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Data 11/03/2010 00:28:16 | Tópico: Textos





era a rua que o descia, quase sempre à mesma hora - dez para as dez, e as pernas grandes que tinha iam lentamente dissolvendo o asfalto. os braços trazia-os em nó cego atrás das costas, presos os dez dedos, cinco contra cinco, dois punhos. a cabeça pendia-lhe do pescoço, queixo caído no peito, língua de fora. assim o via estático e mudo, à espera que, na circular do coração, alguém o chamasse de amor. assim ficava até às dez em ponto, depois era a rua que o cruzava ao meio. foi a rua que o criou, na rua cresceu, à rua fez filhos - dois passeios e seis plátanos, na rua ia perdendo o corpo. quando o conheci tinha quatro pernas e zero braços, agora tem dois braços e duas pernas, quando o conheci tinha duas bocas e um olho, agora tem zero bocas e dois olhos. nasceu com o rabo virado para a lua, hoje é a cabeça que por lá anda.











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