BOI MANSO

Data 30/08/2011 20:30:39 | Tópico: Poemas


BOI MANSO

Passo o tempo
sem metas, sem regras;
doce desperdício, apenas.

Pensamentos de rapina
se aproveitam,
enfeitam de fita negra
através anilhos de mim.

Sou a reprise do que copio e recopio,
do que plagio da natureza ao vizinho,
das imagens da TV aos folhetins de enfastio
- faço um pastiche dos próprios arrepios. -

Sou a mente-xerox dos jornais,
a sua essência repetente e subnutrida.
Sou a boca dos fraseados inúteis,
dos nacos irrecuperáveis do meu ser.

Meu particular vazio
é o que mais dá-me a vida.

Paupérrimo consolo em saber:
que também a maioria nada tem a dizer
(embora sintam-se ricos, milionários)

Esse é o alento dos miseráveis.
Esse é o meu desafortunado alento.

Minha liturgia é paripassu
com a do gado
que com dócil espírito de manada
atravessa um rio cheio de crocodilos.

Eu sou o boi manso que reza e atravessa...
Já me foi o rabo. Já me foi a pata.
Quiçá, na próxima dentada, me irá a alma.

Alimento
o mais comum deste mundo
por um buraco no meu peito.



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