gula II

Data 11/09/2012 18:59:47 | Tópico: Textos

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depois de escrever o microtexto gula dois colegas que estimo escreveram as seguintes notas:
1.
“Oscar Wilde lá dizia que resistia a tudo menos à tentação.
Mas este assim ficou monástico, misterioso.”

2.
Como nos deixa curiosos assim?!!!

Vou-te deixar um poema de gula, então, para pecar de vez:

Delicioso Pecado

Satânico é o meu desejo
De despir seu corpo
Naquela manhã ensolarada
Tirar da minha boca a fome
Dos seus sabores
Olhando pra você
Enquanto lhe desejo
Desfaço da sua pele
Em suaves descidas
Até que se mostre
Eu lhe mordo a ponta
Até chegar o fim
Do meu prazer
Saciando o mel
Da forma em riste
Da banana que comi
Até o fim!!




não resisti e escrevi:

misterioso? não. nunca – não sou homem de mistérios – escrevo-me em papel para dizer o que não sei falar – escrevo-me em papel para dar mais horas de luz aos dias – escrevo-me em papel para me convencer que o coração tem razão para continuar a bater – escrevo-me em papel porque a escrita é como um analgésico para uma dor que nem sei se existe – escrevo-me em papel porque quando escrevo penso e logo existo – escrevo-me em papel porque as palavras obrigam-me a gostar de mim tal e qual como sou – escrevo-me em papel porque quando escrevo sou muito mais do que homem. sou todos os homens do mundo. sou gaivota. mar. planta. pinheiro manso. musgo. terra. pó insignificante. porque todo o pó é insignificante – escrevi a gula por ser covarde e não saber falar. por não saber contar o tempo. não saber contar as palavras nem perceber o seu valor quando o homem está possuído pelo pecado da gula – escrevi a gula para não arremessar nenhuma palavra de que me pudesse arrepender. e como diz o provérbio chinês: a palavra e a flecha lançada não podem voltar atrás – comi então todas as palavras do mundo. não falei. não pequei – tudo o que não disse. engoli. digeri. desgastei. assimilei e encontrei razões que o coração desconhecia – de homem cobarde fiz-me homem sensato – engoli todas as palavras do mundo e o mundo não deu falta de nenhuma – não existo para o mundo. existo para mim. e é para mim que escrevo [será que alguém entende o que escrevo? não acredito – ainda bem que não há inquisição]




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