Poemas, frases e mensagens de RitaSchultz

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de RitaSchultz

A LENDA DA CHUVA

 
No regaço das nuvens descansavam os anjos. Longas eram as suas asas brancas e seus cabelos negros como as noites sem luar.
Receberam os anjos uma missão: plainar sobre a terra e entre árvores, e entre olhares e arroios, e por entre brisas e alguns carinhos. Deveriam despertar o cheiro de rosas com cuidado entre dois corações.
Desceram à procura, atentos às dimensões dos corpos de mãos dadas, procurando pelas vidas que passam, aprendendo a linguagem do lugar e suas leis.
Miraram a paisagem, estudaram os princípios, correram invisíveis entre as casas, deslizaram sobre o leito de rios serenos, ou nas tormentas das madrugadas.
Dois corpos vieram através de um caminho. Uma alma ia. A outra vinha.
Os anjos estremeceram. Invocaram cantigas e sonhos, estrelas de um plácido lugar. Cantaram em coro, os anjos, e entre parreirais, e entre figueiras, e entre flores de pessegueiros, e entre as pedras das ruas, iam cantado os anjos porque viram dois corpos que passavam, leves como a sombra que passa, silenciosos em suas próprias recordações.
Os anjos postaram os olhos nos olhos do corpo que vinha e do corpo que ia. E suspiraram os anjos, e entrelaçaram os dedos, felizes, e ternamente entoaram a canção do amor eterno para os corpos que passavam. Era a missão deles.
Os corpos que iam e vinham cruzaram-se pelo caminho. Olharam-se. E não se reconheceram. Continuaram seu rumo incerto, seus vestígios, suas mãos e seus passos pelo caminho.
Os anjos perderam-se de suas direções. Seus versos desaprenderam a memória cantada. O dia prolongou-se imóvel na sua perfeição mais pura. Imobilidade nos amanheceres seculares. Silêncio nas asas do mundo. Nas bocas dos anjos. Nos corações dos anjos.
Contemplaram os anjos, os dois corpos que se cruzaram, mas não se reconheceram. Não reconheceram o amor.
E assim, contemplando o amor nascido morto, os anjos choraram pelo que deveria ter sido e não foi.
Recostados nas nuvens, não suportaram as águas nos olhos: infelizes os anjos verteram lágrimas sobre a face da terra.
Um murmúrio de gotas em ventos suaves nas folhas, em riscos agarrados a grandes trovões no céu se ouviu. A chuva cumpriu-se áspera e às vezes serena à margem da vida.
E o amor, de cinza se recobriu.
 
A LENDA DA CHUVA

QUANDO EU PARTIR

 
apenas não posso chorar agora:
minhas mãos
do oceano do seu sorriso se desprendem
porque há um ruído áspero
que vem do meu peito.
mas não se importe,
encontrarei meu rosto na terra
e como recordação
deixarei longamente meu perfume
nas mansas águas do seu olhar.

mas isto, quando eu partir.
apenas quando eu partir.
 
QUANDO EU PARTIR

A MULHER QUE PASSA

 
Os passantes não gostam de mim, assim como o casmurro chamado dom por ironia de fidalgo.
Sou calada e metida comigo mesma, assim como ele.
É com pequeno esforço que também eles, os que passam, pouco ou nada importam-me a mim. São bonitos. São sinistros. Desimportantes.
Eu, ao contrário, fico acordada para ver a lua que passa. Sento-me ao pé do hibisco e contemplo a obra por toda a madrugada. No frio, calor, no vento ou na tempestade.
Minha vida é pacata, silenciosa e infame. Tal qual a punhalada que sinto no corpo, quando um qualquer me atormenta na fome de esmola na rua.
Não tenho amigos nem nas estações do trem. Nem de partida nem de chegada. A minha vida é a de uma mulher que passa despida de graça e vestida de espinhos nas pontas dos dedos. Não tenho mais nenhuma pressa.
O que você não sabe é que eu vivo de uma saudade. Em verdade, eu vivo de uma lembrança rara. Todas as horas do meu dia são dedicadas a contemplar o rosto pintado em branco e preto na moldura de um retrato.
O meu corpo carrega agudas setas no silêncio intacto das trevas.
Assim, sou eu, esta mulher que passa.
 
A MULHER QUE PASSA

O MEU AMOR

 
O meu amor é como uma cerejeira em flor onde eu posso me sentar à sombra e descansar.
Ele me oferece flores e gestos de carinho pois estou desfalecendo de amor.
Ele me abraça e acaricia a minha cabeça e me aquece quando estou no frio, me contempla quando é primavera, perfuma-me com o perfume mais doce da natureza, e me diz, amor meu, vem!
As suas mãos são ternas e suaves como a seda e o seu beijo é quente e sedutor.
Oh, meu amor, aqui te amo debaixo dessas árvores, sob esse vento suave e morno e onde a lua brilhante escorrega pelos campos procurando estrelas, altas estrelas.
Eu amanheço neste porto seguro e continuo a amá-lo.
Como é doce a sua boca que a minha alma deseja, o seu corpo que desabrocha em mim.
Oh, meu amor, que habita os jardins e a minha companhia, vem depressa outra vez!
Beije-me com os seus lábios de cetim!
 
O MEU AMOR

O INFERNO DE AMAR

 
Que inferno é este o de se apaixonar
essa chama que ateia perigo
que ardente e serena consome o corpo
alenta a alma, quebra o pensamento?
Nao sei de paz, de nenhuma luz.
Sei de inferno.
E de como é doce esse desassossego de amar.
 
O INFERNO DE AMAR

VIVA-ME

 
ama-me como os anjos amam
suspensos em seus sonhos azuis de mármore
e pelos delírios da carne nua
ama-me como um corpo salva o outro
da fenda
do frio
da fome
viva-me!
 
VIVA-ME

TEU ROSTO

 
por que se fragmenta tanto o tempo
e ali as asas não são as minhas
e as pedras têm olhos abertos para o nada?
chega-me o desejo agudo
de um azul intenso
nos ares desta longa madrugada.
onde estaria teu rosto que eu leio e sei de cor?
suspenso por um fio
no fundo de um retrato
onde estranhamente germina a minha face sem cor?
 
TEU ROSTO

TUA ALMA

 
tua alma anda livre por outros horizontes
a entardecer segredos.
de repente, o terror!
penso o teu pensamento!
e no fio do instante em que penso
invento teus braços aprisionando
e te prendo anímico a mim
como a abelha ao pólen
como a uva ao vinho.

se invento palavras e alternativas
para saborear a luz que me queima o corpo
é que meu tecer foi em vão.
contudo, ainda caminho no estrangular sereno dos dias.
 
TUA ALMA

O VÍNCULO IMPERFEITO

 
o salpicar da chuva suplica acordes na madrugada insone
verdades destruídas em gotas de mentiras seculares
rompe em sulcos a face bruta:
lágrima de vigília acesa na escuridão
o inesperado sal da vida!
o inesperado simples da vida!

nas pontes serenas sem mais vínculos
tu vais pelos caminhos extravagantes
oh, pescador ingrato de ilusão
tu sabes que vais ferido
pelo fio descido da lua
distraído dos muros que cercam
o teu imperfeito coração.
 
O VÍNCULO IMPERFEITO

O SILÊNCIO DA PÉTALA

 
hoje eu quero ouvir tuas palavras sobre luzes
e sobre rosas.
quero ver teus olhos que me convidam a viajar pela magia do universo
não romperei o silêncio.
não tocarei uma sinfonia.
não abrirei a boca.
tu? tu nem ouvirás os meus passos.
mas a pétala da rosa ao cair pelos confins do infinito
resvalando no teu coração
ah, essa tu ouvirás!
 
O SILÊNCIO DA PÉTALA

EU TE AMO

 
Eu te amo como a pétala da rosa que perturba a água cristalina, como o aroma doce e quente trazido pelo ar. Eu te amo mais, muito mais do que o medo que tenho dos trovões e dos raios que caem nas montanhas e anunciam a chuva inesperada.
Eu te amo, não porque tu és o ar que eu respiro, o vento que sacode as andorinhas nos fios e leva os pardais para além da imensidão dos seus voos e de suas asas pequeninas. Eu te amo porque nosso tempo é sem promessas, porque entre nós existem dois corações num só ritmo e também, eu te amo, sabe, porque eu não conheço outro jeito.
Esse é o meu jeito desajeitado de te amar.
 
EU TE AMO

QUANDO TE VEJO

 
Interfere na minha paisagem
repleta de cores e flores
pálidas e sombrias flores.

A música transparente evola
do teu corpo que passa.
Lembram-me teus gestos
o azul de que é feito meu passo
quando te vejo.

Perdendo-me
existo no teu vulto que assombra
e me flutuo.
Encontrando-me
nada existo até a raiz inútil de me ser.

Ah, com que tal tudo quero te sonhar
na poesia que sinto nos teus olhos
quando te vejo por mim passar.
 
QUANDO TE VEJO

INSENSATEZ

 
tomou o café quente e aqueceu a alma
mexeu com o pensamento mais uma vez dentro da xícara
sem resposta insinuou uma pergunta ao pires
acendeu o dia sem riscar nenhuma palavra
sacudiu as cinzas no céu
levantou-se
demorou a chuva no olhar ao longe
fez círculos com a ponta do coração na calçada
e seguiu

quanto a mim
- o vento cantando nos cabelos
guardei o rosto entre as mãos
e chorei.
 
INSENSATEZ

PERSEVERANÇA

 
Todas as coisas percebo sem forma
mas ainda há flores vermelhas
brancas
azuis...

Há um fio de alma exata
em persistir na trajetória.

Sim, é preciso sorrir para a promessa não cumprida!

Hesito em acabar-me em poeira e fim.
Abstraio a rota quebrada do tempo
e não me detenho em nada:
a saudade em enxergar estrelas
tece amanheceres em mim.
 
PERSEVERANÇA

DESVENTURA

 
Nada pode apagar o que guardamos no peito, esta loucura de sentimentos que sela o coração. Porque não sei quem pinta os segredos da poesia. Mas sei que o vermelho também fica pálido no arrastar do dia.
É no silêncio, na penumbra entre a sombra e a luz que trago a eternidade para cicatrizar a alma. Porque minha sombra vai depressa. Meu coração é que vai devagar.
 
DESVENTURA

TECENDO ABRAÇOS

 
Porque você é muito em mim, eu faço o que meu coração é capaz de fazer.
Posso chorar com você, acolher seu fardo, alegrar sua alma se você me permitir. Estou sempre aqui, mas não espere de mim perfeição. Eu posso machucar. Não porque eu não ame você, mas porque somos tecidos pelo fio das humanidades. E dos erros ninguém pode fugir.
E também você sabe, o abraço é um gesto poderoso de amor e de cuidado.
Então, por que você não me dá um abraço?
 
TECENDO ABRAÇOS

AMOROSIDADES

 
esqueci meu coração batendo.
meus lábios sentiram a sua carne quente e o mundo ficou em silêncio.
era apenas a gente lá e aquelas borboletas no estômago.
você ficou falando das sete maravilhas do mundo quando eu tinha certeza que elas estavam bem ali na minha frente: o seu sorriso e esse seu olhar quando pousava em mim.
e pensar que você não é nem o sol, nenhum perfume, nem mesmo chocolate! e como eu amo você mesmo assim!
 
AMOROSIDADES