Poemas, frases e mensagens de RomuloNarducci

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de RomuloNarducci

Poeta brasileiro, também é escritor, ator (Cia Quarto de Teatro) e idealizador do evento mensal Uma Noite na Taverna, que acontece no SESC São Gonçalo, no Rio de Janeiro.

Senhores do Mundo

 
Senhores do Mundo
 
Venham ó senhores do mundo,
de braços dados com vossas damas,
beber uísque e comer caviar
sobre o cadáver esquecido ao relento,
sobre as crianças prostituídas
e mortas de fome, que abandonaram
a infância em busca de pão.

Venham ó senhores e suas senhoras,
contemplar o mundo que vós construís,
ver que depois da chuva
a enchente levou o barraco

(e onde foi parar o arco-íris?),

ver que depois da chacina
"Só Jesus expulsa o demônio das pessoas".

No fim da festa pomposa,
o que restam são seus restos.
Restos homens e restos mulheres
que se banqueteiam debaixo de marquises
das lojas que Vós, ó senhores e senhoras,
pagam a mais valia de vossos orgulhos.

Vamos senhores e senhoras, esqueçam
o que dizem os letreiros do aeôn,
beijem as bocas podres da mentira,
ajoelhem-se diante de seus ídolos

(Eles são ofertados para a plebe
numa liquidação e parcelados em 24 x com juros).

Vão para a igreja rezar pelos seus pecados,
chupem o pau e os seios
de sua própria vergonha!
Depositem mísera angústia
na caixinha do altar...bebam a felicidade plástica,
doem o que já é velho, ineficiente e fora de moda.

Enquanto eu...

...lamento minha derrota no boteco da esquina.

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Senhores do Mundo

O Peso do Céu

 
Um dia as nuvens caíram,
o sol, triste, não mais reluziu,
quebraram-se ao bater na terra
e o sonho jamais se cumpriu.

Na busca pela cura de minha dor
também quis voar pelos ares,
mas sem asas me arrasto apático
em meus cegos e próprios males.

Tentando entender se errei,
vaguei pelo lado escuro da vida,
toquei minha guitarra com ódio
e lambi minhas próprias feridas.

Um dia as nuvens caíram
e a lua não mais me sorriu,
um frenesi rítmico ecoou
e o peso do céu me atingiu.

Na ânsia de conceber o universo
prostrei-me e roguei a chorar,
tropecei e sujei os meus versos
no ato insano e falso de amar.

Rio de janeiro, 27 de maio de 2003.
 
O Peso do Céu

Jardim da Solidão

 
Hoje vou colher a rosa do meu jardim,
tocar o espinho e ver de perto
o toque certo pra me ferir.

E pactuar tanto sofrer, tantas angústias,
para ouvir o quanto sofre a rosa triste,
do beija-flor que a penetrou com o seu beijo
e abandonou-a no jardim da solidão.

Depois eu vou tornar-me rosa em meu jardim.
Criar espinhos e ter ao certo
um ideal pra te ferir.

E vou chorar junto da rosa esquecida
que tem as pétalas e sonhos pelo chão.
As rosas ferem, mas também são mui feridas
são raptadas das roseiras por paixão.

São Gonçalo, 2005.
 
Jardim da Solidão

O Algoz Assassino de Sonhos

 
Em meu peito
existe um coração
que espeta,
como os espinhos
das rosas frescas
colhidas do jardim
da desilusão.

Em minha alma,
há um verso
de Piaf que reverbera:

"Balayés les amours
Et tous leurs tremolos
Balayés pour toujours
Je repars à zero ...".*

E diante disso,
pavorosa quimera
me abraça em pesadelos
no lençol amargo
da solidão.

Sensato e algoz
assassino de sonhos,
vulgar coveiro,
catalepsia,
lágrimas de sangue,
abstinência e vãs
orações proferidas.

Suor noturno,
inferno e céu,
anjos e demônios
sopram culpa
e penitência...
e penitente o poeta
segue dolorido
com o peito
estremecido
em caminhos dantes
já trilhados.

São Gonçalo, 23 de fevereiro de 2011.

(*) trecho de Non Je Ne Regrette Rien, interpretado por Edith Piaf.

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O Algoz Assassino de Sonhos

Parceiro da Solidão (Ode ao Velho Safado)

 
Parceiro da Solidão (Ode ao Velho Safado)
 
Parceiro da solidão?
Neste quarto apertado
Não me sinto só...

392 discos de vinil

223 CD’s

5 garrafas:
Run Montilla
Cachaça 51
Steinhäger
Licor Estância
Cachaça Magnífica

Alguns livros:
Bukowski
Rodrigo Santos
Rod Britto
Jack Keroauc
Antonio Tolissano

Revista Rolling Stone
Sobre a bancada onde bebo
E escrevo este poema

Meu velho violão

O meu colar Pataxó pendurado na janela

Na parede:
Iggy Pop se contorce
Michael Stype me rejeita
Jim Morrisson me abraça
E dois Wellington de Sousa me enlevam

Tenho o meu mundo de loucura
Minhas dimensões paralelas

Não tenho mulher
Não tenho cão e nem gato

Tenho a velha bailarina de porcelana
De minha mãe

Nick Cave sussurra em meu ouvido
Hoje não tem mensagem no celular
Tenho que fazer compras
Comprar carne e cerveja

Não tenho cartão de crédito
Nem crédito na praça
[a praça me odeia]

Fé eu tenho
Mas não na humanidade

Não tenho dinheiro
Nem carro para buscar companhia

Mas tenho a minha cara-de-pau
Para encarar o mundo do meu jeito.

São Gonçalo, 08 de outubro de 2009.

(bebendo cachaça com guaraná após ler "O Amor é Um Cão dos Diabos", de Charles Bukowski).
 
Parceiro da Solidão (Ode ao Velho Safado)

Espinhos II

 
Espinhos II
 
Há no meu peito espinhos,
e não sou flor, não sou rosa,
nem erva, nem nada!
Sou um poeta maldito,
um cão vira-latas que trôpego
ouve o chamado da estrada.

Talvez eu tenha culpa
de beijar a noite na boca
e escarrar na face fria do sol,
pois, já não há melodia
na música em que outrora
compus feliz no arrebol.

Frio e filho da madrugada
fria, entoo meus negros descompassos,
e sigo ferindo no meu caminho canhestro
a vida lúdica que eu mesmo desfaço.

Espinhos no peito, eu todo espinhos,
sou o ejaculador de desesperanças
da minha alma morta que
me vomita nessa mundo sozinho.

São Gonçalo, 24/08/09
 
Espinhos II

Suave é a Tarde

 
Suave é a tarde
que se despede com a brisa.
Pássaros, grilos saúdam
alvorada alvoraz
de meus sonhos despedaçados.
Suave toda carne cortada
e todo sangue derramado
no véu aveludado de poeira do asfalto.
Os sorrisos de terceiros,
os gritos das crianças,
os sons dos saltos
na calçadas partidas,
a buzinas ensurdecedoras
que violentam tímpanos,
o querer e o não querer,
a dúvida do ir e do vir,
a esperança enlatada e
exposta nas vitrines,
o urro e o silêncio momentâneo.
Ah, suave a inspiração
que ameniza suavemente
o viéis da desilusão.

Praça do Rink, Niterói, 03 de outubro de 2007.

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Suave é a Tarde

A Um Cão Vadio

 
A Um Cão Vadio
 
Te compreendo amigo.
Vagas a sós a mendigar
comida e carinho.
Os olhares se privam
de sua presença.
Já não lates a estranhos,
não corres atrás de pneus
ou te escondes de rojões.
Sobrevives solitário e apático
dentro de seu território demarcado.

Tu és magro, amigo,
de dar dó.
Seus pêlos brancos, empoeirados,
curtos e desgastados.
Focinho fino, olhos negros
e tristes
sem nenhuma consoloação...
És como a lua encoberta
pelas nuvens,
que já não te inspiras fé,
para saudá-la
com seu uivo.

Niterói (Praça de São Domingos), 28 de setembro de 2006.

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A Um Cão Vadio

A Uma Árvore Morta

 
Ergueu-se sobre o asfalto seco,
ao lado de um rio imundo,
com as copas crispadas
a ofenderem o céu.

A passarada a rejeita,
os insetos, dela, já não se nutrem.
Seu tronco áspero cinzento,
tal qual um cadáver embalsamado,
que resvala contra o tempo
atrai os olhares dos poetas
e afugenta a atenção dos passantes.
Ah, ardor que penetra minha alma,
tristeza que rasga e fere o coração.

Frígida, entorpecida, pétrea árvore,
ofereço de meu corpo sem emoção
o meu morno calor e minha alma torta
num abraço heróico, ó compadecida
escultura de natureza mórbida
erguida em riste, com devoção.
À triste e solitária árvore morta,
entrego-me com adoração.

Alcântara, 27 de janeiro de 2008 (Numa nublada tarde de domingo).
 
A Uma Árvore Morta

O Comedor de Moscas

 
O Comedor de Moscas
 
Ontem comi uma mosca.
Hoje porém, comi outra.
Por mais repugnante que seja tal rotina,
por mais que as moscas avarentas
venham zunir em meus ouvidos,
engulo-as com freqüência.

Aquela criaturinha mesquinha,
com sua índole audaz,
acaba por viciar-me.
Seu pus torna-se mel.
Mel que escapa pelos cantos da boca.
Por rejeição seria?

Como suas moscas!
Mas coma com muito orgulho.
Pois quem vê-lo comendo uma,
lhe oferecerá outra,
que ele mesmo tem em engolir!

img: "Chaise vide" de Marc Dubord.

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O Comedor de Moscas

A Maldição de Cronos

 
A Maldição de Cronos
 
Não comerás do pão o miolo que te alimenta
E nem beberás do vinho o fermentado que te embriaga,
Não olharás nos olhos a luxúria que te deseja
E nem sucumbirás ao prazer da carne que te enleva.

Caminharás com o peso de teu corpo
A ventilar ao leu os sonhos que não cumpriu
Levarás contigo, de um lado, o fardo da culpa
E do outro o da frustração.

Sentirás no peito o peso dos amores desfeitos
E te assombrarás com os amores que não viveu,
Olharás sempre ao chão onde pisa,
Pois não haverá mais horizonte para onde seguir.

Tragarás os teu erros como julgo
E as vitórias como uma perene lembrança
E te fadigarás com o porvir
Porque o porvir já bem conheces e aguardas.

Destino amargo e cruel te reservo, pobre homem,
Que tem o bastão da vaidade e da ambição
Como o deus que oras a cada dia que se passa
Para acordar na insanidade do pó ao que volverás.

São Gonçalo, 19 de junho de 2010.

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A Maldição de Cronos

Amar Como Amam os Poetas

 
Amar como amam os poetas...

É blasfemar contra a sensatez,
É acreditar amar e ser amado...
Poeta é ente maldito!
Indigno de sentimento tão puro,
É digno mesmo de vagar pelo mundo
Em eterna aflição e ser escarnecido
Por cada objeto de seus desejos.
É digno sim, de sentir inevitavelmente
Uma chama intensa queimar o peito.
É também sentir queimar em sua língua
Sacrílega, cada verso e promessa de eternidade...

Amar como amam os poetas...

Poetas não são dignos do amor,
São dignos de uma direção incerta,
De se olharem ridículos no espelho
E sorrindo e medindo os defeitos
Não saber a diferença do que é belo ou vil.

Amar como amam os poetas...

Poesia é fogo que corre no peito,
Como o fogo escaldante
Que invade o corpo e toma a alma
De paixão...

...Desejo...
...Incerteza...
...E medo.

Do livro Orações Licenciosas, de Romulo Narducci.

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Amar Como Amam os Poetas

Supernova

 
São nuvens que cobrem o céu,
são lágrimas que caem ao chão,
são corpos que se tocam, que gozam
e que se ferem profundamente
em suas almas vazias.
As
estrelas brilham
- mesmo se já não estiverem no seu local de origem -
e se propagam em ondas...
Supernova
e
tudo
se
re
nova.

Já não sei quem virá
em um novo amanhecer.
Mas eu sei que a noite
nunca é eterna e toda
escuridão tem seu fim.

São luzes ao horizonte,
e já tenho dúvidas
de que o universo é um só,
de que só amamos uma vez,
de que a morte é única,
(já que viramos matéria
e alimentamos a terra),
de que a dor é dor
para que possamos
nos deliciar com o seu alívio,
de que mundo tem jeito,
de que o céu não seja um
licor de anis e as nuvens
não sejam de açúcar.

Já não sei da lua, nem dos mistérios
de seu lado negro e oculto.
Dizem que São Jorge mora lá,
mas acho que ele não suportaria
a intensidade da Supernova.
 
Supernova

O Corredor, a Porta e o Crucifixo

 
Sujo de pecado, ponho de volta
o crucifixo em meu pescoço.
Eis o vértice descerebrado
de minhas condutas pseudo-maniqueístas.
Ouço passos na escada e batem à
minha porta. Mas há muito ela não se abre
e não digo boa noite ao estranho.
O corredor à noite, pouco iluminado,
é a minha alma entorpecida de
dúvidas e descasos.
As batidas se repetem, mais fortes do que antes.
Me incomodam e faz o meu sono ir embora.
Abro a porta que range e me atira
num futuro desconhecido. Do lado de fora
eu mesmo me cumprimento.

São Gonçalo, 03/08/2009
 
O Corredor, a Porta e o Crucifixo

 
Pó
 
Comendo o pó do tempo
da ampulheta quebrada
sobre o tapete de chegada,
esconde-se a angústia
nas rugas da desilusão
de não ter amado
o quanto deveria,
de não ter vivido
o quanto deveria,
de não ter sentido
o quanto deveria,
de não ter perdoado
o quanto deveria,
de não ter se apaixonado
o quanto deveria,
de não ter se arriscado
o quanto deveria,
de não ter clamado
o quanto deveria,
de não ter tido
a humanidade latente
em sua essência
ao menos uma vez.
Comendo o pó do tempo,
torna-se a própria areia
do esquecimento.

Imagem: A Face Oculta, de Beatriz Peixoto.http://beatrizpeixotoartes.blogspot.com
 
Pó

A Uma Mendiga

 
Surrada de sol,
faminta de lua,
à beira do abismo
sacia-se nua.

Seu corpo é tristeza,
saudade e medo,
desfez da beleza,
vendeu seus segredos.

Chorou ao relento,
quebrou seu espelho,
jogou-se ao vento
sem rumo, sem esteio.

Vadiou no inferno,
bebeu todo o céu,
morreu no inverno,
sem rumo, ao léu...

São Gonçalo, 29 de janeiro de 2008.

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A Uma Mendiga

Pálido Adeus (Ode a Kurt Cobain)

 
Pálido Adeus (Ode a Kurt Cobain)
 
Não chores mais por aquela canção.
Seu corpo jaz ao chão
mergulhado em sagrada náusea.
Seus olhos vermelhos,
o cheiro de cannabis em seus cabelos,
sua silhueta magra se contorce
em sexo seco sem libido.
Fazer por fazer,
morrer por morrer.
A dor é a mais perfeita amante
para os que sentem a alma.
O fio da navalha,
a seringa vazia,
o grito angustiante,
a ressaca de uma noite
sem sentido.
Os pulsos, os olhos, o medo,
o receio de ter que dormir cedo.
O dormir profundo,
o dormir eterno,
um estampido etéreo...

...o chão vermelho.

Niterói, 01 de março de 2003.
 
Pálido Adeus (Ode a Kurt Cobain)

Persona non Grata

 
Não tem jeito,
meu coração é porta aberta
para belos sorrisos sinceros.

O meu ódio do mundo
é carta marcada para escrever
mais e mais poesias.

Sou fadado a estar só,
mas nunca consigo
com esses ecos em minha mente.

Quero vomitar minhas angústias
num jardim florido,
mas sempre que bebo o suficiente
consigo voltar ileso para casa.

[mesmo que o caminho seja uma vã lembrança]

Não tem jeito,
não gosto de planos,
quero improvisar meu destino.

Quero ser como um gato na noite,
pardo entre tantos outros
ronronando atenção.

Sou como um copo vazio,
pronto a ser preenchido e
ser sorvido com avidez pelo mundo.

Não me importo de ser feio, velho,
de acreditar em falsas promessas,
o que eu quero é vomitar num jardim florido.

Não tem jeito
um dia eu ainda consigo
e estrago aquelas margaridas!

São Gonçalo, 07/10/09 – 08/10/09.
 
Persona non Grata

Vazio

 
Um homem sem amor
é como um grito sem voz,
um choro sem lágrimas,
um oceano sem vida,
um céu sem estrelas,
uma árvores seca e sem folhas
e uma colméia sem mel.

Um homem que não ama,
não ama a si mesmo.
Um homem que não se deixa amar,
nunca amará!
Um homem sem amor
não se iguala a uma pedra,
pois até as pedras não são ocas.

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Vazio

O Canto de Lilith

 
Sou do desejo a inspiração divina,
dos homens o paraíso e o inferno.
Não há castelos, presídios ou mosteiros
que eu não entre furtiva
e semeie o desejo pleno.

Penetro mentes em doces devaneios,
invado corpos em frenesis supremos.
O oriente conclamou-me religião,
o ocidente devotou-me maldições.

Inspirei Sade em seu clastro,
tentei Cristo e Sidarta.
Não há quem não resista ao meu abraço,
não há quem não sinta o fio da adaga,
e aos conjurosos movimentos de meus quadris
não se entregue ao meu beijo perdido.

Beije-me e terás a morte dos sentidos!

São Gonçalo, 2006.
 
O Canto de Lilith