
Ainda há tempo? (Affonso Romano de Sant'Anna)
Data 15/11/2011 19:47:24 | Tópico: Poemas -> Reflexão
|  Ainda há tempo para o último drinque à beira do vulcão ou então para abrir o que estava oculto no sótão ou no porão por isto é o momento de descerrar o indiscernível sim do não.
Ainda há tempo de aceitar a pequenez e explicar a omissão ainda há tempo para a carta não escrita o telefonema tardio o pedido de desculpa na garganta enrustido e um afago na mão.
Ainda há tempo para entender o silêncio acre de Beckett a ironia espessa de Ionesco e de Kafka a sombria alegoria.
Ainda há tempo de nos quadros de Hopper encarar a solidão ainda há tempo de contemplar os impávidos cavalos rosas de Paolo Ucello na Batalha de São Romão.
Ainda há tempo para ouvir um poema de Li-Po e três versos de Bashô, ainda há tempo para lembrar Ronsard Withman e Drummond.
Ainda há tempo antes que derretam a calota polar antes que se perverta o DNA antes que envenenem os rios e o que sobrou do mar.
A escuridão pode esperar ou dissipar-se quando o dia teimosamente amanhecer com o oboé de Mozart ou com a área na corda de Sol de Bach.
Ainda há tempo (gostava de pensar)
Se tempo, há receio, é para tomar o trem o navio o avião ou então ainda há tempo para voltar do aeroporto ou da estação pegar o rifle e enfrentar a enfurecida multidão ou simplesmente entregar-lhe o ouro e esperar a hora da execuçao.
Affonso Romano de Sant´Anna, In: Vestígios, 2005.
Arte por Mihai Adrian Raceanu, Romênia, pintura surreal.
|
|