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 NA MORTE DA MINHA MÃEData 11/01/2011 14:25:22 | Tópico: Poemas
 
 |  | "Fosse eu Rei do Mundo, baixava uma lei:
 Mãe não morre nunca, mãe ficará sempre
 junto de seu filho e ele, velho embora, será pequenino
 feito grão de milho."
 
 - Carlos Drummond de Andrade -
 
 
 não agonizavas - dormias
 dormias profundo como gostavas
 segurei tua mão
 num gesto inútil tentei abrir teus olhos
 ainda respiravas
 no entanto dormias
 chamei teu nome
 não me escutavas
 eu que nunca cri pedi tanto que um anjo
 surgisse à minha frente
 em lugar do anjo apareceu um rapaz de branco
 bateu de leve no meu ombro
 e disse que era questão de horas
 poucas horas...
 (e se eu parasse todos os relógios do mundo?)
 desci para fumar um cigarro
 repeti comigo
 :questão de horas
 poucas  horas...
 não derramei uma só lágrima
 porque os patifes não choram
 no bar em frente ao hospital
 pedi uma bebida forte
 coisa que a mãe não gostava
 gosto que me persegue desde a mocidade
 :questão de horas
 poucas horas...
 tomei a bebida de um gole só
 lembrei coisas da minha infância tão longe
 de repente eu era menino de novo
 ruivo e sardento
 malcriado e briguento
 as expulsões dos colégios
 a invasão à clausura dos monges
 :questão de horas
 poucas horas...
 voltei-me homem outra vez
 olhei a rua
 a pressa dos carros e das gentes a pé
 e aquele rosto de cera dentro dos meus olhos
 e aqueles olhos que em vão tentei abrir
 não derramei uma lágrima
 porque os patifes não choram
 quando tornei à sala
 já não era mais questão de horas
 implorei novamente um anjo
 mas o anjo não veio
 naquela hora eu queria ser gente grande
 e não o menino ruivo e sardento
 agora para sempre desamparado
 
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 júlio,
 madrugada de 11-01-11,
 primeiro aniversário da morte
 da minha mãe
 
 
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