O trilho que a história traçou

Data 23/08/2011 14:52:02 | Tópico: Poemas

Se me descrevo,
É sem o desejar,
Pois escolho a morte lenta
Em vez de me suicidar.

Nessas linhas tão tortas,
Existe um mundo secreto,
Que tanto odeio como amo,

É o jardim das mil flores,
Que o embelezam todo o ano,
Mas é também o jardim de todas as sombras,
As do futuro, as do presente e as do passado...
Das que vagueiam através do tempo,
E que flutuam entre mundos e mundos,
Num frenesim desesperado,
De quem morreu sem viver,
E que entre correntes e chamas,
Se consomem e desesperam,
Porque morrer sem sentir o prazer de viver,
É nascer sem acordar, sem ver e sem tocar,
E na penumbra da sua existência,
Se torturam,
Por não ver,
Por não sentir,
Mas a minha pena não levam,
Pois só eu a posso sentir,
Sem a ver e sem a tocar,
Como um viajante invisível,
Que vai e vem sem precisar de descansar,
Que passa mas não fica,
Que abranda mas não para,
Como a chuva de sal,
Pedida para afastar o mal...

E no imenso oceano das palavras,
Mergulhei para me perder,
Mas afundei-me devagar,
Só para te recordar,
E ver-te assim ao meu lado,
Descendo devagar o inferno da tentação,
Fez-me verter,
AS lágrimas que nunca vi
E envolto nessas lágrimas
Que eu tinha jurado nunca mostrar,
Viajei de costa a costa,
Sem me mover e sem respirar,
Despertando então no jardim,
Que eu criei e que alimento...

Entre a quase morte e a morte
Cresce o infindável sofrimento,
Que transforma os outros em nós,
E a nós nos varre com o vento
Por entre as certezas e as dúvidas
Em que se faz cada momento...

E desse momento se faz a felicidade,
E da felicidade se faz o fim,
Que depois trará um outro fim...
Tudo isto dentro do meu jardim,
Que cresceu, vive e morrerá,
Algures dentro de mim.

Sinto agora o tempo a passar,
Com as suas carícias e o seu toque de mel,
Estimulando os meus sentidos e
Aprofundando a minha dor,
Como um livro sem nome e sem nada,
Que se lê de olhos vendados
Nas tardes solarengas de um Outono qualquer,
Entre o bailado das folhas caídas
E o murmúrio das árvores despidas,
Desapoderadas e sábias como as areias do deserto,
Que nos engolem e cospem,
Sem o saber e sem o desejar,
Simplesmente para seguir
O trilho que a história traçou!



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