O burro...

Data 30/10/2009 12:08:37 | Tópico: Poemas -> Reflexão

A saltitar de flor em flor
chegou o burro comendo palha,
pousou as patas na erva fresca do quintal
e zurrou para a casa do seu dono.
De dentro sai-lhe o dito dono
com uma cenoura nas mãos
para lhe atirar ao focinho.
O burro, com a boca toda cheia, logo disse,
Primeiro dás-me palha
e depois é que vens com a cenoura,
como se eu fosse coelho por andar de flor em flor,
nem os coelhos fazem isso.
Vai mas é dar a cenoura ao coelho na toca.

À noite, o sol para aí já no quarto sono
e a lua a derramar a insonolência cá p'ra baixo,
o burro continuava a sonhar acordado,
Um dia ainda vou ter uma profissão decente.
Que lindo luar!
Depois deitou-se no meio das flores
para dormir perfumado.

Já de dia, o sol a meio nascer,
vai o burro e levanta-se e fica à espera do dono,
com uma pergunta entalada entre a língua e os dentes.
O dono lá aparece e de que maneira,
assobiando em alto som o seu contentamento,
e o burro despacha,
Hoje posso ser eu a montar em cima de ti?
Para quê?
Para saber o que é ser homem...
Achas-me com cara de burro?
Com cara não diria, mas talvez com cérebro...
O quê?! Que burro tão estúpido! É melhor arranjar antes um cão.
Para que queres o cão? Só se for para te cagar
à entrada da porta.
O homem, todo desaustinado, pega e pisoteia o floral.
Deste-me cabo das flores!
agora é a vez dos teus tomates...
Nem te atrevas!
Olha, sabes que mais? Vai à merda!
E o burro larga-lhe mesmo aos pés valentes dejectos,
e desata a correr, a correr
até chegar ao outro lado do mundo,
onde seria muito feliz a engraxar sapatos com a língua...


Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=104987