ALGO DE INATINGÍVEL
As pessoas são solitárias porque constroem paredes em vez de pontes.
(Joseph F. Newton)
A Inês foi acabar os estudos em Coimbra, aos 19 anos. Opção que ela tomou com determinação, coisa que a mim me faltava aos 30. Acho que sempre me faltou por diversas razões que atravessaram a minha vida como espadas afiadas espetadas na alma. Essa mesma alma que me pedia palavras escritas germinadas em poemas inacabados onde o pensamento se escondia em dias cinzentos feitos de esperas numa tela que ia perdendo a cor. E eu acomodava-me na amizade preciosa da Inês, nos meus filhos ou sozinha, naquele canto acolhedor, onde me nasciam sílabas da solidão que me estrangulava as forças e a dignidade.
Algo de inatingível Violou-te o corpo Beijou-te as faces Mordeu-te os seios Penetrou-te os sentidos Rasgou-te a carne Dividiu-te a alma Sacudiu-te o sangue…
Espantou-te o olhar E fechou-te o sorriso!
O que é que restou de ti? Faltavam duas semanas para o Eduardo chegar de um lugar que ficava, algures, do outro lado do mundo. Eu pensava que nunca teria a força nem a coragem para terminar com uma vida de tristeza ancorada na desilusão, onde a cada chegada eu permitia-me acreditar, uma vez mais, no impensável. Deitei-me no sofá enrolando uma madeixa de cabelo por entre os dedos, pensando até quando iria aguentar um casamento empoleirado em infidelidades, ciúmes, violência verbal e física, e sei lá o que mais. O Eduardo era aquele tipo de cavaleiro andante idealizado pela minha paixão adolescente e teimosa e, com certeza, o mais pusilânime quando o consegui ver apeado do cavalo.
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