Velhice

Data 30/10/2012 21:27:46 | Tópico: Poemas


Todos os dias acordo num corpo antigo
cada vez mais longe de qualquer destino.
A distância que me separa do horizonte
é maior do que os passos que arrasto
num chão que desaba debaixo dos pés
enquanto sigo o futuro que se esgota
na sombra que se alonga nas dunas
como uma esponja sugando a claridade.

Sou agora um animal enrugado e pálido
a respirar a treva contaminada do poente
com os ombros desfigurados pela ruína
de quem segue o passo lento do cortejo
sem encontrar alento capaz de reverter
a traidora enfermidade destes órgãos;
dormência que embala no frio dos ossos
a cinza indecifrável dos últimos trilhos.

Há uma fogueira com o meu nome aceso
nas labaredas que desenham na paisagem
a sentença de um fogo que me chama
e nenhuma manhã é suficientemente clara
para iluminar o que resta do fôlego expirado
agora que devagar me aproximo da falésia
e me inclino sobre a vertigem do musgo
a contar as horas que faltam até ser dia.


Todos os dias acordo mais longe de mim
na febre de um corpo que já não sou eu.
Cada vez mais perto do lume.





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