
Depois do Temporal
Data 25/10/2007 00:27:46 | Tópico: Contos -> Romance
| Sentaram-se à mesa. Era hora do jantar. Não dirigiram palavras um ao outro, apenas trocaram olhares. O silêncio era quase tangível quando o mordomo chegou, trazendo as travessas. Tudo parecia impecável. A comida foi servida, e a bebida, também. O vinho parecia saboroso. Era um Barbaresco. Ela o provou, sorvendo um gole lentamente. Não conseguiu lembrar-se da última vez em que provara um igual. Andava assim, esquecida... Curiosamente, o que deveria esquecer, não conseguia. Pelo contrário, o tal pensamento a atormentava, dia e noite, incessante, enlouquecedor. Do lado de fora, uma tempestade começou a cair, impiedosa. Do lado de dentro, outra se formava, no seu interior. Os talheres se moviam como manda a etiqueta, afinal, acima de tudo, vinha a educação. Guardanapos dobrados nos joelhos, eventualmente limpariam os lábios, mas não serviriam para limpar o coração. O jantar chegou ao fim e veio logo a sobremesa. Taças com "Coupe Ardéchoise". O pensamento divagava. O que diria, afinal? Passaram para o salão principal. A tempestade castigava a cidade, mas sentimentos contidos dentro do peito a castigavam tanto quanto. Ao lado da lareira, enquanto a lenha estala, ela se acomoda nas grandes almofadas coloridas. Trocam novos olhares. Palavras são desnecessárias. Mágoas, ressentimentos, coisas do passado, tudo vem à tona e a vontade de resolver a situação fala mais alto. Em um ímpeto, levantando-se, se aproxima dele e faz um afago em seus cabelos. _ O que aconteceu conosco? Não há resposta. Apenas o esboço de um sorriso. _ Eu não aguento mais essa situação... Ele a puxa para perto e a beija. Ela não oferece resistência. Coração acelerado, acredita que enfim pode haver uma solução, e quem sabe, naquela noite de temporal, consigam acertar as coisas? _ Você tem tudo. Não precisa de nada. - ele sussurra. _ Preciso sim, preciso de você. _ Você não precisa de mim... O celular toca. Ele atende e seu semblante muda. Uma frase é dita, sem convicção. _ Está chovendo muito, não sei se poderei ir. Ela não pensa duas vezes. Pega o telefone das mãos dele. _ Ele não vai sair, não esta noite... Jogando o celular para longe, o envolve pelo pescoço e como nunca havia feito antes, o beija de forma diferente. Não parece a mesma mulher. Ele a olha intrigado. Parece não entender. A esposa sempre fora comedida, até nos momentos mais íntimos. Um raio e as luzes se apagam. Na penumbra, os dois se abraçam. Protegida pelos braços dele, trêmula, ela se abriga. _ Não quero te perder. _ Não vai. Olha, eu queria te explicar... _ Não precisa...shh...de hoje em diante, vai ser tudo diferente...podemos começar de novo. _ É isso mesmo que você quer? _ É tudo o que eu quero. Um novo beijo sela o destino dos dois. A noite foi longa. Ao amanhecer, as malas já estavam prontas e um jatinho à espera do casal. O destino: uma ilha do Pacífico. Teriam uma segunda lua de mel. Depois da tempestade, veio mesmo a bonança. Um arco-íris ornava o céu. Um arco-íris de esperança.
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