Poemas, frases e mensagens de elsa

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de elsa

Não me conheço hoje. Hoje tento descobrir quem fui ontem. O tempo rouba-me espaço para encerrar o que restou ontem de mim.

Desejo-te ou desejo este desejo?!

 
Encontro-me sentada no sofá. A música deixa rasto neste canto, não sendo por mim recebida. Sinto-me envolvida na volúpia que encontro no teu olhar. Teu olhar que acolhe o meu corpo. Meu corpo que te pede luxúria. Apetece-me vagabundear sobre a nossa intimidade que ambiciono. Peço ao passado que me traga o calor do teu pescoço, com o cheiro entranhado na derme. Ainda sinto teus lábios presos entre meus dentes. Ainda sinto o momento.
Desejo-te e não sei o que isso é; só sei que me estonteia de tanto me agarrar afincadamente a este desejo, não desejando perdê-lo. Será este desejo uma brisa que se transforma em tornado que me acorda, que me açoita os sentidos e me lembra que estou aqui? Será que dou permissão a este desejo coexistir porque desejo ter este desejo? Será este desejar o desejo que o faz sobreviver ou será o objecto do desejo que o aviva? Sinto que a serenidade já há muito foi escamoteada pelo desejo. Este não vive da ilusão, mas comporta a ilusão como vertente virtual, enquanto expressão da minha realidade vedada aos outros.
Em emoções sou de poucas certezas. Tudo me surge carregado de neblina, a razão e até as tuas expressões. Tenho só uma certeza: não desejo qualquer um e porquanto não é a busca de prazer o meu móbil. Não é a necessidade que me atormenta. A necessidade é limitada mas não o desejo. A necessidade de prazer não pode ser minha – eu sei-o.
Será que este desejo de prazer, que permiti insuflar com o tempo, aumenta pelo perigo que me deveria afastar dele? Por vezes penso que não pretendo a satisfação deste prazer, mas por outras acho que controlo o sentido do meu querer para fugir à culpa. Por vezes, as minhas insistentes entregas ao desejo deixam-me cair no fosso que própria cavei e que me faço enfrentar perante a censura moral, que condena o meu tão desejado desejo. Penso em culpa: culpa de um pensamento, de uma palavra, de um gesto, de um toque, de um coito, de um gemido... só sinto culpa porque o outro me pode culpar. Mas sei que sou fraca e que me deixo entregar facilmente ao erotismo, fugindo da culpa rapidamente, que me quer ceifar o desejo ... ai!, como me possui este desejo!! Rapidamente me faço encontrar com o sustentáculo que me mantém na vertical: este desejo.
Será este desejo um preenchimento de um tédio? Mas como pode o tédio ter espaço na minha vida, se tento nunca lhe dar espaço de coexistência? Até porque se assim fosse não escolheria eu o objecto de desejo bem mais acessível, para concretizar a satisfação de prazer? Pois, mas, não procuro prazer, é verdade. Sinto-me tão embrulhada em pensamentos. Sinto-me tão desejosa de me embrulhar em teus braços.
Ai!!
 
Desejo-te ou desejo este desejo?!

A solidão não se mede em metros

 
Estou só. Não sei se me apetece deixar de estar só.
A solidão sempre me acompanhou até à independência, mas também me prometeu coloração à melancolia. Não procuro companhia. Se quisesse companhia procurava na religião o reconforto sempre presente.
Agrada-me estar virada para a parede, e não me voltes. Deixa-me só nesta sala exígua, em que me perco para me reencontrar. Parece tão egocêntrico a necessidade de olhar para dentro de mim. Julgo que sempre que me olho em solidão vejo os olhos da multidão. E aí vos compreendo.

Como sabes, sempre considerei que é fácil viver dentro das conformidades da multidão, como também o é viver de acordo consigo próprio na solidão. Fujo da unicidade exprimida sempre em uníssono, mas recolho-me na solidão, continuando a acomodar-me nos facilitismos que não magoam. Não obstante, estando só costumo atrever-me à exposição, gritando, – e tu sabes que é verdade!, o que todos pensam pela surdina quando estão sós. Quando estou só estou livre.

Não julgues que a solidão é medida. A solidão não é medida é sentida. A solidão não é medida pelas milhas de espaço que distam entre nós e os nossos iguais. A solidão não é medida, só sentida enquanto esperamos deixar de estar acompanhados pela solidão.

Estou só e feliz enquanto espero deixar de estar só.
Estou só e não sei se me apetece deixar de estar só.
 
A solidão não se mede em metros

Ponteiros do tempo

 
deixo os ponteiros do relógio dispersarem em campo circular outrora definido por outrem, que não eu. eu não acredito no tempo. e ele não acredita em mim. nunca cedeu aos meus pedidos suplicantes, até. o tempo vive, mas nem sempre deixa viver. nem sequer é firme na sua definição de linearidade temporal, porque tanto o vejo a saltar para o passado como galga para o futuro. sofre de mutações pendendo tanto para a velocidade como para a lentidão. parece correr ou parar consoante as vicissitudes das nossas vidas. o tempo nunca desculpou os nossos pecados nem escutou as preces de todos. só é fiel aos não viventes, porque para eles é gélido, sem pressa de vida, coarctando toda a esperança de vencermos na ressuscitação saltada das campas . o tempo só dá tempo a quem já não precisa de vida- só têm o seu nada em que nada lhes serve a paragem de tempo. deixo, porque tenho deixar, os ponteiros do relógio dispersarem.
 
Ponteiros do tempo

Sonhar...nem sempre em sonhos!!

 
á estou a ser invadida pela necessidade de dormir, mas resta-me ainda a necessidade de invasão da vontade de dormir. Quero sonhar acordada, poupando horas ao tempo num sono. Quero sonhar com o disponível em memória.

(...)

Contudo, no sonho pouco partilhado por mim, em corpo repousado, sinto-me mais verdadeira do que quando acordada, enquanto juíza acordada, sempre que nego os sonhos.

Sinto-me mais povoada em sonho dormido. Deixo as outras pessoas visitarem-me livremente nos sonhos. Deixo as pessoas que coabitam em mim ressuscitarem nos sonhos. Nunca sonharíamos se fossemos um ser único, acreditem. Quero acreditar. Gosto de acreditar.
Deixo sonhar a promessa do impossível, porque sei que me privo dele assim. Deixo ter ilusões em sonhos.

Quero acordar e lembrar-me do que sonhei. Sem memória nada existiu. Não quero sonhos descartáveis; senão prefiro sonhar acordada com o disponível em memória. Ora deixem-me sonhar acordada!! ora deixem-me sonhar a dormir e lembrar-me do que sonhei!!
 
Sonhar...nem sempre em sonhos!!

Estática, fujo para o vazio.

 
Deambulo descalça entre as areias deste antro em que depositaram os meus pés, sem andar próprio.
Olho e não vejo. Vejo e não olho. Vejo o vazio dentro de mim, quando não olho para o mundo. Olho o vazio e não vejo o mundo.
Olho em frente! Vejo só o corredor! Sem fim! Vejo o nada. Estranho.
Sinto-me uma transeunte perdida à procura de se perder, nesta estrada mal alcatroada que deixaram para me ver cair. Mantenho-me firme neste covil em que me colaram os pés.
Lanço o olhar, agora, para o horizonte. Vislumbro a finitude do longínquo, que nunca alcançarei. Uma estranheza entranha-me nas entranhas do meu recôndito ser.
Penso no futuro que não existe: há-de existir. Penso no passado que não existe: só existiu. E, o presente é tão exíguo, de tão pouco espaço de existência deixaram para ele - e, é dele que fujo. Fujo para o passado e para o futuro ... que não existem.
 
Estática, fujo para o vazio.

bailado entre estilhaços

 
vazio a bailar. como revejo quem eu não sei quem sou!! penso, pinço grandes ilações da magnânima verdade que julgo haver em mim e ...torno-me a encontrar a bailar: sem saber quem sou;
e, sem saber a vida que tenho de quem pertence.

O meu vazio que traz e prega à alma um caos, recolhe-me todas as vontades e dá a mão à inércia. Deixo-me entregar. Quero-me entregar. viver no vazio é deixar-me cair no sonho. e sonho em ti. sonho em nós. nós só em sonhos.

nada me preenche.
nada me enche.
nada me intumesce.
tudo me foge ao senso.
tudo me interpela a pouca lógica que faço restar em mim.
tudo de ti me reitera a toda a hora e a todo o momento.
um sopro traz-me o teu rosto de volta à algibeira dos segredos. nada mais me resta. incrível que é: ter apenas a ilusão de te ter tido. só me resta a ilusória traição da memória dos momentos que vivemos. Entendes? só me resta o que não vivemos; mas, o crer e o querer viciam-me as lembranças retiradas à pinça da memória. Entendes? como me irrita o que sobrou de ti em mim, porque me deixou muito pouco espaço para mim. tanto que por vezes não sei o que quero de ti nem de mim. como aprecio a tua tristeza que vive em mim, quando pensas em mim, por me teres em vontades, mas não me teres em matéria. aprecio o teu sorriso que vive em mim, quando tu me escutas ao longe, de tão longe, bem de longe. Mas sei-o!, que quando pensas em mim, tomas-me por quem eu sou em mim. pouco sentes o que há de mim em ti, porque muito pouco tens de mim em ti. muito pouco há de sentires. sei-o!, que quando falas para mim, falas para mim. como queria que quando falasses para mim, falasses para dentro de ti - eu existiria em ti.

nada me preenche.
nada me enche.
nada me intumesce.
tudo me foge ao senso.
tudo me interpela a pouca lógica que faço restar em mim.
tudo de ti me reitera a toda a hora e a todo o momento.
 
bailado entre estilhaços

Encontrei a voz dos ditadores. Encontrei o rosto da fome

 
Vocifera-se a pena
em discursos cuspidos
que nunca salvou o seu penar.
Entre apertos de mãos
acorda-se quantas migalhas se vão despejar
sem a fome calar.

Oferecidos ao solo
pereceram já de sentença registada à nascença
pela posse de melanócitos acusativos da vislumbrada diferença.
Diferença móbil para ditar o dialecto do poder.

Encontrei-os já de mucosas cianosadas
em semblantes apáticos
em corpos prostrados.
Serão depois apenas matéria que será esvanecida
restando, apenas para alguns de nós, a memória sequiosa de ser esquecida.
 
Encontrei a voz dos ditadores. Encontrei o rosto da fome

Rascunhos no café Nicola

 
Com gotas de café
Nas papilas.
Lembro-me que me sopraste a fé,
Dos meus resquícios.
Sobrou-me apenas o sabor dos vícios,
Nos meus interstícios.

Andas descalço
Em cima de mim sem sentido
E eu sinto o estômago a gelar.
No teu encalço
Deixei há muito o sentido
Cair e se estatelar.

Já no termo
Encontras apenas
O meu ser ermo
Sem eira
Nem beira.

Com gotas de café
Nas papilas.
Vejo-me enclausurada em cerradas esferas
Onde cogito para os meus rascunhos
Em tempos de boas esperas.

Auguras
As minhas beiças caídas
Nutras saídas.
Perfuras
Minha ternura
Que permiti cair em desventura.
 
Rascunhos no café Nicola

Reticências da vida não me deixam caminhar

 
Parte I
Julgo a minha vida tão oca de vazios misteriosos. Parece o desfrutar de toda aspiração. Julgo a minha vida tão recheada por tudo apreciável pelos curiosos. Parece um aglutinar do esvaído que sobrou da fumaça que sofrera expiração. Julgo a minha vida tão sem nada entre as cortinas. Parece um novo sentido nos ponteiros que norteiam as rotinas. Julgo a minha vida tão cheia de tudo o que é intolerável pelos invejosos mirado nas suas retinas. Parece a utopia em que todos ambicionam acreditar. Julgo a minha vida um embalo para o éden eu visionar. Parece um sorriso que se rasga em riso na fácies e esta se esfregar na fronha de cor âmbar.
(...)
Parte II
Mas se assim é, porque me sinto eu assim?(...)

Parte III
Será ela incompleta ou serei eu que nem sequer sei o que rematar? Serei feliz por ela estar incompleta? Desejarei eu o facto de faltar uma sua parcela, a descobrir, para continuar a sentir o sentido da falta? Terei eu inventado quase desde sempre o poder da falta? Terei eu descoberto o segredo da minha ventura ao ter inventado o que me incompleta? Serei eu de matriz ditosa ou inventei-me de tanto acreditar que sou assim? Continuo sempre com um sorriso para às escondidas definhar em curtos e sumidos ecos que vou escutando desde sempre e para sempre, ao que parece.(...)

Parte IV
A esperança nunca foi amiga para prosseguir para a tão desejada quimera. A esperança nunca deixou fazer o divórcio do pretérito que ainda deixo restar nesta agrura. A esperança é aquela que transporta toda a culpa que descarrego de cima dos ombros do desejo que auguro. A esperança lança-me os sonhos para os olhos como de poeira nefasta se tratasse para um são acordar. A esperança desenha-me o futuro que desejo e que se entrelaça com a virtualidade como parasita afastando-me da realidade que até nunca me amargurou.
(...)

Parte V
Porque me sinto eu assim, se sou feliz?
(...)
as reticências não me deixam caminhar
 
Reticências da vida não me deixam caminhar

agora aqui estou eu

 
sei que a memória copia o poder da matéria no espaçotemporal. faço da memória o que faço com os meus átomos. Posso mudar tudo, e trago o passado para o presente, e o lá para cá….e perpetuo….O tempo e espaço têm uma relação de reciprocidade indivisível- é de senso comum, bem sei. Como também é sabido que a matéria deforma a curva espaço-tempo. Mas para mim, o intrigante é pensar sobre o pensamento, em registo de memória, integrado e articulado no espaço-temporal, como se de um uno, também, se tratasse. Quando estou entregue às memórias, sem já estar de corpo presente no espaço-temporal em que estive contigo, sem ter a matéria a estabelecer os parâmetros, como posso mudar os eixos? A verdade é que mudo os eixos. A verdade é que mudo os parâmetros. Se quero esquecer o eu no espaçotemporal, consigo alarga-lo ou estreitá-lo, conforme o masoquismo do momento. Se quero lembrar o eu no espaçotemporal, consigo, sempre, alargá-lo. Sempre. agora aqui estou eu - e reparem que mais uma vez o espaço e tempo estão contíguos, a partilhar a mesma linha- a relembrar o ontem, em que já lá não estou, mas mesmo assim a ordem de sucessões e de coexistências as faço transmudar. A memória copia o poder da matéria na linha espaçotemporal? Átomos que coabitam no espaçotemporal, é inteligível que tenham comportamentos promíscuos e todos se toquem e se deixem ser tocados. Mas a memória não é materializada e a verdade é que estou contigo eternidades…e longe de ti eternidades…..(e o perto/longe tornam a partilhar o mesmo leito da eternidade) ……Enfim, penso. Não!; permitam-me a correção desta afirmação inconsistente: enfim, penso pois nada sei, - pois é sabido que o pensamento sendo um mecanismo de penetrar no desconhecido, uma forma de trazer algo para a tela mental , é sinónimo de ignorância.…

elsa menoita
 
agora aqui estou eu

Já são só corpos.

 
Se quereis ser feliz, sê ignorante...e inútil. Sê espectador, como todos os profanos. Assiste, então, feliz!

Caro Darwin, sabemos ser produto de evolução, mas não seremos nós os antepassados dos símios?!

Insanos rompem a brusquidão da paz. Todas as partes constróem, moldam, prestadores de vassalagem à pátria. Pelo aperto de mãos se acorda o sofrimento de um povo. Os seus nomes assinados são os juizes da pena das gentes.

Direitos humanos proferidos, muito defendidos, espezinhados pelos tanques. Pena do vivo penar é a morte da honestidade, nesta animalesca humanidade. Salvaguardados só por quem sois, mobilizam forças inderrubáveis pelo poder do povo. Engavetaram-lhes o poder inato de questionar, de refutar.

Vai-se desfolhando o dia-a-dia, sempre agarrado a um sonho tricotando a esperança. Fuga é a possível escapatória.

Terror impele mãos à cabeça e impede que estas peguem na mala das suas vidas. Estremece pelo silêncio das armas. Tremelica! Desfere o medo no gatilho. Ensurdece pelo seu estrondo. Morte amortecida pelo milagre negado de podridão. Já são só corpos esculpidos pela dor.

Lembrança caridosa dos que sabiam que cá ficavam sobre os que não sabiam que partiam. E, já são só corpos! Passado vai sendo sepultado, varrido pelo tempo, retido nas lágrimas dos filhos da guerra. Vidas esquecidas, esvanecidas no olhar do tempo.

Já são só corpos.
 
Já são só corpos.

O silêncio de ontem não adivinhava o silêncio de hoje

 
O silêncio, para muitos o vazio acústico, para nós sempre fora significativo de divagações ruidosas para o sossego e motivo para outras muitas que nos retiraram o sono e nos levantaram da cama.

Ontem
Gritavas: cala o silêncio com a tua voz!!

Ontem
Meu companheiro nos infortúnios e entre lençóis
Querias calar o silêncio que te acordava as emoções e te trazia incomodo ao teu saber estar. O teu corpo denunciava o constrangimento que te trazia o silêncio. O silêncio era para ti inoportuno e fazia-te lembrar que estávamos calados. Estar calado era sinónimo de assunto esgotado. Parecia-te assustador e levantavas várias indagações desperdiçadas que te ocupavam o tempo útil de vida: que tradução dou ao seu silêncio? não terá interesse em mim? ou será precisamente o contrário? será revelador do seu interesse por mim? em me querer, em me ter? o silêncio trazia-te a dúvida, que em relação imatura é perturbadora da serenidade. Com o silêncio sentiste observados os teus movimentos, os teus pequenos trejeitos. O silêncio, pensavas, era a minha leitura de ti. Com o silêncio explorava-te. Darmo-nos a conhecer traz muitas vezes a insegurança, que todos carregamos, manifesta da incerteza de não gostarem de quem conheceram – todos tendemos gostar que todos gostem de nós (gregos e troianos).

Hoje
Gritas: cala-te! Deixa falar o silêncio calando a tua voz.

Hoje
Meu companheiro nos infortúnios e entre os lençóis
Já perdi as palpitações só de pensar que pensas em mim. Já perdi a inquietude sentida no estômago quando me surges. Já perdi o corar quando me tocas. Mas apanhei a tua verdade, que parte ainda tanto me seduz. Anseio perder as mudanças da tua verdade, no trilho que vais escolhendo para a tua vida. Trazes poucas caricias, mas conheces as delicias que me fazem semicerrar o olhar e soltar sons gemidos, arrastados no silêncio e outros que rasgam o próprio silêncio. O silencio, hoje, representa o aperto das nossas mãos, já não suadas, e o nosso olhar dirigido na mesma direcção para o amanhã, com uns breves desvios de olhar, meio de soslaio...para ganhar as palpitações, as inquietações transmitidas no estômago, o corar no facies...sentires que nos lembram que ainda desejamos e nos desejam.
 
O silêncio de ontem não adivinhava o silêncio de hoje

Sintomatologia da liberdade

 
Os utopistas criaram o mundo. (E não Deus!) É uma verdade da humanidade, mas uma mentira para os condenados à renúncia da liberdade.
Nos primórdios os utopistas deixaram, na prateleira mais próxima do céu, um manual para os seus discípulos. O manual seria um legado para os homens que se entregassem a si. Manual da liberdade, ainda se lê. Mas este foi queimado desde há muito - desde que surgiu a civilização. Restam umas páginas, pouco legíveis, mas só inteligíveis para os que se elevam até aos céus.

Das páginas que lemos (eu e tu, meu companheiro de denúncia às renúncias dos que se encontram confortáveis sentados à espera da liberdade), sublinhámos trechos para plagiar e divulgar aos outros companheiros. Ainda me lembro: e, aqui deixo nota do que lemos, para ti, que te queres juntar a nós.

Só somos livres quando nos deixamos flutuar entre estados inebriantes, que nos afundam na loucura. Há uma linha muito ténue entre loucura e liberdade e a fórmula para a felicidade é andar sempre com a borracha na algibeira.

Temos que partir para bem longe do servilismo da tirania moral colectiva, da consciência colectiva que nos atrela aos seus pés. Temos que partir para bem longe para não nos condenarem a sermos um não-ser. Sempre muito lutámos pela liberdade das massas, mas nunca abolimos a prisão que há em cada um de nós.

Temos que deixar de ir para bem longe e deixarmo-nos dormir. Livres são os que ao sonho se entregam e deixam acordar o que de si os outros não deixam conhecer. Quando muito se entrega, de forma exclusiva, ao pensamento, sem deixar uma réstia para o sonho, estica-se, intuitivamente, os membros superiores, não para os outros lhe colocarem as algemas mas, para ele próprio se algemar. Fugir dos sonhos é nos entregarmos aos julgares dos outros.
Ser-se livre é fugir dos outros. E, sonhar!! E amigo!, como diagnosticar a sintomatologia da liberdade: depois de te dares a permissão de sonhar, dá-te a permissão de te rires do que sonhaste!
 
Sintomatologia da liberdade

Depois de nus adivinhar cenários críveis

 
Lá fora: o silêncio sai das folhas caídas no soalhado do pátio. Lá fora: o desconhecido por agora.

Cá dentro: o relógio da sala acusa o pouco tempo que resta. É uma pressa a entrega.

Baloiço o olhar frente aos espelhos depostos de esguelha na tua sala de tudo receber...titubeio sobre o tapete num fruste tentar em me estatelar de fronte a ti... a vontade é mesmo quedar sobre ti.

Já rendida num abraço, solto o que há de nu em mim. Em postura frágil e inerte encontro-me deitada entre cetins a acariciarem-me os corpúsculos. Tocas à campainha dos meus sentidos: adormecem-me o domínio e acordam-me a lascívia. Sem eles nada fazia sentido neste pouco resto de pessoa que ambiciona a rendição do que há de devasso na concupiscência. Ofereço o meu corpo em troca de vãs caricias, de suspiros que seduzem o momento, de arrepios carregados de calor que visitam o prazer. Ofereço o meu corpo por uma vaidade da alma, que arranca a nitidez da sensatez e entrega como dádiva à estupidez.

Tudo muda depois dos tempos de quimera. Segue-se a acidez que sempre hiberna, sequiosa por explodir na facies do par. Vejo malignidade nos teus olhos, espelho dos olhos de todos nós. Não te quero mais, e não querer é poder. Há um mergulhar da tua dignidade no lodaçal do orgulho imódico que despersonalizou quem julgava conhecer. Vociferas que te resta dignidade quando o que cospes é um ciclone de estilhas pontiagudas residuais de um orgulho traído e deixas sufocar o digno que havia em ti. Tudo acaba, quando me entreguei a outros lábios, tapando os olhos à inocência. Em ânsias de tudo tornar a repetir e sentir, não sabendo que tornarei a ver os olhos de todos nós.
 
Depois de nus adivinhar cenários críveis

Deito-me no sofá

 
5 da tarde ... deito-me no sofá. abro as pernas. ergo-as. sinto-as edemaciadas, mas não o estão. coloco uma almofada sob elas. sinto os olhos indecisos em fechar, mas não me apetece dormitar- perda de tempo. mas ao estar acordada também não estou vigil. olho para o tecto falso - como muitos tectos que construímos na vida. desnorteio-me de tanto pensar que deveria em nada pensar. muitas vezes a construção em falso é tão rectificada em falso, e sempre em falso, que já não sabemos a veracidade escondida na falsidade construída. enfim!!... sinto lipotimias sucessivas estando deitada ... parece que estou etilizada em corpo letárgico. oiço ruído ... não descodifico o sentido da sonoridade. é um som- isso eu sei. parece que o oiço bem ao longe em espaço e tão perto do que fui, enquanto gente fardada. fixo o olhar até ganhar nuvens na visão. lanço o braço. quero agarrar o indefinido- sempre é mais nítido e coerente do que a realidade que defini em falso. continuo a escutar o som. assume volume, parece. o sentido de curiosidade vai-me acordando para descortinar o código que foi segredado aos viventes para saberem ler todos os sons. tento ouvir. o sentido do dever obriga-me a abrir os olhos que sempre se encontraram abertos. o coma, a que me forcei a confiar, fez-me o divórcio da realidade- a qual me queria ausentar. não queria ouvir, mas como oiço um sonido sinto que tenho que ouvir, nem que um grito. somos tão carregados de deveres, como trelas se tratassem, balizando a nossa necessidade de ausência para catarse e nos aproximarmos da liberdade. o som volve à audição incessantemente. é uma chamada. chamam por mim. oiço meu nome acompanhado por outra palavra- qual não sei. oiço sumidamente. longinquamente. o sentido soberano do dever parece que me obriga o pavilhão auricular a abrir, e descodificar o som antes sumido agora vociferado.

(...)

ah, sim estou no trabalho. oiço a chamarem por mim. precisam de mim. é uma doente que chama. e eu que me imaginava já em casa, de pernas estendidas, esticadas no sofá, a olhar para tecto, a partilhar um repouso... com os pensamentos...
 
Deito-me no sofá

nunca mais os vi...nunca mais os vi...

 
sentem-se na mesa! sim, também me sento, obrigado. estão confortáveis? sim, também estou, obrigado. inquieta. sempre inquieta, mas confortável. o ar condicionado já está desligado. deixemos a conversa banal para depois. oiçam o que vos digo: por vezes deixo de desejar-te. não sei porquê. a ti, sim! mas assim que fantasio deixar de te ter, enquanto meu objecto de desejo, passo novamente a desejar-te... e a ti ... também te desejo, mas receio que por vezes vá deixar de te desejar. também. sei-o. a ti também, sim. e logo passo a desejar-te mais a ti. sou assim. e, prontos. entendem?! por vezes quero entregar-me à descoberta dos outros, quando entregues ao seu desejo. já sabem que tento fugir deste espaço não conquistado mas pago. já sabem que gosto de sair para onde não me vejam, mas sempre com receio que me espreitem. porque estás a olhar para o tecto? não me estás a ouvir ou não me queres ouvir? doi o que te digo? preferes a mentira ou a omissão por te anestesiar? administra-se doses de mentira por cobardia de quem mente ou por pena de quem a vai escutar. não quero uma situação nem outra. a surdez não é fuga, porque a verdade acabará por cair sempre estatelada à nossa frente. a cegueira não é fuga, porque a verdade acabará sempre por entrar pelos pavilhões auriculares. portanto, ouve-me e vê-me. olha-me bem nos olhos. não desvies o olhar, por favor. a mim também me doi, porque sei que te doi. a mim doi-me porque eu nunca serei eu. não serei eu, não por ti, nem por ti. também ,talvez, mas não principalmente. eu nunca serei eu porque nunca serei feliz. se o for será sempre longe deste espaço não conquistado mas pago.

(olharam-se. levantaram-se. e nunca mais os vi. continuei sempre com o mesmo discurso para muitos. sempre findou do mesmo modo: olharam-se. levantaram-se. e nunca mais os vi).
 
nunca mais os vi...nunca mais os vi...

Quem tu és?!: és a nossa imagem

 
Sente o mundo girar!!
Há sequelas que perfuraram o ventre do mundo.
Na tua cegueira
Pensas colher o que te plantaram.
Ergues a mão
Dando mostras de que está vazia. Se os outros estão na miséria
É porque tu e os outros são a miséria humana.
Foste tu que te pariste.
E não te entregues ao doce engano.
Extremina o que fazem
Para que não sintas aquilo que és.
 
Quem tu és?!: és a nossa imagem

Palavras do silêncio

 
Serão as palavras o meu refúgio?
Será a plurisignificação das palavras o brinquedo que tenho entre os dedos?
Será que o pensar em ti me dá desalento aos ânimos, mas a loucura que preciso para soltar as palavras? Quero pensar que sim. Não penso em ti por ti, nem por mim. Penso em ti, porque me lança para o caos fraseológico, que tanto me apraz. Apraz-me conviver com a loucura que deixo viver - dá-me liberdade.
Prefiro que sejam as letras do silêncio.
Prefiro que estejam longe dos julgares que tentam calcar o juízo que quero perder.
Quero calar a palavra que ouvem.
Mas, quero exprimi-la.
É um brinde! Um brinde à vida.
 
Palavras do silêncio

Sinto-me...

 
Sinto as pálpebras cada vez mais a pesarem-me. Forço por as manter abertas. A força de gravidade contraria-me a pouca vitalidade aliada à meia vontade. Pestanejo para despertar-me os sentidos e não dispersar as sensações. Desisto. Fecho o olhar. Sinto-me.
De mãos atadas sinto a pele, parecendo que tacteio a epiderme e não sendo ela que me permite sentir o mundo com os seus receptores de merckel. Sinto as rugas periorbitais, como se de repente tivesse deixado fugir todo o colagénio e elastina de ontem para hoje. Franzo a testa. Sinto a pele endurecida nesse espaço do meu rosto, coberto com uns folículos pilosebaceos compridos, caídos, leves, negros que não me passam despercebidos ao entender o meu rosto. Sinto o ar a invadir-me entrando pelas narinas, lembrando-me que o respiro. Ar profundamente inspirável, vida acrescida, parece. Esboço um esgar, a que chamam de sorriso. Sinto-me.
 
Sinto-me...

o meio para a serenidade é o esquecimento

 
O meio para a serenidade é o esquecimento.Esquecimento do que fui, contigo, enquanto a serenidade residia em mim. Mais certa estou, pois mais certo é, de não queres fazer parte de escândalos. Não queres ser emblema em tema. Sabido é que, os escândalos dos outros soam a novidade que ocupa mentes e traz tema sem lema e com emblema. Sabido é que, os nossos escândalos nunca nos entrelaçam no encanto e espanto. Eu desejo-te ou desejo tanto este desejo (nunca soube a diferença, como sabeis!) que me disponho a escândalos. Quando junto a ti, tudo passa a pormenor. Tudo passa a resto. Nunca vos pedi a opinião, mas vocês dão-na. Não vos censuro! - também, vos ofereci em forma de opinião os meus juízos de valor. E mais injuriosa sou, pois os meus juízos repudiavam nos outros o que penso hoje em cometer. Em rol de maldizeres, nunca perguntaram pela minha versão da minha verdade. E sei o porquê. Porque a verdade, - verdade seja dita! -, é o que cada um quer que ela seja. Subjugamos a verdade ao que queremos da sua essência na nossa essência. A verdade pode ser útil. A verdade pode ser mais interessante. A verdade pode ser um bálsamo. Cada um escolhe e crê na verdade que mais se aproxima ao que deseja que ela seja e não ao que é. A verdade é que, escolhemos os geradores de verdade como os nossos mais apreciáveis verazes, mas, nem sempre verdadeiramente confiáveis. Contrassenso? - Não! É sabido da invariância da verdade, dependendo, até, de quem se quer sentenciar à injuria. Uma verdade vos digo: não sou honesta para mim, porque não sei como se faz. Serei um ser não verdadeiro, porque não o posso ser, e criei um ser postiço, longe da minha própria natureza ditosa, copiosa, e …. odiosa. Odiosa por mim própria. Mas não sei ser este meu ser de outra forma.
 
o meio para a serenidade é o esquecimento

pessoa nenhuma (reside em mim)