Poemas, frases e mensagens de Transversal

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de Transversal

___ refazes o tempo

 
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Ceifando as águas que resistiram
à luz do vento
vi-te pela transparência das rosas
pensamentos em abalo continuado
cingindo alguns arrebatamentos
de dentro para fora
alvoroço constante fixo
como o ar deslocado das palavras.
abundância
perante esta insensatez que persegue e desentranha
cantos opostos
internos
eternos

transformas-te refazes o tempo
com outras cores
esse nó
que a garganta esconde

refulge na assimetria de mais um traço
de mais um dia
afinal habitas o espaço
e o desiquilíbrio que devora o nome.

o corpo
funde-se com o crepúsculo.

(Ricardo Pocinho – O Transversal)
… tempos entre o céu o inverno o inferno
 
___ refazes o tempo

[existe um abismo que lacera a carne]

 
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existe um abismo que lacera a carne
que o mar
o devorou

outros nada trouxeram de novo
apenas levaram alguns corpos
algumas praias lisas
distantes
sem areia

deslizando silêncios de novo
recuos engolindo negras quilhas
ilhas isoladas
imanências.

existe um luar que pousa em nossas mãos
dirás pássaro cansado
anel da noite
oceano em flor
deslumbrado

sacudindo a crina
o próprio ar
os doces azuis
acima das altas nuvens
enquanto
fechas teus olhos
nos meus
a pele na pele
[e porque não o arrepio?]

não sei das existências ao redor
nem das fagulhas dos cometas
esticadas
solenes
avançando de frente
destruindo ondas
num rouco gemido
onde vivem
memórias
passos
solidões.

I

deixo a eternidade das paisagens
magnéticas
brilhantes
esse cheiro das açucenas floridas
e que

setembro termine
se evada
instantâneo

a rota nunca será reta
indistinta
perdida.

[existem súplicas assim
descoloridas
ocasionais
sem um arco-íris por perto
também eu].

(Ricardo Pocinho)
 
[existe um abismo que lacera a carne]

[não te sei explicar porque resolvi parar]

 
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não te sei explicar porque resolvi parar
ou porque fechei repentinamente a porta da vaidade antes entreaberta

talvez o mar se tenha repetido
partido

o das procelas jamais
mas não é esse que perdura no final das sete ondas seguidas

ou as palavras que li deixaram de fazer sentido.

nunca é a hora certa eu sei
nem o recomeçar
muito menos o regresso ao cais que se desconhece
que se acusa e recusa no mesmo momento.

.esta é a liberdade da folha de papel que antes se apresentava em branco e que depois me deixa espraiar possessões marés cavalos alados ou simplesmente o voar titubeante e ziguezagueante das orquídeas que nascem tardias
é.

...

afinal tudo se completa
tudo ultrapassa o beijo flébil
a ausência
os areais que se arrumam pelos cantos dos horizontes
os equívocos.

Até já.

(Ricardo Pocinho)
 
[não te sei explicar porque resolvi parar]

e, habitas-me

 
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Habitas-me
com as malas, as viagens, esses livros rasgados,
apocalipses teus, nossos, revelações em nevoeiros
que teimam em ficar,
como se só o tocar não fosse além de um nenhures uma vez imaginado,

única vez.

E, desarrumas-me,

não saberei escrever da coragem, da solidão,
das noites que se perdem, das que se bastam
quais andorinhas em voos rasantes,
tantas as palavras escondidas procurando significados ou imagens refletidas,

silêncios acompanhados.

E, toca-me a alvorada esquecida,

desassombra-me colando os pedaços,
estilhaços espalhados pelo chão de madeira,
um dia em árvore, um dia em barco
vogando conforme a direção dos ventos de norte em procelas sem fim.

E, desço,

pelas margens do mar , os mesmos lugares
que se repetem, as mesmas noites que ficam
paradas ansiosas, expectantes,

querendo que a luz não se extinga mesmo sabendo-me aprisionado.

Habitas-me,
e, desarrumas-me,

por uma última vez, única, revelo-me.

(Ricardo Pocinho)
 
e, habitas-me

[só existe um mar o dos teus olhos à deriva pelo cais]

 
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; só existe um mar o dos teus olhos à deriva pelo cais
e caem as pétalas pelo outono dos homens

excedendo o ato da noite tão intensa
destecida vezes sem conta
pela respiração
pelo suor liso e brilhante.

Os deuses invadem-nos pelas procelas de marés altas

onde até os gritos de pavor próximos das ondas gigantes
adamastores

são pequenos murmúrios suspirados
. atravessas as filas de navios ancorados
baloiçando como puros sangue

hão-de pousar as aves e os poemas tão próximos
num primeiro dia conhecido
que se une à nossas praias desertas
eternas
sem sombra por perto

pudesse o instante ficar suspenso invocando ausências ou ondas do mar dançando sem música.

Extinguiram-se memórias ainda frescas vivas
pelo sítio das ilhas iluminadas
pelo sítio das mimosas

navegações indistintas aprumadas pela proa
o céu exausto nada de novo nos trás
nem as nuvens lisas um dia colhidas

refúgios dirás.

As paredes feitas promontórios
palavra a palavra
criam fronteiras ao relento
e voos inclinados

abraça-me a sul de ti
sejas tu apenas
apenas tu em mim
sim.
I

. e ninguém chegou
tantos que partiram pelo alvor deixando ruínas
cada vez mais imponentes

presentes

foi este o arco-íris em silêncio meu.

(Ricardo Pocinho)
 
[só existe um mar o dos teus olhos à deriva pelo cais]

___________ pelo torvo de pesadelos

 
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sobrevivem pelos cantos
desta forma de despedida o cordão umbilical
e um corpo que esmaga

passo a passo
o sono e os sonhos interrompidos.

magnólia etérea perfumada
escondida
pelo arrabalde
onde se sepultam tédios
e desencontros
ou outros
sentados sós
pelo torvo de pesadelos
continuados.
longe do concêntrico solar
resplandece e aquiesce a palavra pura

única
na latescente neblina que se evapora
sem tropeços.

vida
céu
para além do mar.

(Ricardo Pocinho – O Transversal)
… tempos entre o céu o inverno o inferno
 
___________ pelo torvo de pesadelos

e tem vezes que não sei do mar

 
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...
por onde caminham os teus passos,
após um breve orgasmo tombado em silêncio absoluto?

Anárquicas as pegadas deixadas nos reflexos avivados do luar escondido por cirros cinzentos, amálgamas dispersas,

sem nexo,
temperadas pelo extenso e pálido olhar,

ou pelo odor intenso da maresia encabrestada
nos coros repetidos dos cascos de algum puro sangue árabe, louco,

e tem vezes que não sei do mar,
nem das alfazemas que brotam pelas margens escuras,
neste esquecimento forçado dos nomes que desfiguram as coisas.

Recorda-me dos pássaros que morreram a voar,
porventura em agonia,
enquanto beijava repetidamente teu corpo indefeso
escondendo as visões e as vozes que pululavam sem parar,
dos navegares outrora desconhecidos,
...
evaporavas-te pelo fumo do primeiro cigarro,
borda fora, mar afora,
entre o espesso nevoeiro perto das escarpas que se escondiam pelas passagens do vento soprado por adamastores ubíquos.

Por onde te caminhas se os luzeiros se apagaram de vez?
O barco crepita ancorado,
abatido pelo relâmpago que se atrasou.

Atrasei-me.

(Ricardo Pocinho)
 
e tem vezes que não sei do mar

[consome-me enquanto crepita a acha de carvalho sem nós]

 
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consome-me enquanto crepita a acha de carvalho sem nós

dize-lhe a terra que se ouve a mar em outubro
dos centros apagados construindo casas em volta
[porque não ao redor?]
caos

quilhas perfeitas escondidas pelo areal
aves
barcos submersos

despidas do branco das praias a sul.

Transporta-me além deste tempo
não meu
um mundo despojo
catadupas simples sem graças
quiçá as garças pela margem bombordo
observando maré
esperando esgravatando
passos ao largo sem interesse

que me interessam os sons por perto ou os cavalos alados a espaços[?]
sabes bem que são abismos
destapando frios

. entrego-te a visão perdida um dia
pela manhã já tardia
assim são os náufragos [de si próprios também]

agarrados aos grandes troncos de madeira boiando sem rota
mal sofridos vivem

I

faze-me a hora desconstruindo-a após
muros
passos
tatuagens

após as cores que dispersas sem jeito
plenas

quisera eu hoje ser o teu tu
deixando de ver pessoas colhendo as últimas cerejas esvoaçando às cegas
titubeando sós

[sim
nós].

(Ricardo Pocinho)
 
[consome-me enquanto crepita a acha de carvalho sem nós]

[exponho-te a vontade possa eu ouvir-te]

 
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exponho-te a vontade possa eu ouvir-te
as estradas não têm portas de entrada

e as saídas são inclinadas
em aparentes desusos

os mares têm recantos
onde as areias são brancas formando castelos alagados
quiçá caminhos rotas
muros mundos

que se espalham pelo respirar repentino
de nevoeiros a estibordo.

Projetam-se sombras
depois as escuridões ponteadas de luzeiros
aqui

ali

nada trazendo de novo

apenas pulsações
e a inamovível ondulação.

Sabes da luz cor de amora
as mãos trémulas
a breve brisa da maré vazante

abrirás então o teu silêncio das luas e das flores marinhas
[pressentimento meu]

enquanto o olhar se fixa.

I

Pudesse eu tornar a noite habitada
[cessando todos os seus ruídos].

(Ricardo Pocinho)
 
[exponho-te a vontade possa eu ouvir-te]

••• (III)

 
Poemas sem título e nas tuas mãos respiram oceanos e mares singrando velas soltas pelo entardecer que se insinua noite
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... deambulam alguns burburinhos sem ímpeto
[poisos inventados agora pela métrica de um verso livre] olvidado

nesse tempo estranho da repetição em volutas das ondas
sete vezes que a maré alta cresce pela enchente. Sento-me

esperando os teus gestos brandos
porque a beleza das coisas sempre foi tua
mesmo a que habita os cantos que se querem em azul ou noutra cor qualquer

talvez um último beijo
por um último abraço enquanto se repetem os nomes e os enormes arcos
do céu em flor. Jamais saberei desta nostalgia que me mantem
vivo [sim]
colhendo algumas algas e ouvindo o mar que se refugia dentro dos búzios
espalhados a deambular pelo areal.

Retenho o instante deslumbrado
levanto os braços ainda mais alto
ainda mais longe tocando o vento que atravessa esta primavera
querendo agarrar algum cometa tardio perdido na imensidão. Nuas

se banham entre espelhos e estas distâncias
[que tão bem conheces] as ditas musas dos poetas

embora sobreviva a praia lisa e virgem
recôndita e tímida
abalos que resistem e um arco-íris pleno tão por perto
que quase

o consigo tocar.

Profundidades.

(Ricardo Pocinho)
 
••• (III)

Ausências impessoais tal o voar irrequieto das andorinhas pelas tardes de primavera

 
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Nomeias esquecimentos daqueles dias não distantes onde a claridade sangrava
Onde os passos se arrastavam e os corpos desejavam descansos retendo o brilho do desejo
Num Manto de água em queda.

Falas-me então do tempo marinho das Fugas
Sempre iguais

Buscas sempre constantes que me habitam e consomem

Afinal o que será o paraíso?
Onde termina este caos (o meu ou o teu)?

Ausências impessoais tal o voar irrequieto das andorinhas pelas tardes de primavera
Faz-se então tarde
As velas sopradas a norte apontam o destino dos navegantes.

I

E falo-te uma vez mais no destino
Fado que me destrói
Consome
Reconstrói

Sempre
Mais um pedaço.

Cegam os olhos os reflexos do além-mar.

(Ricardo Pocinho)
 
Ausências impessoais tal o voar irrequieto das andorinhas pelas tardes de primavera

Enquanto teu corpo se esconde tímido debaixo Do linho níveo que se desfez pela noite em dia

 
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Não te sei falar do sabor a mar da pele adormecida pelas espumas das ondas revoltas talvez sejam crinas de cavalos alados sopradas por ventos alísios ofegantes
Nem te saberei um dia explicar da companhia das aves nas direções longínquas do equinócio aflito sem distâncias morrendo em pleno voo (serão enterradas veladas nas nuvens quando todos os aviões pousarem em Terra?)
Não sei.

Sabê-lo-ei um dia ou noite quando o cheiro
Das orquídeas invadir o quarto vazio
Que me habita (que nos habita)
Resistindo aos ecos que as sombras cantam em silêncio
Talvez então seja escusado dir-me-ás por entre os brilhos
Purpúreos que o olhar absorveu.

Fumos incessantes deste incenso purificador ou Apaziguador
Enquanto teu corpo se esconde tímido debaixo
Do linho níveo que se desfez pela noite em dia

Nem sempre serão precisas palavras ou gestos
Sobrevivos a um tempo demasiado rápido enquanto
A voz declama um poema apressado símile à canção
Refreando os passos aprisionados
Antes ou depois aos mesmos caminhos.

Nem sempre se percebem as estrelas cadentes
Caindo no mar

Por vezes iluminam o horizonte
Transformando-o em chamas
Outras são leves tremores que anunciam
As manhãs infinitas.

I
Dessas palavras que rasgam poesia Desaparecem incólumes
Visões Sonhadores Navegadores
Das viagens que encontraram sargaços Cegam os olhos nos reflexos do mar
Esqueçam-se as memórias Esqueçam-se os naufrágios Esquecem-se as feridas
Das tatuagens escritas na pele por aquelas noites que em Dias se transformavam,
Revocavam-se alguns apelos gritos adormecidos sabiam-se infinitos.

Pede-se o cantar da cotovia
Que antecede primaveras e o mito do mar

O teu peito.

(Ricardo Pocinho)
 
Enquanto teu corpo se esconde tímido debaixo Do linho níveo que se desfez pela noite em dia

[untam-se as trajetórias de madressilvas

 
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untam-se as trajetórias de madressilvas

vicissitudes
atormentando voos perfeitos
dessas coisas vazias.

Falo-te na antecâmara
de um qualquer cinzento
atemporal
enlouquecido
enlouquecendo confortos
tantas vezes pronunciados silêncios

então

correm por entre as minhas mãos fechadas
ventos
redemoinhos abstratos
sem destino.

Querer-me-ia subitâneo tênue
quiçá primeiro orgasmo ante o entreabrir
da porta que rasga para sempre a memória.

Passos carregam mar
ressoando símiles ao risco desordenado
(ou incompleto do que me interessa)

que se liberta
digo-te do mito adornando
a calmaria resistente
oferece-me ao amanhecer Imensidões.

I

Oferece-me
a cor da alma incandescente
os azuis adormecidos
alguns cinzas desbotados de um vão de escada.

[e deixa que me refugie
pelos cantos do mar como o pássaro que descansa em pleno voo].

(Ricardo Pocinho)
 
[untam-se as trajetórias de madressilvas

[se me falares do beijo ensina-me a quente possessão dos amantes]

 
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se me falares do beijo ensina-me a quente possessão dos amantes
o desfado repetido pelas vielas desertas
e deixa que me perca pelos mantos da água cristalina.

Meus ombros tombam pelo peso do tempo
sem brilhos ou cometas por perto
sem a navegação pela costa desses silêncios
desesperantes que os céus aprisionaram
algures de mim
algures de ti

além

habitas meu corpo nu que a salmoura gretou
tatuando estranhas rotas cobertas de cinzas
e lavas incandescentes

o Mar

e se âncoras abrem sulcos profundos onde antes apenas coexistiam areais e sal

pudesse eu rever mais uma vez
o brilho da praia nua por uma lua cheia de Graça.

I

Alumbras-te assim pela luz repentina do intenso tremular
luar
que me prostra sempre exangue.

Encerras-te então em ti

[pudesse eu reencontrar-te em mim agora meu amor].

(Ricardo Pocinho)
 
[se me falares do beijo ensina-me a quente possessão dos amantes]

[ … e tantas são as vezes

 
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e tantas são as vezes que desejo abandonar este corpo
que me cerceia da liberdade,
que me aprisiona como o mar aprisiona ilhas,

e resisto-ne nesta
pele que se encarquilha quando o sol derrete a salmoura,
e resistem os
ossos que se desfazem em pó que outros calcam,

pudesse eu ser só, sonho,
pudesse eu ser só, pensamento,

pudesse eu
adejar como as aves ao amanhecer,
sossegando quando o crepúsculo persistisse
em esconder a claridade,

pudesse eu
acompanhar a dança das baleias em silêncio
pelas fossas mais escuras.

Das vezes que só ouço as estrelas
quando mar afora me vogo,
arribam-me os ventos que sopram de proa.

Tantas são as vezes que me afasto de ti,
quando é de mim que me quero esquecer,

[morro-me assim, lentamente].

Conseguisse eu, ler-me.

experimental, palavras rabiscadas numa Moleskine com prazo de validade.

Cercear (figurado)- restringir, coarctar
Arribar (figurado)- escapar de uma doença e ir retomando forças

ouvir estrelas...
Há que considere “Via Láctea” de Olavo Bilac como o poema mais belo escrito em português. Não sei se será ou não o mais belo, sei que é de uma das obras primas da Poesia.

XIII

"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir o sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizes, quando não estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas".

Olavo Bilac “Via Láctea”


[“do ciclo, as palavras não têm prazo de validade. “ Riva la filotea. La riva? Sa cal'è c'la riva?” (Está a chegar. A chegar? O que estará a chegar?)]
 
[ … e tantas são as vezes

[ … e debruço-me sobre o teu corpo

 
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e debruço-me sobre o teu corpo.

Que me interessam as cerejas que ficaram
se o poeta que teve direito ao suicídio

jaz num campo de orquídeas brancas, as mais puras,

se eu me suicidar dentro de mim abre as janelas,
deixa entrar o cheiro da maresia
que se entranha como o cheiro da terra
quando as primeiras chuvas lhe tocam.

Já não sou dono deste meu eu agora,
desconheço o poema como epitáfio, a pedra angular que me sustém,

sei dos ventos, das marés, das estrelas,
sei que, quando me ancoro a teu lado
expiro-me em teus braços.

Que me interessam as cerejas que ficaram,
que me interessam as cores do arco-íris em chamas,
que me interessa se o poeta tem direito ao suicídio, que jaza,

sei, neste momento, agora,
enquanto me debruço sobre o teu corpo,

que as ondas de todos os mares, dançam em mim.



experimental, palavras rabiscadas numa Moleskine com prazo de validade.

debruçar – inclinar
expirar – dúvida entre o significado morrer e definhar, fica a dúvida, que sejam os dois significados

“Como ondas do mar dançam em mim os pés do teu regresso”
(Sophia de Mello Breyner Andresen, Junho 1974)


[“do ciclo, as palavras não têm prazo de validade. “ Riva la filotea. La riva? Sa cal'è c'la riva?” (Está a chegar. A chegar? O que estará a chegar?)]
 
[ … e debruço-me sobre o teu corpo

[Esqueço-me dos dias, restam noites abandonadas]

 
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Esqueço-me dos dias, restam noites abandonadas,

silêncios alguns,
sombras que voam em frenesim,
quando encontro a minha, apiedo-me sem razão.

Tempos estranhos, delírios
intermináveis,
de nada valeram sonhos, encontros, fugas,

resisto-me.

Descalça te imagino, cousas minhas,
cabelos desfraldados ao vento que vem de norte
tapam o sorriso que sempre sobreviveu em
esconderijos meus,
que sejam secretos qual o invísivel rorejar disperso pelos nossos regaços numa manhã cendrada.

Assim a noite pariu arco-íris, afirmo-te.
Assim a noite escondeu os silêncios das sombras.

Assim se libertou o perfume do rosmaninho que cobre
as falésias por segar.

segar – ceifar, cortar

“Quase lua cheia e baixa sobre o mar
Magnética e brilhante nos panos negros da noite
Foi então que abordámos em margens de silêncio”

(“Termoli” Sophia de Mello Andresen)

“- Na verdade vos digo, os pássaros que morrem caem no céu e as cinzas de Maria Callas vogam pelo mar Egeu.” do ciclo uma sílfide adormeceu no leito de uma orquídea branca.
 
[Esqueço-me dos dias, restam noites abandonadas]

• • •

 
Poemas sem título ou a breve mão que sangra desinteressada pela noite que a vinha fechar.
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desconstruo-me por esta noite que se fecha
enquanto longe divagas o teu olhar. Os ruídos
sossegam assimétricos ásperos por vezes
assim me amanheço quando os dias abrem janelas portas.

Quer-se algum equilíbrio nestas imagens exímias
enxames rodeando o respirar cego
o vogar no instante extremo desentranhado sem apelo ou agravo

rápido
conciso
vida nos limites do absurdo desenrolando braços e abraços
intermináveis e esquecidos
desnecessários
[como a pele reage]. Sussurram algumas fugas

desentranhadas
áscuas sem limites ao relento
remoinhos de vento norte assombrosos
indomáveis tentando reconstruir os despojos desta implosão breve
certeira
furiosa.

Destecem-se os casulos ao derredor
destecem-me

simplesmente.

(Ricardo Pocinho)
 
• • •

[ … por vezes não sinto o que sinto

 
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por vezes não sinto o que sinto,
tento esquecer-me.
Esperguiço-me num mar chão, ondula-se o corpo
que voga pela mansa maré,

como se para sentir tivesse de saber, ser,
ser-me-ei apenas, tão longe tantas as vezes de mim,
ser-te-às assim, tão perto tantas as vezes foste de mim.

Quando o nosso sangue estremecia,
e o grito trespassava as paredes amarelecidas pelo sol de verão,
um corpo único metamorfoseado
renascia da promessa, da saudade,
das despedidas que sangravam pelo outono,

[… verão mar, outono terra …]

Que eu me esqueça da poesia que nos cobria,
que eu me esqueça de sentir o que sentia então,
que seja profecia também,

mas,

que no final da rota inversa que seguimos,
as mãos se voltem a tocar, sem tempo,

[… mar terra …].

experimental, palavras rabiscadas numa Moleskine com prazo de validade.

Sinto o que sinto...

“Breve Sonata em Sol [UM (Menor, Claro)”

“A solidão da árvore sozinha 
no campo do verão alentejano 
é só mais solitária do que a minha 
e teima ali na terra todo o ano 
quando nem chuva ou vento já lhe fazem companhia 
e o calor é tão triste como o é somente a alegria 
Eu passo e passo muito mais que o próprio dia.”
(Ruy Belo)

no dia da morte de José Hermano Saraiva, meu professor no Liceu Gil Vicente, Lisboa. “foi exctamente aqui que...”
 
[ … por vezes não sinto o que sinto

____________ sem o remorso de todos nós

 
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Quer-se o corpo a caminho do mar
em quase saudade

paciente
descoberto

devorando a paisagem sem o remorso de todos nós.

aqui diante de mim

ou do meu contrário
dançam sonhos insônias.

era noite
o redemoinho

o sopro da memória

esculpiam nas paredes
infinitos parciais
um e outro abraço
a porta

mantinha-se entreaberta
em descompasso.

(Ricardo Pocinho - O Transversal)
... tempos entre o céu o inverno o inferno
 
____________ sem o remorso de todos nós

"Floriram por engano as rosas bravas
No inverno:veio o vento desfolha las..."
(Camilo Pessanha)

http://ricardopocinho.blogspot.com/
ricardopocinho@hotmail.com