O Último Beijo

Data 26/02/2011 16:49:30 | Tópico: Poemas

Líquidos densos de cristais perolados
Precipitam sobre aquela gélida lápide
Onde adormece cabelos encaracolados
Cor-de-fogo...

Adormecidos estão os olhos de Jade.

Sopra o vento um veneno que mortifica...
Sobe a poeira e se vivifica os ciprestes...
Jaz, já fria, longe do mundo terrestre;
Muito próxima, próxima do enigma da vida.

Repousa sob a caiada cruz, uma ave.
Pia notas tristes, tétricas e sinistras.
Com abundantes lágrimas e forças das mãos
Cavo um turvo túnel pela úmida noite.

Tenho meu próprio desespero como açoite
E, como eminente inimigo, meu coração.
Ferido estou pelo dente siso da ansiedade.
Pelos meus dedos? Terra preta e sangue rubro.

Cavo, cavo, cavo... Com ensandecida velocidade...
Até que, por fim... Toquei algo rígido... Duro...
Era teu recanto de última e infeliz morada!

Ah! Jesus! Como minha alma padecia!
Como eu chorava!

Não era possível que ali, desfalecida, ela jazia!
Não! Eu nunca poderia deixar-te partir... Querida!
Não hesito um minuto atômico sequer:

Quebro toda colcha de madeira e verniz...

Vi-te morta! Fim do meu mundo infeliz!
Morta! Morta! A mais formosa mulher...
Morta!

Morte, sua mão infame a tocaste!...
Torpe, miserável! Ela é minha! Só minha!

Pego-a em meus longos braços...
Toco na face angélica e morta...
Faço carinho, Dou afagos...

Como teceu errado a aranha da Vida?
Como é vil e cruel a Natura e o Mundo?

Beijo-te muito... Frios e roxos os lábios...
Bebo com minha língua, meu pranto de sal.
Caio sobre teu corpo... Sinto o gosto do metal...

Esboço-te um pulcro sorriso...
Sinto-me esvaindo...
Me esvaindo,
Me esvaindo...

Vejo, por um instante, teus olhinhos se abrindo...
Cai, ensangüentado, sobre a lápide, meu punhal.






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