Ciúmes
qual teu sorriso...
inflorescência
na ponta duma haste,
perfumada flor.
como se o amor,
a vida, a morte...
'naturalidades'
penso numa haste;
nela o regozijo
de te ter em mim,
em flor, mas isento
de qualquer dor,
até de amor...
Pendentif
fora a minha vida,
fora o meu tempo,
fora minhas palavras,
fora o meu amor;
não tenho riquezas.
como único tesouro
basta-me uma jóia,
tu; com teus braços
entrelaçados justos,
qual um cordão
em volta do pescoço.
‘sendo o camafeu vivo
pendente no meu peito’
Desnudo
tomo sua poesia em goles curtos
saboreio-a palavra por palavra.
exaurido que estou; alimenta-me,
reconforta-me saber-te amar-me
ah relembrar das tantas desilusões
percorrida de castiçais, corredores...
por que não vos encontrei antes
que fosse luz em imagens murais
repintada nos meus raros sonhos.
infindos são meus pensares em ti
obsta o desejo, no tempo que urge
nesses encontros e desencontros
movimento quais astros diuturnos,
desumanamente impondo, sidéreo.
enquanto isso, meus versos revoam,
e meu coração ainda que túrgido,
lamenta não te ter aqui em mim
em verdade, num estar corpóreo
e não diluída em perfume poesia.
nesse sentir que nada espera.
...e tão somente meu sentir...
o meu amor. desnudo.
ANÔNIMA
Não me chamava tanta atenção aqueles grandes olhos acastanhados, emoldurados entre os longos cílios postiços.
Tampouco sua pequena boca ornada com lábios carnudos a sobressair no rosto largo e moreno de sol.
Os longos cabelos negros caídos sobre os seios maçãs, escondiam parcialmente os delicados mamilos debaixo da blusa de voil; túmidos pela aragem fresca soprada à beira mar.
Via-se nitidamente seu ventre se contrair ao menor toque dos dedos delgados, unhas alongadas e esmaltadas escandalosamente, sinalizando para baixo da minissaia, que abrigava seu fruto raro de possuir, mas disponível para quem dispusesse pagar caro.
Décimo terceiro chopp, na tarde caída e eu sem pressa nenhuma de sair dali.
Na esquina, ela era a única a desfilar à passos curtos vitrinando o belo par de coxas, pernas andarilhas, naturalmente rijas, guardiãs imponentes do seu ponto.
Bebi o último chopp, paguei a despesa, e me encaminhei para o cafofo que quisera um dia alugar para ela...
Já de manhã, cada gole de café acentuava o amargor da boca.
Com facilidade, comecei a lembrar-me do sonho bom cena por cena, ou pesadelo; resquício duma tarde etílica.
Raquel
como teu olhar cativa...
ensaias um mirar de soslaio
que atrai e impressiona.
é de deixar qualquer um assim;
completamente perdido
nestes grandes olhos de mel
inquietos, com sabor de desejo...
tantos segredos a desvendar,
faz-me pensar no teu corpo,
vontade de beijar tua boca
‘esta boca cheia de mistérios’
talhada como se com cinzel.
pedindo; faz amor comigo;
depois de um poema quente
como só tu sabes fazer...
‘docemente indecente’
Canção hibernal
aquela insistente canção do vento
sibilando nas frestas das venezianas
‘da janela do meu quarto’
é a única e indivisível comprovação
que; por ti ainda não morri de amor...
Dispnéia
se te amo
nas ausências
desse amar.
aproximo,
desaproximo,
me deixo levar
no teu mar
'à deriva'
qual um náufrago;
atraído
as profundezas
do teu amar.
e qual um peixe;
'submirjo'
na ânsia
de te encontrar...
te amar
é preciso
no meu precisar;
como se pra
respirar
precisasse
de ti
como ar.
REENCONTRO
Ela adormecida sobre um véu.
Sorrateiro deitei-me ladeando
seu corpo moreno 'adouradado',
nu, revelando a bela púbis mel...
Então, irresistível, toquei-a suave
entre suas pernas entre-abertas;
exalava rosas, lavandas e cio;
Fingia o tempo todo que dormia.
De súbito, grandes olhos negros
abriram-se, olhar fixo, sedutores,
mãos despindo-me brutalmente.
Interminável noite; prazer, amor.
Ganhos e ganhos renegociados
e repetidos intermitentemente.
Azulejos
é deleite, mas;
versos azulados
causam ciúmes.
di-los-ei ocultos
sob os lençóis;
aos sussurros,
em relevos.
azulejos de nós
Emoções, ainda...
tu passas por aqui apressada
em todas as minhas manhãs;
faço-me silhueta em disfarces.
e o teu meigo rosto enrubesce,
como na minha mão trêmula, idem,
o ramalhete de flores silvestre.