canto ou silêncio...

Data 29/04/2013 17:45:17 | Tópico: Prosas Poéticas

pequena prosa poética




Caminho através do tempo, porque as lembranças não morrem, e revejo as mesmas árvores, as mesmas flores, os mesmos pássaros de então que simplesmente não morrreram no meu pensamento, tal como as pessoas e suas vozes, seus gestos, seus passos, até eles já mortos vivem por que os recordo a qualquer momento. Trago ainda o crepitar da lareira no olhar, a chuva que bate nas vidraças, o piar do mocho e da coruja nas noites de outono, e revejo com especial prazer o castanheiro, o velho castanheiro do adro, bem juntinho à minha escola e o pequeno pelourinho ali ao lado.
Hoje ao lembrar as alegrias de então sempre me entristeço, sempre chega aquela nostalgia e é com espanto que me apercebo como tudo cabe na memória como se esta fosse um arquivo vivo onde tudo está rotulado, pronto a ser consultado, lembrado, comparo a um fogo que arde e não se consome, lá está bem presente a nossa primeira desilusão, a primeira tristeza, a primeira conquista, tanto sentimento misturado, até o uivo do vento, o cheiro da terra molhada, o som do açude, lembranças quiméricas estas... tantas adormecidas durante anos, quando a vida era buliçosa e não dava para nos prendermos tanto ao passado, mas agora está tudo presente, nada saíu da memória, tão presentes que as revivo com um encanto especial.
O tempo que tudo em nós era puro, e eramos tranquilos, e tão bem convivíamos com os mortos que hoje vivem em nós. Contemplo os carros de bois hoje enexistentes, estes com suas cangas, e o barulho do rodado na estrada carregados de trigo, e ao viver o ontem, descubro como de tudo para sempre me afastei e fecho-me por dentro de mim mesmo num outono onde principia a escuridão.
Tive uma infância em que cada manhã, o jorrar da aurora trazia uma luz radiante, que ainda hoje brilha nos olhos que a contemplaram, as pombas ainda esvoaçam por lá, e no céu o mesmo arco-íris, a chuva é de ouro quando cai, e eu sinto tudo nas minhas veias.

natalia nuno
rosafogo



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