Poemas, frases e mensagens de Dakini

Seleção dos poemas, frases e mensagens mais populares de Dakini

Os caminhos são sempre os mesmos,
as disposições para caminhar podem ou não variar,
consoante a metas a alcançar.

Gosto de te encontrar por todos eles,
enquanto as metas se aproximam.

Muitos mas não muito

 
Caminhavam todos como se fossem muitos, mas não eram. Eram só três os que caminhavam juntos. Cumpriam uma promessa antiga, mas não se sabiam as verdadeiras intenções do prometido.

Apesar de ser já meio-dia, tinham ainda tempo para que a promessa se cumprisse. Entraram por uma rua funda e sem nome. Procuraram a tabuleta mas não a encontraram. Só um grafiti desenhado num dos muros. Era simplesmente um dedo a apontar para parte nenhuma. Olhavam-no pela esquerda e o dedo apontava para a direita. Olhavam-no pela direita e o dedo apontava para a esquerda.

Encostavam-se à parede e o mesmo dedo apontava em frente. Olhavam-no de frente, mas o dedo indicava-lhes que teriam que furar o muro e ir numa autêntica aventura. Olharam-se nos olhos a procurar respostas. Ninguém conseguia decifrar aquele enigma, bem no coração da cidade.

Eis que chega outro grupo silencioso. Olharam o grafiti de ambos os lados, e logo decidiram o que fazer. Foram buscar um balde de tinta preta, com a qual pintaram toda a zona do grafiti. Desenharam de novo o dedo a apontar em frente. Foi por ali que seguiram. O primeiro grupo não vai de modas, segui-os em silêncio. Estão agora todos juntos. Passaram a primeira rotunda. Encontram-se agora numa rua sem saída. Ao fundo, o rosto do grafiti dono da mão que eles limparam, ia cobrar-lhes outra promessa.

Estavam então num labirinto de sentidos. Sentiam-se todos juntos, mas não estavam todos juntos. Iria começar a desordem, quando definissem novos sentidos obrigatórios.

Dakini
 
Muitos mas não muito

Vibrações

 
Há uma utopia
A rasgar cada folha de papel em branco
Sempre que se presta a parir as palavras
E as coloca na posição fetal
Acabadas nas míseras sobras
Do parir em nome da dor
Ao coabitar à mesma mesa
Onde se bebe um licor doce
E se proclama chama acesa
Coloridamente alucinada

Dar á luz é partir rumo à aventura
Por sítios onde mora gente
Onde os sorrisos são fartos
E os partos são em nome do amor
Ao sentir nas contracções
Do baixo vente
Vibração em sangue quente

Poema inspirado neste de Haeremai
http://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=145865
 
Vibrações

Entre a luz e a sombra

 
Nascia um silêncio na catedral
pálido
triste
foragido
por entre bordados a ouro
de um sol tardio

Pintava as paredes de um negro
nunca antes visto

Acontecera um surto nas linhas cruzadas
que lhe permitia
ser o que era
para o bem e para o mal

Ouvia-se agora um ruído nas vozes
frouxas
caladas
sufocadas

Estilhaçou-se o silêncio
na catedral. Um holocausto sobrevivia
entre a luz e a sombra
assim como
um dos eventos se intrometia
entre o mal e bem

Dakini 2014
 
Entre a luz e a sombra

Novo movimento estrelar

 
Libertem as mãos e os pés
E terão mais do que um punhado de terra
Em todos os baluartes do templo
Anulem todos os claustros
Onde descansam os olhos
E verão quantos manifestos
Se preparam para seguir viagem

Caminhando se faz leve o corpo
Levitando se faz breve o pensamento
E a saber destas e doutras formas
Estará a nova estirpe dos eremitas
A apalpar o ar
Esperando que lhes caia
Um novo movimento estrelar
 
Novo movimento estrelar

Mulheres de Areia

 
havia rostos caídos
moldados por um simples grão de areia
apartado do sol

formaram-se rebeliões
e vieram de ondas revoltas:
marinheiras
e
costumeiras da vida
no fundo do mar

mulheres de areia
que deixaram vazias
as mãos de Prometeu
castigo de Deus
porque renegaram
e maldisseram o céu

assim se fizeram nas dunas
porque o mar lhes aconteceu
 
Mulheres de Areia

Moinhos de Vento

 
Moinhos de vento

Diz-me
como ouvir o prenúncio
da última idade
como se apanham as cerejas
como se comem as amoras
como se lavra a terra
se regam os campos
e
se mondam as searas

Aconteceu-me um tempo
que me arrasta
lá para os lados
onde me esperam
todos os moinhos de vento

Do livro "Uivam os Lobos" de Dakini, pseudónimo de Dolores Marques
 
Moinhos de Vento

Marinheiro de água doce

 
Caiu mesmo no centro, no seu centro. Sabia que assim seria, desde que se afundou na última onda que lhe alagou o corpo todo. Mas cuidado não teve, porque os prantos de que sofriam os músculos da sua face, eram medidos pela corrente do rio, onde deitado, sofria dos males do espírito.

Sempre assim foi, e agora depois de todos os habituais encontros, entregou-se de corpo feito e mente aberta aos novos marinheiros que lhe cavaram a cova bem no fundo do mar. A cova que o recebe, é sempre lubrificada pelo lodo que envolve outros corpos largados ao acaso. Esses perderam todo o direito a ocupar o espaço que só àquele corpo pertence.
E assim navega por entre as marés, onde as correntes o seguem e o levam a bom porto. Há um rio pronto para o receber, assim ele queira ser marinheiro de água doce, ao invés de corrente contra a corrente.
 
Marinheiro de água doce

Terra prometida

 
Os amigos recebiam-na sempre de braços abertos, mas ela como se fechava para a vida, esticava-lhes um beijo assim ao de leve, só a roçar uma pontinha de pele. Olhava em seu redor, com os olhos esbugalhados e o seu ar extasiado, como se tivesse entrado num outro mundo.

Ali era o último encontro daquela raça, para que todos se olhassem bem e imprimissem as imagens que nunca mais iriam ter na frente dos seus olhos. Seria o dia da última sagração dos homens na terra, que ainda se encontrava revoltada pelos bicos de ferro e pelas foices afiadas, que cortaram a eito todas as raízes que mantinham ainda a forma erguida para a última colheita. Tinham chegado ao ponto de encontro e todos se mantiveram de pé até chegarem os últimos pregadores da demanda que os iria levar à terra prometida. Aquela já não lhes servia para nada, depois da decadência e do desmazelo a que todos se habituaram. O sol já não lhes aparecia com as mesmas cores durante o dia, a noite era um círculo fechado aos reflexos da lua, as estrelas apagaram-se quando da sentença do ultimo comité de naves que sobrevoaram os céus. Os mares evadiram-se até à linha do horizonte, tinham já naufragado todas as embarcações que transportavam novas espécies para a sua colonização e o azul do céu, diluiu-se perante as cores do novo arco íris.

Ali se sentaram de pernas cruzadas e de mãos dadas em jeito de ritual, unindo esforços para que todos fossem uma única força que os levasse ao destino que estava prestes a deixar-se seduzir pelas novas agitações da nova era.
 
Terra prometida

XXV

 
Nasceu
uma nova
síndrome
do sorriso
fácil
desde
que começou
a pintar
os dias
com as pontas
dos dedos

Caiu azul
sobre o seu
rosto
e ali ficou
cerrando
as pálpebras
até conseguir
abrir os olhos
e pintar
com novas
cores
um sorriso
acabado
de nascer

Dakini
 
XXV

Deformações

 
Lamento a fraca orientação dos meus olhos
a má formação dos meus dedos
e todo este composto orgânico
onde apoio o corpo
e desorganizo o espaço
 
Deformações

Sombra

 
Quando
o dia
se esconde
nos meus
olhos
e a noite
se fecha
na minha
boca
uma luz
intermitente
sustenta
a sombra
colada
ao grafiti
da parede

Dakini
 
Sombra

Proclamação vs Redenção

 
Sorri sem mágoa
sorri e não sejas
um sorriso forçado
a cair no sobrado
pela mágoa que corrói
negra
como é a fome
de alguns…

olhos de água
esbatidos nas
novas correntes
que se acabam
nas muralhas
e se sentem felizes
por estarem perto
e não longe
por serem donos
de um crer
em todos os Santos
que aos domingos
dançam nas igrejas)

sorri sem mágoa
que a tristeza
é dona e senhora
de quem conta
com os dedos todos
as contas
de um rosário
pendurado
nas mãos de Cristo

sorri que o mundo
caiu em desgraça
e jaz agora na praça
onde todos os poetas
clamam por mais dores
para se adornarem
os andores

Dakini-2013
 
Proclamação vs Redenção

Almas

 
Persegue-me
um instante
no teu corpo
o dia nasceu
faz pouco
tempo
e a noite
chega sempre
a tempo
de me ir
embora

Um portal
semiaberto
ao tempo
parado
nos nossos
olhos
espera-nos
do lado
de lá

O caminho
é longo
nas incertezas
continuemos
pois:
eu, Alma
em Ti
Tu, Alma
em mim
a beber
da fonte
de todas
as vontades
a clara nudez
de uma lágrima

Dakini
 
Almas

Fala-me de ti

 
 
Fala-me de ti
desse lugar inócuo

Dá-me da madrugada
o que é a tua voz
e diz-me dum sítio
dum lugar incerto
mas dum tempo certo
onde me esconder

Fala-me de ti
só hoje
para que mais logo
me apeteça
cair na boca
do lobo

Do livro "UIVAM OS LOBOS" Dakini
 
Fala-me de ti

Dois em um

 
Imaginava-o um animal racional. Imaginava-o assim… liberto com uma luz refletora, que se alimentasse só e simplesmente por esse canal libertador.

(Era um tempo em que os animais se procriavam sem se tocarem uns nos outros)

Que falta de imaginação a minha!
Onde poderia acontecer uma coisa destas, senão na minha imaginação irracional! Revolvi as ideias e pensei para mim própria, que não vale de nada ter ideias desusadas.
Inférteis e desnaturadas, as ideias chegam bem acomodadas num cabaz da Páscoa ou do Natal. Assemelham-se aos coelhinhos, que de bocas cerradas, deixam antever os primeiros dentes da frente. Sorriem mesmo com a boca fechada.

Mas, de que lhes vale? Não passam de sorrisos de plástico, trabalhados umas quantas vezes ao espelho.
Agora, dando luz e cor à imaginação gratuita por entre sorrisos e outras coisas…mas todas elas genuínas, se vão declamando alguns poemas, fruto de uma ordem inversa ao movimento dos ponteiros do relógio.

Caem às vezes no nosso caminho, desgovernadas, as horas em que o movimento racional irrompe pela lógica do dois em um.

Dakini
 
Dois em um

...tinha fome

 
Se soubessem como ficaram os meus olhos, de tanto tentarem absorver todas as letras
que queriam à força formar palavras para acasalarem mesmo ali à frente do meu nariz

Fiquei sem nariz!

Olhei em volta e só via gente, gente que se queria alimentar. Mordi-me toda, rui as unhas,
depois chupei a carne dos dedos ainda tenra. Fiquei com a boca cheia de vermes que de tanto tentarem afastar a mistura de compostos orgânicos, perderam-se neles

Mordi-me toda. Se soubessem como ficou a minha boca depois de tudo o que saiu das pontas dos meus dedos

Mas eu tinha fome, muita fome antes de chegar.
 
...tinha fome

Linguagem do amor

 
No tumulto dos olhos
revoltam-se
os olhares torturados
pela ausência
de cor

No alvoroço da noite
abrem-se os lábios
à nova torrente
escancarando
a dor

Esbeltas são
as lágrimas
que se afogam
na linguagem
do amor

Dakini
 
Linguagem do amor

Orvalhos

 
As cores que brotam
Dos reflexos dos meus olhos
Distam dos rios e dos mares

São sussurros quentes
Orvalhadas matinais
E um sorriso caído
Nas pétalas brancas
Onde os meus olhos
Se escondem
E remedeiam as dores
De um parto antigo
 
Orvalhos

O infinito é mesmo ali

 
Penso no momento de há pouco, em que acordei com os olhos pregados no tecto e pensei cá para mim; hoje é um dia para viver, ou para esquecer. Entrei no duche e com a água a escorrer-me pelas fuças, dei comigo de olhos fechados.

Novamente a fechá-los, para que o dia adormeça num silêncio molhado. Rodei a cabeça, formando um círculo, e voltei a rodar para o lado contrário, e ali estava desenhado um símbolo que me iria levar pelo dia fora, rumo ao centro onde se cruzam dois círculos. O infinito é mesmo ali, à distância de uma rotação bilateral, e eu aqui de olhos fechados, agora que terminei de rodar a cabeça formando um círculo e logo outro no sentido contrário.

Pensei: Devo estar a sonhar, ou o que é isto agora? Terão colocado algum composto químico na água durante a noite?

A saber destas e de outras simetrias que se vêem de olhos fechados no duche, está um corpo que salta com os pés encharcados e se firma no chão que o há-de suportar durante o dia.

Pensando bem, preferia ainda mantê-lo na posição horizontal. Estou fechada e trancada por dentro e o movimento da rua é um composto de várias formas a rodar em sentido contrário. Para não cair em desuso logo à noite vou dormir encostada à parede.
 
O infinito é mesmo ali

Suou a sua voz

 
Suou a sua voz
e rasgou todos
os ventos tardios
mas não sabia de nada
que o fizesse recolher
os movimentos ciclónicos
à volta do círculo
traçado pelos seus olhos

Afrouxou porque se calou a voz
do corpo
e não sentiu a poluição no ar
que respirava

Deixou-se levar pela manhã
até que o noite a viesse buscar

Dakini
 
Suou a sua voz

Maria Al-Mar
Enquanto Mulher


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