Este mundo de merda e a depressão #.#.#

Data 13/01/2014 18:38:33 | Tópico: Poemas

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Este mundo de merda e a depressão







Hoje acordei depressivo
E isto sempre me deixa curioso e estupefato,
Porque, parece, fico mais lúcido.

A realidade parece que salta e se mostra assanhada,
Tão nua que fere o olhar macio e delicado
Dos pudicos.

Minha depressão, penso, não é uma doença,
Mas um striptease, um viés que descortina
Uma acre realidade que não quero saber,
E que, portanto, muito pouco posso ver ou suportar.

Não é, desse modo, a depressão que me faz ver
A merda travestida de pessoas,
O lixo envergando roupas etiquetadas e caras,
Essa hostilidade gratuita,
A completa extinção da solidariedade, da amizade...

É a minha lucidez que berra,
Como quem grita o direito à vida sem alheamento,
Uma vida sem fuga, o mais distante da covardia.
Uma vida sem a famigerada hipocrisia,
Uma vida visível que possibilite consertar
Os erros e construir torres para uma melhor observação
- me vejo bem ao largo quando estou assim.

Mas alguns metem uma bala na cabeça,
Outros se afogam em barbitúricos e ansiolíticos,
Mas eu
Resolvi me afogar nesse mar espúrio da realidade.

Resolvi sentir a náusea do teu hálito humano, leitor,
Resolvi sentir o odor cadavérico do teu “bom dia!”
Tão mecânico quanto tua vida vazia e bolorenta,

Tua vida de novelas estúpidas, de vitrines que te absorve,
De rancor que te consome
E de todo tipo de asneiras que pensa te fazer melhor,
Mas que melhor afasta de ti, tu mesmo
E que te distancia da árvore e do fruto da vida cotidiana.

E se, você leitor, não gostar disso que agora lê,
O que é bem normal a quase toda gente normatizada,
Dê de ombros no mesmo tom que me dá o seu “bom dia!”
E não tire sua máscara protetora de odores,
No momento faço questão de cheirar bem mal.

Porque resolvi abocanhar a vida putrefata, esse arroto, esse resto,
Essa migalha, esse estrume, que também me ofereço,
Posto que sou banquete para o verme que ainda muito me compraz.
Porque, desconfio, vivemos não sem motivo, num pântano criador e,
Veremos se desse charco poderá nascer algo digno, eu mesmo,
Como as vezes acontece com uma bela flor.







Milton Filho/13.01.14... lúcido ou doente, ao gosto de quem lê.


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