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Pego a musa a laço num jogo de cartas. Tarô de inspiração. Marco cada oráculo e os incendeio, incensos da meditação. Dalai lama para esse barro e águas de março para o lodo do fundo do poço. Jogo os dados na direção da musa. A quina perfeita do cubo numérico, a sina do sim seguinte e da alvorada da letra escarlate. Sangue de um cristo no batente da porta, vinho fervendo num barril de carvalho. A gota de orvalho é transpiração da musa. A musa sete pragas de saia de pregas voando em nuvem de gafanhoto a fazer-me engolir sapos. O mar vermelho abre-se para que passe a musa. O cajado de Moisés é o falo da musa hermafrodita. Musa esfinge. Musa finge-se invisível nas brancas páginas do meu caderno. O inferno são linhas brancas e o céu são linhas tortas com escrita certa, direta ao ponto, certeira, sem devaneios de lua cheia e bolas murchas de enxaqueca da ressaca do vinho sórdido, do sangue álcool das veias de musa. Musa do pulmão balão de oxigênio e fumaça de mil cigarros. Catarro do meu pigarro a tossir um verso verde e infecto. Musa de cabeça nas flores e pés no lixo. Laço-te, passarinheiro. Forjo-te coleira de escansões e passeio, com tua fúria por ruas escuras e mausoléus. Musa da madrugada fria e ópio. Musa amorfa, morfina de minha retina interna. Musa etérea, Ensina-me o feitiço de domar-te, para que pouse em meu ombro e eu durma.
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