the art of letting go

Data 24/02/2012 21:01:25 | Tópico: Poemas



Parto sem dor.
De que adianta partir com dor, se a dor ainda nos faz doer mais.
Levo comigo o teu rosto, envolto em mortalha de memória.
Hei-de fumá-la até que do fumo só me reste a lembrança de que um dia fomos unos.
E essa, talvez me doa.
Talvez me doa pela constatação da impossibilidade de me tornar uno e por aí ficar.
Contigo.

Volto ao início de mim.
Torno-me uno, eu e a minha sombra.
Sombra do que fui e do que serei.
Disso, tenho a certeza. Seremos únicos e caminharemos lado a lado. A não ser que o Sol deixe de brilhar.

Parto sem rancor.
O ódio só nos torna cada vez mais sós.
Dizem que há um tempo para amar e outro para odiar.
Como é que se odeia alguém que se tornou em nós?
A sombra não odeia. Mas talvez ame. E talvez sinta dor. A dor de não ter uma sombra que lhe faça Sol.

Parto com alegria.
A alegria de saber que o meu rosto ficou contigo.
E que a memória na tua mortalha não sente dor, nem rancor.
A tua sombra talvez sinta a mesma dor que a minha.
Mas, um dia, talvez o Sol.






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