Poemas, frases e mensagens de JoséCorreia

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de JoséCorreia

1

 
porque agora os teus olhos qualquer verde
mesmo que Outono ou talvez mais cinzento
agora que o teu nome em qualquer parede
em qualquer ouvido porque talvez o vento

porque talvez eu, só eu os poderia ver assim
(ainda que Outono e o chão amarelecido)
ver em qualquer cor a única que sei em mim
e em qualquer nome um outro nome repetido

porque agora os teus lábios num reclame
qualquer de televisão, e a tua voz então
numa qualquer outra voz que me chame

e agora que os teus olhos em cada mão
teimosamente a dar cor a qualquer desilusão
à espera ,ansiosamente, por outro alguém que os ame.

J.C.
 
1

desde que um arrepio

 
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para Frumi

perdoar como quem, a cara derretida pelo afecto de um estalo

- Beija-me neste lado.

como uma valsa, agora perto mas uma palavra mal proferida e agora longe, vai-te embora e se virar costas

- Como consegues ir embora?

perdoar é ir embora, agarrar e querer morder porque não há explicação para quem se quer ir embora, para os pássaros é fácil, com asas, nós anjos caídos em desgraça

- Por favor deixa-me comprar-te uma camisola nova.

quem cospe na cara com palavras falsas, porque o medo, não merece perdão, quem depois as engole assim como punhais que suavemente nos descem pela garganta, perdoar é engolir punhais de outrem, a luta inglória para cegarmos a vista às falhas daquela pessoa, tanta cegueira que depois caímos numa, não me perdoes que não sei se aguentarás, porque outra pessoa e era eu, outro toque e estava eu, outro perdão e fui eu e mesmo assim

- Pensas que vais ser um grande escritor não pensas.

e haja quem me perdoe

- Pois para mim serás sempre uma grande merda.

perdoar como pedir perdão, num banco qualquer e a chorar não porque ébrio, mas porque uma maneira de pensar redutora, e duas mãos nas costas, e os olhos sempre verdes, sem saber se com pena ou outra coisa superior, com vontade de perdoar e com medo de falhar

perdoar, é difícil, é respirar com dificuldade, ter uma cadeira e sentar-se no chão, perdoar nunca é esquecer, quem perdoa não esquece mas perdoa, perdoar é tirar o peso todo dos ombros de quem errou e bruscamente senti-lo sobre os nossos, perdoar é não dizer

- Tenho todo o teu peso sobre os meus ombros.

perdoar não é esquecer mas é perdoar, é não massacrar alguém para nos massacrarmos a nós, e esse, muito provavelmente, é o maior amor de todos

(quando o verbo amar se transforma num mero código)

- Eu perdoo-te.
 
desde que um arrepio

la vie en rose

 
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magoar alguém é frágil, pousar o livro e dizer

- Hoje vou escrever.

magoar alguém é fácil, é distraído e é presunçoso, não quero dizer mesquinho mas

- Já devias saber quais são as minhas flores preferidas.

magoar alguém é cair, às vezes sem tropeçar, às vezes cair em cima de alguém, para nós só um susto e para quem nos recebe, uma ou outra nódoa-negra

(quem não suja o coração)

aqui e ali, desde que não seja por volta dos olhos que aí magoar já é cobarde, magoar é sussurrar

- Estraguei tudo.

a chorar ou não através do fumo de vinte cigarros, um sussurro que

- Já te pedi para não me berrares.

magoar alguém é justiça se assim quisermos acreditar, nunca magoamos ninguém se não quisermos, a culpa não é minha se escorregaste no amor de alguém e partiste o coração, magoar é fugir, magoar dói porque cuidou tanto, ou as palavras que era tão doces e no balcão do bar de strip, vinte euros para cima e quase que já te podem magoar

magoar alguém faz parte, há quem diga, lemos livros e comemos muitas verduras, vamos ouvir orquestras e jantar à beira-rio, é assim, magoar alguém é assim, mais que mentir com a verdade

- Eu ia dizer-te, juro.

magoar alguém é a vida cor-de-rosa, nós só não somos daltónicos nos ouvidos e eu que era tão boa pessoa

magoar alguém é lucidez, o risco negro a escorrer até ao lábio, e não bastasse somente o impropério em si:

magoar alguém é sempre um outro sorriso perdido por aí
 
la vie en rose

António Lobo Antunes (Página 240)

 
Às vezes sentimo-nos desamparados sem saber que desamparados sempre

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António Lobo Antunes (Página 240)

soneto do erro original

 
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soneto do erro original

sempre desejei além que qualquer coisa impossível
errei, ter e o verbo em si já é perder, já é soltar
soltei menos, muito menos do que me era possível
e agarrei demais, coisas que a brisa faz levantar

sentei-me à espera mas como se não esperasse
os anos vindouros de outrora e a falha de ninguém
amei tanto e tanto mas sempre como se não amasse
esquecido de mim e de alguém que já não vem

fui deixado antes mesmo de ter sido, e não sonhei
com quantos erros se constroem os erros fatais
quantas solidões precisamos para não sermos especiais

pequei como nunca, e dos pecados que usei, ousei
ver a tua boca na mesma boca de outras que beijei
bocas de batôn único, mas de beijos iguais

J.C.
 
soneto do erro original

Sem peito

 
sem peito

há pessoas sem peito que no nosso se seguram
a usar palavras que não custam porque convém
e é quente e é para sempre e nos amarguram
num abraço enorme onde não cabe ninguém

secalhar somos nós, já de peito feito cinzento
invadidos por quem sem lei nos tira balanço
e dizem, és tão grande que eu me desoriento
e afinal és tão pequeno que eu não te alcanço

pessoas sem peito são pessoas que nos fodem
que nos habituam ao seu choro feito de vapor
pessoas que nos vivem, nos atingem e fogem
porque é assim, porque é a vida, porque é amor

há pessoas sem peito como que sem vontade
sem o peso que me deixa mais preso que livre
e quem mo roubou não sabe que na verdade
alguém sem peito já morreu, porque quase vive

J.C.
 
Sem peito

Falhei todos os gestos

 
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falhei todos os gestos

falhei redondamente todos os gestos
que em urgência me procuravam
todas as palavras que me mentiam
se as dizias:
não falavam
se as calavas:
só mentias

e era ouvir-me, eu sempre soube
que gestos teus são para se falhar
guardar no bolso de corpo nu
se beijavas:
desconfiava eu
se não:
acreditavas tu

mas em que miradouro é que ficou
no esquecimento que é Lisboa
a curiosidade que nos (a)fundou

e o vento que se levantou
não guiou só confundiu

em que miradouro é que ficou
em que jura é que caiu

se tudo o que eu queria era não falhar
os gestos que tinham urgência de me alcançar
as palavras roucas que se cansaram de gritar

os caminhos todos por onde dizias
que o rio levava ao mar

tudo o que eu queria
era magoar-te mais que a mim
(que outra forma haveria)
para saber por fim
que te amava e não sabia

José Correia
 
Falhei todos os gestos

E quando não fores mais um lugar a descobrir

 
e quando os teus braços, outra vez braços
desconfortáveis por serem úteis na leveza
desprovidos do toque que os tornava regaços
se há chuva não cobrem, se há vento, incerteza

que farei quando as tuas palavras, só palavras
massacradas de serem ditas vezes sem conta
que de tantas vezes correctas se fazem erradas
a palavra que ajudou a construir, só desmonta

e quando os teus cabelos, simplesmente cabelos
as tuas mãos entediosas de serem mãos, somente
e os teus beijos aborrecidos de serem novelos
de nós apertados por uma insegurança doente

e quando não fores mais um lugar a descobrir
maior que o céu de onde tenho medo de cair
e quando perder o medo das grandes alturas
as vertigens de quando me olhas às escuras

que faremos quando formos tédio e televisão
quando olhar para nós for matéria de desilusão
como será descobrir que já fomos descobertos?

é como estar perdido e mesmo assim termos noção
(além da que nunca mais podemos ser redescobertos)
que todos os teus caminhos são correctos, mas incertos

José Correia
 
E quando não fores mais um lugar a descobrir

nunca soube fazer as pazes

 
onde demos asas às nossas vozes
e o tecto tão baixo que elas
nos sabiam a gritos

nós se aflitos, o fumo do teu cigarro
a queimar-te a garganta e a secar
a contínua vontade de gritar

por muito que me digas que eu não
que de certeza que não, uma pedra talvez
onde deveria ter o coração

e eu quando tenho certezas estultas
que já não me amas porque não dizes
que gostas de mim e somos felizes

é fácil culpar a minha voz sem regras
os nossos feitios que parecidos, não rimam

para quê, amor, se já não são nossas as bocas
que agora se aproximam

José Correia
 
nunca soube fazer as pazes

Teoria geral para as coisas leves

 
Visitem o meu blog: http://ondeficaesperarpor.wordpress.com/

TEORIA GERAL PARA AS COISAS LEVES

o hábito é a pior droga, o pior vicío

- Não estou habituada a estar sem ti.

e há quem aceite isto como luz, de sermos matéria ao medo de alguém, um dos medos mais básicos de quem não só bombeia sangue, a solidão

do hábito não se fazem espontaneidades, mas o medo de não aparecer mais ninguém que se queira habituar a nós

- Já estou habituado a ter o peito puído.

o hábito é dúbio, nós habituados a ouvirmos as mesmas palavras ou habituados a ter as mesmas acções que resultam nas mesmas palavras?

é só hábito, com um centro de gravidade incrível, habituados ao hábito

quando me disseram

- Não gosto mais de ti.

eu, estúpido, habituado a ouvir

- Gosto de ti.

a chorar que nem um desalmado, hábitos e egos

há uma coisa a que ainda não me habituei, cansarem-se de mim

ser fastidioso, linha recta, mar sem ondas

saber que para ela se cansar de mim bastam apenas aquelas palavras doces a que nos vamos habituando a ouvir como quem acredita que há chão no próximo passo

- Habituo-te muito.
 
Teoria geral para as coisas leves

lugares

 
será assim tão cruel da minha parte se

eu te disser que o mais certo é ficares

de coração partido, enquanto dormes

e escondes para ti os teus olhos enormes

que não sei se serão mais verdes ao acordares

eu acho que não porque se te sussurrar ao

ouvido coisas que não gostas e não se diz

como quando digo que tens tão mau gosto

que beijos a mais me deixam mal-disposto

provavelmente não ouves, porque sorris

será assim tão cruel mentir-te com mentira

se no fundo enquanto dormes e não me ligas

há algo que bate tão bruscamente que receio que te fira

se quando fechas os olhos é quando mais me castigas.

Visite também o meu blog sobre "poesia" de António Lobo Antunes, último post, Corações de pedra.

http://naoemeianoitequemquerpoesias.w ... /19/capitulo-6-pagina-85/
 
lugares

Poesia de António Lobo Antunes

 
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É sabida a admiração que o escritor António Lobo Antunes nutre pelos poetas.

Lobo Antunes escreveu:

“Pensava que uma das poucas qualidades que tinha era a ausência de inveja. Não é verdade. Invejo os poetas. O que eu queria mesmo, o que mais queria neste mundo, o que mais desejava, mas não tenho talento, era ser poeta.”

A verdade é que a sua prosa rica em metáforas e em poesia de versos longos é uma mina inesgotável de vocabulário e expressões, com o potencial de meter inveja a qualquer poeta.

Vendo a potencialidade que cada página do seu livro tem, surgiu-me a ideia de, simplesmente, escolher as palavras e/ou expressões para assim formar um poema, transmitir uma ideia. E essa será a minha única participação nisto tudo, apenas cortar palavras, não as reorganizarei, seguirei a linha lógica do texto ou página, ou seja, se “mar” vier depois de “pinheiros”, não poderei formar uma frase em que “mar” apareça antes de “pinheiros” e assim sucessivamente, para então minimizar o meu impacto.

Agora põe-se a questão, quem é que é o poeta? Quem escreve as palavras? Ou quem as escolhe? Para mim, neste caso, nenhum dos dois.

Mas o inegável é que todos os poetas ou escritores portugueses usam o mesmo idioma, as mesmas palavras, e que no fundo, só as organizam de maneira diferente.



A ilustração é de Fernão Lopes.

Este blog é escrito segundo a antiga ortografia.
 
Poesia de António Lobo Antunes