Requiem

Data 24/03/2010 23:47:57 | Tópico: Crónicas


Lembraste, quando atravessávamos o Largo da Santana, em frente à capela de São José, dava-te a mão, eu miúdo tu homem, dizias-me que um homem nunca dá a mão a outro na tua tentativa de me amadurecer? Lembraste quando me dizias que um homem nunca chora na tentativa infrutífera de me calar as lágrimas por um qualquer infortúnio com que a vida me rasteirava?
Eu nunca quis ser homem perante ti, quis sempre ser o garotinho de cabelos ao vento que corria para ti quando saías do autocarro que te trazia do Porto, abraçar-te e fazer de conta que nesse serão me sentaria no teu colo e me velarias o sono. Que nesse dia tu ias estar lá para mim na mesma medida da ansiedade do meu abraço por ti, que se recolhia na espera de uma semana de saudade, só mitigada pela hora em que saías do autocarro da Pacense que era o nosso veiculo de encontro.
Quisera eu inventar outros veículos, quisera eu amar-te e honrar-te numa ambição desmedida de te agradar. Muitas vezes senti que falhei nesse propósito, muitas vezes senti que falhamos como pai e filho. Na hora em que te tinha não me vinham à lembrança os momentos felizes que vivi contigo, nas horas de maior ardor nem de um me recordava, mas neste momento meu Pai, não me lembro de uma única hora de dor.
Um dia havemos de falar sobre isto, eu acredito que sim, e então serei de novo o teu menino, a minha alma ficará em paz, como eu desejo e sei que a tua está, meu Pai sempre amado.




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