Queres ser minha mãe?

Data 01/09/2007 15:46:34 | Tópico: Textos

Num daqueles dias em que nos entregamos à companhia do silêncio, ao sorriso do sol e ao banco do jardim como confidente, observei um grupo de jovens. Havia algo de diferente neles, cantavam, corriam, gritavam como os outros… mas o olhar era triste… muito triste… Estavam limpos mas pouco cuidados, abraçavam-se a medo ao olhar atento de uma educadora… Talvez jovens de uma escola, pensei… Deixei-me ficar ali a olhar como se eu mesma não existisse… Mas eles, atentos, iam-se chegando a mim… Até que um sentou-se a meu lado, fitou-me com uns olhos muito esbugalhados e perguntou o meu nome… Vanda respondi. Vanda??? (gargalhadas) nunca ouvi…
Isso é algum nome?... foi então que percebi que aqueles jovens de olhar triste eram de um orfanato… apenas podiam contar uns com os outros…
A educadora perguntou-me se eles estavam a incomodar… não, claro que não, respondi.
Os outros aproximaram-se, sentaram-se à minha volta. Eu sorri e disse:
-Vanda é o nome de uma flor
- Mentirosa (respondeu logo um)
- A sério, respondi. Conhecem as orquídeas?
- Sim, responderam… temos muitas em vasos na nossa casa, e dão flores muito bonitas e de várias cores.
- Isso mesmo, sorri… Pois cada orquídea dessas tem um nome próprio. E existe uma que se chama Vanda.
-Então e como é que sabemos qual delas é a Vanda? Perguntou uma menina.
- Bem, as orquídeas que se chamam Vanda não existem no nosso país. Apenas existem nos países asiáticos, por causa do clima elas só crescem lá.
-Então porque é que estás aqui? Perguntou um menino.
-Porque ela não é uma flor… és mesmo burro, respondeu logo outro.
Eu sorri e perguntei:
Então e quais são os vossos nomes?
-Nenhum é de flores, respondeu a menina um pouco triste.
-Não faz mal, todos os nomes são bonitos.
Entretanto a educadora chamou-os… eles levantaram-se muito depressa, nem disseram adeus… a menina, voltou atrás e disse-me:
-Eu chamo-me Beatriz… queres ser minha mãe?
O meu coração quebrou-se… fiquei sem palavras…
A educadora chamou-a e ela foi a correr…
Tudo o que trazia em mim desapareceu… ficou apenas o vazio, a angustia… um esmorecer…


Tália


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