bicho raro

Data 04/10/2010 14:05:42 | Tópico: Poemas

"TERMOS DE COMPARAÇÃO",Zulmira Ribeiro Tavares

"(...)
A avestruz é um bicho-raro.
O poeta uma ávis-trote.
(...)"
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de lado nenhum:

ângulo recto da boca suja

-palavra desmaiada e nua.

mordem línguas
os dentes brancos
e o que nos urja
o que nos surja
aos olhos
doentes
distorcidos,
de-mentes,
francos.

as aves,por amarelas que sejam,
dizem,
não têm dentes,
na sua enorme ,pequena,estranha
lucidez mentida.

a flacidez das penas na saída,
sem saída pairam.

vida sem vida
voa ,à toa
em asas inúteis de avestruz.

tempestade,ciclone,clarão

escuro.

não pertencer,ser tudo
o que seduz,

porque seduz.

lastros e rastos tão gastos
de se ver (in)clara-mente

e ninguém dizer
finalmente
por outras tantas palavras

cabras verdades

castas
dos intuitos
que não têm.

explodem

macabras

as vias
da expressão .

torrente de sangue,
afluxo
ao corpo inexistente

que se espalha.

se há já o gesto

o olhar

o navio

o mar

o fio

porquê o poeta, então?

espanta-se ele mesmo em espanto
dos que se espantam em vê-lo

espanta-se tanto,

sem se espantar porém
ao escrevê-lo,
se o é.

sê-lo
em aves que não comem,saltam,
quebram braços,recusam.

plumas saídas dos dedos
onde nem os há,
nas aves.

caves

cabeça escondida,

mas não em buracos na terra,

em espaços.

e na boca a pá:

dura escava

fere,berra,retira

impensáveis danos
improváveis anos de vida

ída,
presente,
sentida
sequer havida

em aparência.

e depois do muro
a correria da viagem

os outros nomes das coisas
as incontornáveis escolhas
a potência que dita
a saca rolhas
as fluentes
obrigatórias
lentes.

as oratórias.

tudo come a avestruz.

nada, o poeta.

e no entanto,

nada recusa
a não ser comer
o que lhe dão
em pré-formato.

está mudo

quem o acusa
quem o escusa
quem o estuda
quem o não lê
quem o abusa
quem o não vê

e porquê?
parece claro:

a aves-truz
é um bicho raro
que o poeta

qual ávis-trote

segue.



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