INFINITA PACIÊNCIA DO TEMPO
Data 29/05/2010 19:59:07 | Tópico: Poemas
| Não sei de onde vim, nem o que sou por detrás desta máscara de terra batida, pálido reflexo de anjo adormecido no silêncio de um areal de trevas. Sei apenas que vim de longe, dos remotos desertos da existência e da poeira moribunda dos séculos, como um peregrino sem norte na solitária busca de uma miragem para lá dos horizontes de janelas interrompidas.
Nos meus braços enredam-se sonhos mortos e uma teia de abismos encadeados, e tudo parece tão anestesiado e distante neste turvo cenário de labirintos cruzados e decadentes enigmas sem solução, onde, fria e ondulante, se espraia a mordaça da solidão.
Sem revelar minha identidade, sigo o apelo sufocante dos sentidos no dobrar decrépito de sinos distantes, sempre a fugir do naufrágio e do sombrio perímetro do gelo, iludindo o peso ancestral dos mitos e a precoce morte das manhãs.
Sem poder voar, atravesso a nado os penhascos da dor, visto-me de dissimuladas aspirações e me escondo na aparência gélida das estátuas, forjando escudos de alento no seio da mentira que me cerca, em busca de dias melhores.
Digerindo o fúnebre veneno destes dias e as carícias melancólicas do gelo no vidro polido do meu rosto, enterro meus segredos no bojo do areal, desato os nós ensebados da indiferença, e finjo sofrer da mesma alucinação colectiva que tolhe os ossos paralisados dos espantalhos.
Só não consigo iludir a infinita paciência do tempo.
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