Do poema que não escrevi

Data 04/12/2007 18:58:15 | Tópico: Poemas

Do poema que não escrevi
ficaram
desenhadas nas minhas mãos, letras de sangue,
luares de fogo, luas pungentes,
testemunhas silentes de corpos fundidos
em palcos de carícias ousadas, destemidas,
… e o afago diminuto
a ecoar labirintos, espumas nuas, corais de mar.

Do poema que tu não leste
remanescem livres no velejar
pétalas soltas, essências, aromas,
notas intimas e serenas,
trocas eternas e só nossas,
beijos inexcedíveis de cetim.

Fecho agora devagar
a arca aberta dos afectos.

Do chão sagrado deste sepulcral altar,
exumo a alma, os ossos da alma, a pele verde da alma.

Beijo-te ao de leve a boca,
bebo-te em cálice aberto a voz,
replicada em eco, distante, rouca.
Reúno de mansinho uma a uma, folhas dispersas
num livro por inventar.

Na manhã dos tempos, envolto em aspergidas brumas,
senhor de mim, regressas
e sou de novo, poeta, num poema que não escrevi.


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