
O Cão
Data 10/11/2007 21:58:28 | Tópico: Poemas -> Tristeza
| <br />O cão vai e senta em uma esquina. Passam alguns homens que acaso não fazem caso, que acaso não o olham, que lhe dão pontapés, que lhe descarregam seu ódio e seu desprêzo.
O cão nada diz corre. Lambe um pouco de terra da ferida, remexe nos escombros, sua parte de miséria. Vai e senta outra vez, vai e se levanta.
O cão sabe que em um mundo pequeno, não há sorriso, não há fonte. Só o mundo pequeno, pequeno e mesquinho. Só uma pequena e mesquinha palavra.
O cão já não late para a fêmea como antes, já não brinca aos saltos, já não salta e pula sob a tarde avermelhada. Vai e se senta tão só.
O cão vai pelo caminho algumas vezes, se cruza um carro, foge. O carro e o homem, seus algozes. Se cruza com a criançada, olha de longe e embrenha-se correndo no bosque.
O cão vai até o riacho algumas tardes, bebe um pouco de água, e se reflete em seu espelho Entra na água e nada que doce ternura, essa ternura, essa ternura, que lhe põe nos olhos o azul do céu.
O cão vai e senta uma manhã e já não se levanta mais. Ali fica feito sombra de esquina, rua, menino. Igual a maçã caída na relva, jogado a própria sorte, a morte.
Essa mesma manhã se encontrará vazia. E êsse raio de sol que entra pela porta. Não o encontrará sentado na esquina. Nem o achará dormindo a porta da igreja. E não haverá mais o cão para descarregarem o ódio.
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