Para onde ides, Poeta?

Data 21/06/2007 14:51:19 | Tópico: Poemas -> Sombrios

Poeta, o que pensais de mim
Que de tão pouco ser me apronto a ser
Mapa de cobra, um sorriso que sobra
Sem um outro para o ver?

Poeta, onde procuro os vales e o cheiro da terra,
A verdade que ela encerra
E os sons dos mistérios que me pronunciam a alma?

Dai-me os silêncios e as vidas que eles poupam,
Tirai-me as velas, sinais em que eles se arroupam
E mostrai-me Deus nos arrepios das palavras!

Poeta…

Onde estais senão dentro de um corpo
E fora dele em cima da pele onde o mel das abelhas
É troco do suplício em que meus artifícios voam
Enquanto o vento é a vontade do meu instinto?

Onde estais quando os rios são só rios
Quando o quente é só o sol ausente
E o que sorrio a tempestade gelada
Amparada pelo âmago friorento?

Poeta, onde estais quando a esperança é fogo sem lume,
Quando a dor não se vê nas feridas
Ou quando a nuvem é só uma mancha no céu?

Onde estais senão em mim
Que não o encontro nem nas vísceras nem nos escombros
Onde um dia encontrei um peixe azul?

Poeta…

Porque sois quem sois quando um corpo não o suporta,
Quando a porta cai pelo próprio peso dos sons
Que do silêncio descem, ficando eu nu?

Onde ficais quando o toque é morte
E a sombra a sorte dos demais que habitam
Ruas que me cruzam, psicologias que me fitam?

Poeta…

O vosso beijo é um cortejo que ferve flores que em mim embalam,
Tambores de fogo que em mim estalam,
Neblina que me eterniza o sonho…

Do amanhã que é um misto de emoções cobardes,
Um grito que em mim arde,
Um rito cujo esconderijo é mito do absurdo,
Onde vos procuro na luz e invejo na cruz
E pergunto:

“Para onde ides poeta?”.



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