a janela.

Data 11/06/2010 12:29:37 | Tópico: Textos










a janela estava no lugar de sempre, imposta à parede como um buraco no céu. dentro dela o rosto a pender-lhe para baixo, como uma gota ou uma lágrima que cai. deste lado da observação um indivíduo baixa a cabeça e perde a janela. eu limito-me a observar, foi para isso que me meteram dentro do texto. a janela tinha sido a casa de um outro rosto, que ali passava os dias a chorar uma vida que tinha desaparecido. porque os corpos que desaparecem são mais dificeis de esquecer. eu desconhecia a história deste outro rosto até que o corpo que o havia observado partir mo contou. era o rosto desse corpo que agora ali estava a pender-se na janela, que é neste entretanto a personagem principal. o meu gosto por janelas já tem alguns anos, começou sensivelmente quando vi um corpo cair de uma, corria o ano de mil novecentos e oitenta e sete. vi o corpo de uma criança acabada de nascer cair pela janela do sexto andar do prédio que então observava. um prédio velho, dos que nos contam histórias da cidade inteira. um prédio alto com vista para o mar e para as ilhas. mas esta janela é particularmente interessante. não tem cortinas, permanece aberta, por vezes os vidros abanam com o vento, está pousada numa parede de um branco-sujo questionável e dói-me. é sobretudo por me doer que ainda a obervo. o meu gosto pela dor já tem alguns anos, começou sensivelmente quando vi um corpo cair de uma janela, corria o ano de mil novecentos e oitenta e sete.








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