Encostado no corrimão da minha paciência sustenho o ar num acervo de agonia no passo que me recuso a dar ao degrau seguinte, preso por uma linha imaginária que se prende entre o ascendente e o descendente nunca sei qual o degrau que piso, não sei se subo, se desço, se fico, se vou… abro a gaveta da memória, aquela bafienta onde arrumo o que não gosto e num pressuposto absoluto de limpeza sopro o pó remanescente que emerge no ar e aproveito para enfiar na narina, na tentativa de me etilizar no estado sereno da insensibilidade necessária para abordar o que ali arrumei, de tempos que não quero recordar, aos quais não quero voltar. Estufo o peito num abafado de vinha de alhos e dou o passo na direcção do degrau que se precipita no abismo que me atormenta os sonhos de quando em vez, caio… caio… E o fundo nunca aparece… Sempre a cair, numa queda sem fim, acordo nesse terror de uma queda abrupta no infinito e alvoraçado como um bote de borracha que se esbate com as marés, rompo a quilha na aresta de rocha e vagueio no ar feito balão que se esvazia e vai batendo pelas esquinas até cair inerte no chão do meu desolamento. Nesse acordar onde não distingo a razão da minha insanidade as pálpebras recusam-se a abrir, o corpo não me obedece, sei que acordei, mas o meu corpo não sabe, como companhia tenho o silencio e a negritude a que o meu corpo me condena na insanável recusa de olhar. Já não sou rio que rompe margens, não sou mar de águas amenas que te vai beijar, sou assim uma espécie de regato que se estiola nos rigores do estio e mirra seco nas brechas das montanhas que me emparedam. Vejo-me agora de cima com um sorriso cínico, eu vejo mas o meu corpo não sabe
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