Ausências impessoais tal o voar irrequieto das andorinhas pelas tardes de primavera
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Nomeias esquecimentos daqueles dias não distantes onde a claridade sangrava
Onde os passos se arrastavam e os corpos desejavam descansos retendo o brilho do desejo
Num Manto de água em queda.
Falas-me então do tempo marinho das Fugas
Sempre iguais
Buscas sempre constantes que me habitam e consomem
Afinal o que será o paraíso?
Onde termina este caos (o meu ou o teu)?
Ausências impessoais tal o voar irrequieto das andorinhas pelas tardes de primavera
Faz-se então tarde
As velas sopradas a norte apontam o destino dos navegantes.
I
E falo-te uma vez mais no destino
Fado que me destrói
Consome
Reconstrói
Sempre
Mais um pedaço.
Cegam os olhos os reflexos do além-mar.
(Ricardo Pocinho)
Enquanto teu corpo se esconde tímido debaixo Do linho níveo que se desfez pela noite em dia
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Não te sei falar do sabor a mar da pele adormecida pelas espumas das ondas revoltas talvez sejam crinas de cavalos alados sopradas por ventos alísios ofegantes
Nem te saberei um dia explicar da companhia das aves nas direções longínquas do equinócio aflito sem distâncias morrendo em pleno voo (serão enterradas veladas nas nuvens quando todos os aviões pousarem em Terra?)
Não sei.
Sabê-lo-ei um dia ou noite quando o cheiro
Das orquídeas invadir o quarto vazio
Que me habita (que nos habita)
Resistindo aos ecos que as sombras cantam em silêncio
Talvez então seja escusado dir-me-ás por entre os brilhos
Purpúreos que o olhar absorveu.
Fumos incessantes deste incenso purificador ou Apaziguador
Enquanto teu corpo se esconde tímido debaixo
Do linho níveo que se desfez pela noite em dia
Nem sempre serão precisas palavras ou gestos
Sobrevivos a um tempo demasiado rápido enquanto
A voz declama um poema apressado símile à canção
Refreando os passos aprisionados
Antes ou depois aos mesmos caminhos.
Nem sempre se percebem as estrelas cadentes
Caindo no mar
Por vezes iluminam o horizonte
Transformando-o em chamas
Outras são leves tremores que anunciam
As manhãs infinitas.
I
Dessas palavras que rasgam poesia Desaparecem incólumes
Visões Sonhadores Navegadores
Das viagens que encontraram sargaços Cegam os olhos nos reflexos do mar
Esqueçam-se as memórias Esqueçam-se os naufrágios Esquecem-se as feridas
Das tatuagens escritas na pele por aquelas noites que em Dias se transformavam,
Revocavam-se alguns apelos gritos adormecidos sabiam-se infinitos.
…
Pede-se o cantar da cotovia
Que antecede primaveras e o mito do mar
O teu peito.
(Ricardo Pocinho)
[untam-se as trajetórias de madressilvas
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untam-se as trajetórias de madressilvas
vicissitudes
atormentando voos perfeitos
dessas coisas vazias.
Falo-te na antecâmara
de um qualquer cinzento
atemporal
enlouquecido
enlouquecendo confortos
tantas vezes pronunciados silêncios
então
correm por entre as minhas mãos fechadas
ventos
redemoinhos abstratos
sem destino.
Querer-me-ia subitâneo tênue
quiçá primeiro orgasmo ante o entreabrir
da porta que rasga para sempre a memória.
Passos carregam mar
ressoando símiles ao risco desordenado
(ou incompleto do que me interessa)
que se liberta
digo-te do mito adornando
a calmaria resistente
oferece-me ao amanhecer Imensidões.
I
Oferece-me
a cor da alma incandescente
os azuis adormecidos
alguns cinzas desbotados de um vão de escada.
[e deixa que me refugie
pelos cantos do mar como o pássaro que descansa em pleno voo].
(Ricardo Pocinho)
[se me falares do beijo ensina-me a quente possessão dos amantes]
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se me falares do beijo ensina-me a quente possessão dos amantes
o desfado repetido pelas vielas desertas
e deixa que me perca pelos mantos da água cristalina.
Meus ombros tombam pelo peso do tempo
sem brilhos ou cometas por perto
sem a navegação pela costa desses silêncios
desesperantes que os céus aprisionaram
algures de mim
algures de ti
além
habitas meu corpo nu que a salmoura gretou
tatuando estranhas rotas cobertas de cinzas
e lavas incandescentes
o Mar
e se âncoras abrem sulcos profundos onde antes apenas coexistiam areais e sal
pudesse eu rever mais uma vez
o brilho da praia nua por uma lua cheia de Graça.
I
Alumbras-te assim pela luz repentina do intenso tremular
luar
que me prostra sempre exangue.
Encerras-te então em ti
[pudesse eu reencontrar-te em mim agora meu amor].
(Ricardo Pocinho)
[ … e tantas são as vezes
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…
e tantas são as vezes que desejo abandonar este corpo
que me cerceia da liberdade,
que me aprisiona como o mar aprisiona ilhas,
e resisto-ne nesta
pele que se encarquilha quando o sol derrete a salmoura,
e resistem os
ossos que se desfazem em pó que outros calcam,
pudesse eu ser só, sonho,
pudesse eu ser só, pensamento,
pudesse eu
adejar como as aves ao amanhecer,
sossegando quando o crepúsculo persistisse
em esconder a claridade,
pudesse eu
acompanhar a dança das baleias em silêncio
pelas fossas mais escuras.
Das vezes que só ouço as estrelas
quando mar afora me vogo,
arribam-me os ventos que sopram de proa.
Tantas são as vezes que me afasto de ti,
quando é de mim que me quero esquecer,
[morro-me assim, lentamente].
Conseguisse eu, ler-me.
experimental, palavras rabiscadas numa Moleskine com prazo de validade.
Cercear (figurado)- restringir, coarctar
Arribar (figurado)- escapar de uma doença e ir retomando forças
ouvir estrelas...
Há que considere “Via Láctea” de Olavo Bilac como o poema mais belo escrito em português. Não sei se será ou não o mais belo, sei que é de uma das obras primas da Poesia.
XIII
"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir o sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizes, quando não estão contigo?"
E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas".
Olavo Bilac “Via Láctea”
…
[“do ciclo, as palavras não têm prazo de validade. “ Riva la filotea. La riva? Sa cal'è c'la riva?” (Está a chegar. A chegar? O que estará a chegar?)]
[ … e debruço-me sobre o teu corpo
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e debruço-me sobre o teu corpo.
Que me interessam as cerejas que ficaram
se o poeta que teve direito ao suicídio
jaz num campo de orquídeas brancas, as mais puras,
se eu me suicidar dentro de mim abre as janelas,
deixa entrar o cheiro da maresia
que se entranha como o cheiro da terra
quando as primeiras chuvas lhe tocam.
Já não sou dono deste meu eu agora,
desconheço o poema como epitáfio, a pedra angular que me sustém,
sei dos ventos, das marés, das estrelas,
sei que, quando me ancoro a teu lado
expiro-me em teus braços.
Que me interessam as cerejas que ficaram,
que me interessam as cores do arco-íris em chamas,
que me interessa se o poeta tem direito ao suicídio, que jaza,
sei, neste momento, agora,
enquanto me debruço sobre o teu corpo,
que as ondas de todos os mares, dançam em mim.
…
experimental, palavras rabiscadas numa Moleskine com prazo de validade.
debruçar – inclinar
expirar – dúvida entre o significado morrer e definhar, fica a dúvida, que sejam os dois significados
“Como ondas do mar dançam em mim os pés do teu regresso”
(Sophia de Mello Breyner Andresen, Junho 1974)
…
[“do ciclo, as palavras não têm prazo de validade. “ Riva la filotea. La riva? Sa cal'è c'la riva?” (Está a chegar. A chegar? O que estará a chegar?)]
[Esqueço-me dos dias, restam noites abandonadas]
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Esqueço-me dos dias, restam noites abandonadas,
silêncios alguns,
sombras que voam em frenesim,
quando encontro a minha, apiedo-me sem razão.
Tempos estranhos, delírios
intermináveis,
de nada valeram sonhos, encontros, fugas,
resisto-me.
Descalça te imagino, cousas minhas,
cabelos desfraldados ao vento que vem de norte
tapam o sorriso que sempre sobreviveu em
esconderijos meus,
que sejam secretos qual o invísivel rorejar disperso pelos nossos regaços numa manhã cendrada.
Assim a noite pariu arco-íris, afirmo-te.
Assim a noite escondeu os silêncios das sombras.
Assim se libertou o perfume do rosmaninho que cobre
as falésias por segar.
segar – ceifar, cortar
“Quase lua cheia e baixa sobre o mar
Magnética e brilhante nos panos negros da noite
Foi então que abordámos em margens de silêncio”
…
(“Termoli” Sophia de Mello Andresen)
“- Na verdade vos digo, os pássaros que morrem caem no céu e as cinzas de Maria Callas vogam pelo mar Egeu.” do ciclo uma sílfide adormeceu no leito de uma orquídea branca.
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Poemas sem título ou a breve mão que sangra desinteressada pela noite que a vinha fechar.
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desconstruo-me por esta noite que se fecha
enquanto longe divagas o teu olhar. Os ruídos
sossegam assimétricos ásperos por vezes
assim me amanheço quando os dias abrem janelas portas.
Quer-se algum equilíbrio nestas imagens exímias
enxames rodeando o respirar cego
o vogar no instante extremo desentranhado sem apelo ou agravo
rápido
conciso
vida nos limites do absurdo desenrolando braços e abraços
intermináveis e esquecidos
desnecessários
[como a pele reage]. Sussurram algumas fugas
desentranhadas
áscuas sem limites ao relento
remoinhos de vento norte assombrosos
indomáveis tentando reconstruir os despojos desta implosão breve
certeira
furiosa.
Destecem-se os casulos ao derredor
destecem-me
simplesmente.
(Ricardo Pocinho)
[ … por vezes não sinto o que sinto
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por vezes não sinto o que sinto,
tento esquecer-me.
Esperguiço-me num mar chão, ondula-se o corpo
que voga pela mansa maré,
como se para sentir tivesse de saber, ser,
ser-me-ei apenas, tão longe tantas as vezes de mim,
ser-te-às assim, tão perto tantas as vezes foste de mim.
Quando o nosso sangue estremecia,
e o grito trespassava as paredes amarelecidas pelo sol de verão,
um corpo único metamorfoseado
renascia da promessa, da saudade,
das despedidas que sangravam pelo outono,
[… verão mar, outono terra …]
Que eu me esqueça da poesia que nos cobria,
que eu me esqueça de sentir o que sentia então,
que seja profecia também,
mas,
que no final da rota inversa que seguimos,
as mãos se voltem a tocar, sem tempo,
[… mar terra …].
experimental, palavras rabiscadas numa Moleskine com prazo de validade.
Sinto o que sinto...
“Breve Sonata em Sol [UM (Menor, Claro)”
“A solidão da árvore sozinha
no campo do verão alentejano
é só mais solitária do que a minha
e teima ali na terra todo o ano
quando nem chuva ou vento já lhe fazem companhia
e o calor é tão triste como o é somente a alegria
Eu passo e passo muito mais que o próprio dia.”
(Ruy Belo)
no dia da morte de José Hermano Saraiva, meu professor no Liceu Gil Vicente, Lisboa. “foi exctamente aqui que...”
____________ sem o remorso de todos nós
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Quer-se o corpo a caminho do mar
em quase saudade
paciente
descoberto
devorando a paisagem sem o remorso de todos nós.
aqui diante de mim
ou do meu contrário
dançam sonhos insônias.
era noite
o redemoinho
o sopro da memória
esculpiam nas paredes
infinitos parciais
um e outro abraço
a porta
mantinha-se entreaberta
em descompasso.
(Ricardo Pocinho - O Transversal)
... tempos entre o céu o inverno o inferno