AO SEGUNDO OLHAR

Data 01/12/2009 22:07:43 | Tópico: Poemas

Não te podia ver à minha frente! Literalmente. Entravas no café da minha irmã e eu evaporava entre as cortinas da cozinha. Arghhh! Sempre tão simpático, tão cordato, de gargalhada sonora pronta a estalar. “Mas tu estás feita estúpida ou quê? O tipo é fantástico, muito mais afável que muitos badamecos que entram por aqui dentro com ares de dono do tasco!”. Mas não te via assim dessa forma tão ligeira e dançante como a minha irmã… Não, eu fugia para não ter sequer que te servir um café, e odiava o cheiro do teu perfume no ar a anunciar a tua chegada. Sempre tão afável: “Menina isto, menina aquilo….” Sentia uma espécie de urticária que me percorria o corpo, e largava um esgar de aversão sempre que a tua imagem me surgia… Convencidote!
Num dia de futebol europeu, em que o Boavista recebeu uma equipa irlandesa, um Celtic qualquer-coisa, foi a loucura total no café. Quando cheguei da Faculdade (sim, é que curiosamente eu ia todos os dias ao café ao final da tarde…), fiquei assombrada com a obesidade alcoólica da invasão irlandesa! Do outro lado da rua, os clientes habituais acenavam sorrisos de “Aturem-nos!”, e a minha irmã perdia-se entre servir e contar cervejas.
E quem é que estava todo divertido ao balcão a cantar e a beber no meio deles??? A tua insuportável figura, claro! E aí não tive escapatória, fino para aqui, caneca para acolá dei comigo a circular à tua frente de um lado para o outro. Karma! E tu a mirares-me…
Até que a determinada altura, numa pequena cantoria a malta que estava ao balcão sofreu um arrastão e oiço um fulano todo barraqueiro: ”be carefull my friend i’m drinking”! Então não pude mais: desatei a rir, olhei-te e finalmente encarei-te enquanto bebias languidamente. Vi-te. Senti-me penetrada e aconchegada, sim, sobretudo aconchegada, pelo olhar com que me abraçavas. Nunca uns olhos azuis me pareceram tão bonitos nem tão cristalinos. Nunca um olhar me fez o coração pular pela boca. Nunca pensei que um clique me electrizasse e sim, o amor à primeira vista (vá, ao segundo olhar) acontece. Foi há onze anos. Ou será onze minutos?



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