A culpa é do Bilinho

Data 25/03/2010 18:38:37 | Tópico: Crónicas


Estou triste. A Tatiana ligou-me a dizer que esta noite não ia haver nada p’ra ninguém. E eu, que toda a noite sonhara com o filme sobre o que podia acontecer entre nós dois, sobretudo no sofá que, segundo ela, veio lá das índias. O meu pensamento perdeu a cápsula, assim que ela me disse: ó pá, infelizmente não me dás boas energias. Ouvido isto, foi possível detectar a milhas um fumo negro a sair-me das orelhas.
É que ela nem deixou concretizar o meu mas…, desligou de imediato, causando uma febre mitológica algures no peito. Energia??, não lhe dou energia??

Fiquei logo com o caralho do dia estragado. Afinal de contas a Tatiana é uma preciosidade, uma preta que mexe bem as ancas e com muita sabedoria para assuntos de astrologia, ao qual eu, jorginho para as amigas, me predispunho a ouvi-la em troca de uns vinte minutos de carícias pela espinal medula.

Levantei-me abstracto da cama, com uma pasmaceira filha da puta, como se acordasse no meio de um estádio de futebol com as equipas em jogo. Eu ali, indefeso e nu, na minha cama napoleónica. Simplesmente horrível. Nem é bom pensar.

O Bilinho ligou-me a contar umas coisas que eu não entendi puto. Dava a sensação que estava a perder a virgindade e a tentar relatar o acto em austro-húngaro. Disse-lhe: Bilinho mantém-te calmo. Olha, o melhor é passares aqui em casa. Ok, respondeu, num tom de asma.

Enquanto esperava que ele viesse, levantei-me da cama, vi no espelho que continuo a mesma merda, vesti a minha jaqueta preferida, fiz umas torradas e aqueci um leitinho para não ter que gastar guito na rua.
Afinal de contas, a vida está ruim, para não dizer f*.
Soube pela televisão que o cabrão do meu ex-patrão falecera de traqueotomia ou lá como se chama.
Nunca uma morte me saiu tão cara. Foram trezentos e tais euros que não deram à costa e foram pró caraças. Ainda pensei ir ao funeral cuspir na campa dele mas, nesse segundo, o Bilinho bateu à porta. Mandei-o entrar, enquanto eu, na casa de banho, metia a rodilha da camisa para dentro das calças e dava umas sapatadas no rosto como quem diz, vamos à vida!

Na sala espantei-me ver o Bilinho com duas mulas bem-parecidas. Quem diria que aquele branquelas de sessenta quilos era capaz de uma proeza destas. Apresentou-mas. A Joana, cabeleireira, e a Ruth, fisioterapeuta.
Da minha boca irónica escapou-se: pois, pois. Contai-me coisas, disse-lhes, ao mesmo tempo que apontava para o sofá para elas se porem à vontade.
O Bilinho friccionava as mãos num contentamento que eu sei lá. Já eu, mordia a mosca que deixei crescer no lábio inferior.

Mandei-as falar abertamente.
Elas começaram a dissertar sobre o amor que as une. Uau!, o assunto começou a interessar. Depois disseram que queriam dar à luz um filho, cada uma. E que precisavam de dois voluntários. Mas que obedeçam a determinados parágrafos. Como assim?, perguntei-lhes. Têm de ser homens fortes e inteligentes!
O Bilinho de pronto se ofereceu, dizendo que tem uma pós em artes modernas. Só que os seus sessentas quilos não as fizeram convencer. Talvez a ideia fosse de eu fazer o caldinho às duas, sei lá. Fiz-me de difícil. Afinal de contas não é todos os dias que alguém faz dois filhos de uma assentada só. Começaram a dizer que a vida vai mal e, coisa e tal e tal e coisa, acabei ficando em pele-de-galinha.
Bem, vocês conhecem-me, né, não posso ver ninguém a passar mal, quanto mais duas relíquias daquelas tão guapas.
Mal dei o ok, vocês haviam de ver, as moças sorriram como verdadeiras puras donzelas.

Já sem mais para quê, em câmara lenta, despi o casaco, desapertei os primeiros botões da camisa, depois o das calças, o Bilinho expectante de alguma coisa que lhe sobre, quando, bem pertinho delas, de lhes trespassar este meu chilreio de macho, tanto a Joana como a Ruth, ora foda-se, espetaram-me com dois frasquinhos nas mãos que iam para agarrar mas nada agarraram a não ser os frasquinhos que, segundo elas, bastaria um pouco menos de metade.

Bolas!, na hora fiquei obtuso mas, como homem de pulso que sou, peguei numa revista de carros e fui para o quarto fazer o serviço. Enquanto isso, o Bilinho fazia as hostes da casa servindo-lhes um chá afrodisíaco e contando-lhes ao ouvido a versão adulta do capuchinho vermelho. Meia hora depois, saí da porta com os dois frasquinhos em punho, e disse: Habbemos Papa(i)!



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