulho o coração num mar de saudade
levo nele guardado o sentimento.

esta vida parideira de tantos dias
cobertos duma cortina de mágoas
faz de meus olhos janelas sem alegrias
vazando por elas as águas.

quem escuta o rumor da vida
nos dias e noites de enfadamento?
estranho estar, p'la vida seduzida!
se a esperança foi numa rajada de vento.

o tempo dentro dos meus olhos morre
e morre dentro do meu peito...
estranho adormecer enquanto a vida corre
ou sonhar assim acordada deste jeito.

é cedo...é tarde, cansada de tudo!
na memória sempre a remoída imagem
o tempo me ignora faz-se de mudo
já perdi a vida... mas, ganhei a viagem!
 
espelho d'água

Papagaio de papel em crise

 
Quero escrever o que ninguém escreve por ti
na correria e ilusão desse voo ser o primeiro,
no limite a proibição era falta de vento e jeito
nesse papagaio de papel que eu nunca esqueci.

Neste mundo de papeis de consumo em crise
estimulante é a mudança nesta história virtual,
reaprender com as inúmeras quedas em pique
e controlar esse fio por um papel de vida real.
 
Papagaio de papel em crise

SETECENTAS LÉGUAS

 
SETECENTAS LÉGUAS

Setecentas léguas segui caminho
Corri, parei, andei, voei, rastejei...
Por terra, mata, rocha e imensidão
Faustoso filme de sortidos cenários
De poder, fraqueza, nobreza e miséria
Chuva e corredeira, poeira e barreira
Tortuosidade, feiúra, beleza e exatidão...
Viajei ileso por tantas sonoras doideiras
De algumas mulheres abundadas de paixão...
Chorei por excêntricos gestos desumanos
E ri-me a valer junto a uns poucos homens bons...
Acariciei crianças sujas e medradas
Possuídas pelo terror das coisas da cidade
Como quando um raio risca o céu em descarrego
Vaguei em longas e perdidas noites de escuridão
Deparei com raparigas, donzelas, ditosas e perdidas
Dentro delas, natureza em fúria e humanidade
Inocência, virtude, malandragem e penúria...

Por mais setecentas léguas percorri jornada
De carona, a pé, no lombo da burrada
Luzes em postes, fumaça em asfalto
Casebres de tapera, bonitos edifícios altos
Asseio e sujidade, delícia e podridão
Continuavam, à minha revelia, sucedendo-se
Viagem estranha dentro e fora do coração
Povoados sucumbindo e cidades nascendo
Moleques roubando, trabalhando e estudando
Eles, de destinos traçados, apenas sonhavam...
Dormi em rede. Também em cama e chão
Antes do sono alguns oravam, outros gemiam
Uns em silêncio sofriam, outros só padeciam...
Acordava em dias gelados e mornos, em manhãs candentes
Nuns ajudava, noutros atrapalhava, beijava e brigava
Ilusões companheiras, amadas dedicadas ou ausentes
Trajeto de alegrias e desventuras, prazer e mágoas
Pujança da vida em desgraças afortunadas

Hoje preparo valise, corpo, alma e humor
Para as próximas setecentas léguas
Nunca saberei onde a trilha dá cabo
Nem demarquei seu confuso início...
Pois se esta velha estrada dá voltas
Não reconheço nem o que é recomeço
Pois o tempo sempre adultera a paisagem...
 
SETECENTAS LÉGUAS

Viagem

 
Viagem

Valeu viver viajando,
vagando veleiros vistosos,
voando viagens valentes,
visitando ventos velozes.

Vaguei vagões vaporosos,
virei - visando voar,
varando varas viris,
verás veloz verberar.

Violeiros, viajantes, vaqueiros,
vidas vividas - verdades,
valentes vantagens validam,
vacância vassala virada.

Vi verdejantes vales,
vivi vigiando voltar,
vontade viscosa velada,
valeu valer viajar.

Voltei, vaguei, velei,
vistoriei vagarosamente veludo,
véu virtuoso velado,
vazio vestíbulo vislumbro.
 
Viagem

VOU PARA SÃO PAULO DE TREM

 
Vou para São Paulo de trem
E o rumo do meu ser é ignorado

Vou espremido, ao banco pardo,
Mal e porcamente sentado
E levo nada além d'um olhar aquém...
Ah... Exceto o livro amarelado do Pessoa
Que leio sem jeito ao ritmo sacolejado,
De modo messiânico, à toa,
Concomitante ao desconfiado observar
Das gentes humildes ao meu derredor...

Cá estou eu... Indo para São Paulo de trem...
Vago na bruma cinza deste vagão vago
Porque, rumo certo, quem aqui o tem?
Rabisco este texto no dorso velho do livro
Conspurco o branco rasgado da obra do gênio
Mas eu vou de trem, num deserto povoado
Acompanhado do olhar meu,
Do olhar de todos, do olhar de ninguém...

Pessoa haveria de entender-me, sem me recriminar
De que o rumo do meu ser é mesmo ignorado
E que não posso esperar aqui, apenas sentado
Sem ao menos sonhar que uma poesia
Entranhada neste vagão solitário
Viaje comigo também...
 
VOU PARA SÃO PAULO DE TREM