
COMO AS PEDRAS
Data 27/01/2010 05:07:51 | Tópico: Poemas -> Introspecção
| Caminho sobre laminadas pedras Que esquartejam os pés quando passo (Nem jibóias sobre elas rastejam…!) Lanço ao vento um grito penetrante! Proíbem-me a passagem… Acusam-me de ser um falso caminhante!
Oh dor de quem pare um filho na sarjeta Com a agonia da morte na garganta! Dor de quem vive amortalhado Nas solitárias prisões do ego E morre aos poucos de saudade Pelo mundo que de tão preciso rejeita! Dor cruel! Lástima de dor!!! Dilui os suspiros do prazer passado Nos sangue que fermenta nestas pedras!
Porque me recusais?! Pedras soltas! Moribundas! Vãs! Presas para sempre à terra que vos sepulta Como “coisas” sem valor nem objectivos! Torturai-vos por não saberdes viver! Vós que viveis sem vitórias nem razões! Porque me recusais?! Porque me atirais com o vento que vos desgasta Sacudis o meu sangue de sobre vós Vomitais a minha carne como se fosse lepra?!
Morra para sempre o deus que pariu estas pedras!!! Apague-se do tempo a memória que as calcinou! Seque a água persistente que as laminou!
Sem vontade Atiro-me a vós e morro temporariamente de viver…. Oh lógica da ilógica! Ventura da desventura! Quero ter o prazer de morrer sobre elas Lambuzar-me no meu próprio sangue Até me fundir num único organismo! Quero ser como elas!
Quero apertar as raízes das flores Estrangular os caules e as pétalas! Quero pisar a fresca e verde erva Até à hemorragia da seiva! Quero semear a discórdia No cimo dos galhos das árvores! Quero cobrir de areia escura e fétida As terras barrentas até à esterilidade!
Seja como elas! A maldade será abortada das minhas entranhas Como um louco que recusa um gesto de carinho Morre aos poucos de frio e solidão E aproveita da vida a revolta contra tudo!
António Casado 27 Junho 1974 Revisto para o Luso Poemas
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