Oração matinal a Joaquim Cardozo

Data 04/01/2013 01:01:29 | Tópico: Crónicas

Joaquim, eu te leio como uma prece matinal, a clarear de dentro o meu dia e lá fora, mantendo a coerência das linhas regulares de meu mundo, decaído e esplendoroso, conforme a direção do sol. No soneto exato, a métrica que me faltou à vida toda, a compreensão do mundo espelhada em vogais, na voragem construtiva do Ser; em consoantes espalhadas ao léu, de repente sonantes como a ondulação dos pequeninos braços de maré e mar de nossa terra estranha, tornados trilha matinal luminosa e mística, tal a luz matinal e vitrificada das antigas igrejas, febrilmente semeadas entre ladeiras e ruas estreitas; nas torres para sempre inacabadas de algumas, cinzentos e ancestrais impasses em pedra e tijolo entre a Fé e o Ter, talvez na indecisão pétrea a esperar tua métrica final e mágica, a completar-lhes o sentido em pedra e concisão espiritual. O rigor lírico, persuasivo e claro, convencendo o rigor exato, maquinal e claro a suspender-se um segundo, tal gota d’água pronta para si mesma, em queda livre, tornar-se chuva ou leve suspiro do céu sobre a Rua Nova, compondo a beleza alem da beleza feia de velhas e abandonadas fachadas, cerradas portas, em sono triste e multicor de pálpebras enferrujadas e corroídas pelo tempo que dói, tal estocada fria e precisa da eternidade do momento. Em 01/01/2013.

A Joaquim Cardozo, (1897-1978), engenheiro-poeta, uma homenagem.

Homenagem ao poeta e engenheiro calculista Joaquim Cardoso, a meu ver, ainda pouco conhecido no seu próprio país.



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