
OUTONO OBSCURO
Data 04/12/2007 06:17:07 | Tópico: Poemas -> Esperança
| Outono Obscuro
 Sinto-me inútil, porque a minha vida Caminha, sem qualquer razão de ser; É quase voluntária esta clausura! Foram-se as ilusões! De fé perdida, Entrego-me! Não há nada a fazer! Sinistra, a solidão que me tortura… Com insónias, privado do trabalho, Nefando pesadelo, o dia a dia, Envolto em cruéis horas de inacção! Daí a conclusão que nada valho: Desânimo jamais é cobardia, Se inutilmente busco a solução… Pior do que eu, existe muita gente; Contudo cada um sabe de si; Tal facto não me serve de conforto! As chagas doem mais a quem as sente… E, se lamento, agora, o que perdi, Decerto não o faço por desporto… Enquanto te servi, Comunidade, Pus todo o meu saber ao teu dispor, Embora sem nadar em abundância. Não há justiça nesta sociedade: A miséria calada causa dor, Menosprezada pela petulância! Que foi de mim, ao longo destes anos? Estive ocupado; ao menos… trabalhei! Sentindo a mais completa integração! Criei amigos; tive desenganos; Contraí matrimónio; procriei; Era o rumo normal de um cidadão… Tomei parte na luta quotidiana, Nela pus sempre toda a lealdade, O que me causou muitos dissabores. Vou criando rancor a quem me engana; Declarei guerra à torpe falsidade, Mas só impera a lei dos opressores! … Deixei alguns amigos além-mar, Que recordo, saudoso, ternamente: A eles falo e escrevo, muitas vezes! Meu sonho: esta amizade conservar, Chego a ter num ou noutro um confidente, Que me ajuda a sofrer tantos reveses…
Nascem os filhos; e as dificuldades Aumentam sempre, com a carestia, Que ninguém trava, em marcha galopante. Não oculto: passei necessidades! Mas a doce consorte anestesia Minha enorme revolta, a cada instante… Poucos amigos tenho; a culpa é minha? Talvez; contudo, gosto de escolher A rigor; não me serve qualquer um! Quando nos damos, nunca se adivinha O que depois nos pode suceder; Pois se não são leais… antes nenhum! Todos sabem, porém, que a convivência Faz tanta falta aos homens, como o pão; Talvez eu não a saiba cultivar… Sofro tremendamente esta carência, Pois ferrolhei-me em negra solidão, Da qual jamais me posso libertar! Nas rudes contingências que há na vida, Aumentam as misérias dos mortais, Cujos dentes não param de ranger! Pela força, a razão morre, vencida! Entram em desespero os pobres pais, Com filhos que precisam de viver!.... Já por isso passei; mas trabalhava! Via no dia a dia algum sentido. Agora… a minha casa é uma prisão! Com os colegas, impressões trocava… O meu segundo lar foi destruído, E ninguém resistiu ao furacão! Descendentes criados, bem ou mal, Dei-lhes tudo o que tinha, foi bem pouco… Mas julgo ter cumprido o meu dever! Fustigado por este vendaval, Aqui, sem fazer nada, vivo louco: Pode alguém tal problema resolver?!... A solidariedade reconforta; Ajuda um pouco a suportar a dor, Neste transe difícil que ora passo. Não acredito me abram uma porta. Fisicamente, tenho algum vigor; Mas só vegeto, e amargo o meu fracasso! Depois de tantos anos de labuta, Terei ficado inválido, agora?!... Isto dói muito a um profissional! Circunstâncias perversas, nesta luta, Venceram-me! Mas pergunto, sem demora: A quem devo acusar de tanto mal?!...
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