
Oração
Data 19/10/2012 13:55:12 | Tópico: Poemas
| Ó Pai, Governante angelical deste mundo, Habitante das esferas mais sensíveis do desejo Conhecedor íntimo dos círculos de Sophia, Nenhum panarion te curou da nossa alma, Nela habitas a despeito de tantos santos e heresias, De tantas exprobações e excomunhões, De tantas fogueiras e perseguições Arraigado como estás em cada coração e intento.
Ó Pai, Governante angelical deste mundo, Senhor dos rebeldes com causa de Sodoma Dos amantes devassos de Gomorra, Místicos a galgar os fastígios do sublime, O êxtase erótico do nirvana e do crime, Ensinaste que toda a trave sobre o corpo, Que todo o grilhão contra as formas do amor Só nos leva à guerra, à infelicidade e ao terror.
Ó Pai, Governante angelical deste mundo, Soberano de toda a raça de Adão, De todo o fugitivo e errante pela terra, De Nimrode, poderoso caçador, Edificador de cidades, da imensa Torre, Ensinaste que toda a salvação É inimiga íntima do controle E que só pode ser salvo quem é livre para sê-lo;
Ó Pai, sim! Governante angelical deste mundo, Livre para comer e amar, Livre para ler e conhecer, Para destruir e odiar, para construir E novamente destruir e, então, reconstruir Quantas vezes forem necessárias o homem, o mundo E, sobretudo, livre para matar e vingar-se Setenta vezes sete de quem nos mata.
Ó Pai, Senhor, Governante angelical deste mundo, Incompreendido por todos que crêem Nas nuvens inúmeras havidas por Deus, Pelo demiurgo megalomaníaco deste mundo Que, a muito custo, tenta extinguir A centelha insondável, pó primevo e fecundo, Que todos carregam dentro de si, Pai Nosso, Assassino e construtor, raça dos cainitas!
Ó Pai, Senhor, Homem demasiadamente humano Que teve a oferta mais pura recusada, Primícia da terra, límpida e incruenta, Obra de tuas mãos calejadas de lavrador, Trabalho de quem edificou todo orbe antigo: Ur e Enoque, Sodoma e Gomorra, Babel e Babilônia, Tebas, Nínive e Calá, Sidom, Roma e Pasárgada, Habitante de Node, Oriente do Éden!
Ó Pai, Senhor, Preterido, proscrito e amaldiçoado, Perseguido e fustigado pelo inferior, Hostilizado e marcado pelo sangrento sacrificador, Pelo Deus da gordura e do sangue de tantos altares, Luminar acossado pelo desejo, libertino Livre para mal proceder, para pecar e conhecer-se, A tua oferenda, vida e alimento, foi rejeitada Em favor da morte, do sangue e da dissolução.
Ó Senhor, o mais belo ninivita, obstinado, A tua centelha ninguém jamais apagará, Pai adâmico, Pai-Mãe, sabedoria incorruptível, Restaurada pela revolta, pela ímpia verdade Que desde o início tu sempre conheceste, Aquela mesma que levou todos a enlouquecerem E a te acusarem de Judas, apóstata e execrando. Sabes bem que toda a divindade é uma caixa de Pandora E que Deus reiventou-se o Diabo reiventando.
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