
Sonhos, de passagem
Data 01/10/2007 19:38:59 | Tópico: Poemas
| A vida vai passando, não tão lentamente como desejaria; Os cabelos brancos aumentam, deixando adivinhar o começo do fim; Na verdade, as etapas vão-se cumprindo, numa sucessão de momentos felizes, ansiedade, busca de coisas novas, sonhos que não chegaram a acordar; De tudo guardo um pouco, para tentar construir um sentido que me possa dar tranquilidade ao espírito;
Se algumas coisas pude viver, outras não passaram de meras expectativas frustadas; Se algumas vezes me senti rodeado de calor humano, em outras me afundei na mais profunda solidão;
E quando tudo parecia não ter mais sentido, sempre consegui algo novo que me ajudasse a iluminar o caminho;
Caminho... cruzado... onde me cruzei com luzes de esperança e trevas marcadas pela derrota;
Caminho... confuso... de ida sem parecer ter volta, de volta sem nunca ter partido;
Caminho... vazio... de tudo o que ficou por fazer;
Caminho... concreto... bem longe do imaginário de sonhos vividos a sós;
A vida vai passando... rapidamente, com dias de certezas - ontem com dias de talvez - amanhã já que Hoje é o meu poema concreto, confuso, talvez... vazio;
A vida vai passando... não sem que tempo e espaço se reunam para acolher a lágrima que teima em sair quando, ao olhar para trás, já não me vejo num banco de jardim olhando as flores que a Primavera viu nascer;
E, em pleno Outono, não minto, pois sinto a solidão duma nuvem negra que, teimosamente, quer escurecer os meus ainda vivos sonhos;
Mas os sonhos são parte integrante do meu Ser, mesmo sendo tão cruel quando me levam o que de mais belo possuem: - a ilusão de um momento, ainda que breve, de obter no concreto o que planeei no imaginário do meu mundo de jogos de solitária entrega;
Talvez por isso com ou sem nuvens, com ou sem solidão, ainda que sofra, entrego-me, sem reservas, ao que de mais belo a vida tem - a vivência de um sonho concreto, onde o único medo real é o de me dizerem, friamente, que estou a perturbar o sono de Mim próprio;
A vida vai passando... Ontem, já nasceu Hoje, ainda vive Amanhã, talvez - não sei; Só uma certeza me envolve - não renuncio... só uma forma de estar me mantém vivo - sonhando...
E assim, tranquilamente, os meus cabelos brancos dormem no regaço dos sonhos, que me acolhe e aceita tal como sou;
A vida vai passando... mas ainda não aprendi a despertar; Sob a capa feita de desilusões continuo a não querer ver a distância que me separa do que penso ter tão perto;
Aquilo que sou... os sonhos... a fantasia... o sofrimento real... a indiferença que me rodeia... o pesadelo que me acorda!
Acorda? Não, pois continuo preso à liberdade de viver sonhos acorrentados que só para mim têm sentido;
A confusão cresce sempre que quero ... mudar; A dor alastra sempre que quero ...esquecer; A tristeza invade-me sempre que me quero ... afastar;
E depois, quando quero mudar, quando quero esquecer, quando me afasto, dão-me um sinal, alertam-me, chamam-me, e eu... já não mudo já não esqueço, volto, volto sempre, mas continuo sozinho, como sempre estive, a viver novamente num mundo onde a realidade se alimenta do que é cruelmente real;
Sonhos... solidão... espera... em união perfeita numa tarde longa ... de vazio vazio feito do Tudo que compus ao som das palavras que não ouvi; Vazio feito do Nada que me deram quando estendi a mão na direcção errada do que escolhi;
Não sei se eu próprio sou o que fiz nem sei se quero o que sou, ao viver longe do que quero perto, ao viver perto do que sinto longe;
A tarde vai longa... e o desespero apodera-se das últimas réstias de luz, deixando no ar a sensação do inacabado, do não vivido, como se a noite fizesse parte integrante de um passado longínquo perdido no outro lado do Tempo;
Sonhos... solidão... espera... tarde longa de desejos que, mesmo assim, ainda vivo, pois não esqueço, não quero esquecer, que a noite pode trazer no seu manto o encanto do calor julgado arrefecido pelos sonhos, de passagem.
.
|
|